Título: EUA buscam Brasil para mediar relação com Chávez
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/02/2007, Nacional, p. A4
A visita do subsecretário de Estado dos Estados Unidos para Assuntos Políticos, Nicholas Burns, é o primeiro passo concreto de um esforço para intensificar a relação entre os dois países, que inclui visita da secretária de Estado Condoleezza Rice ao Brasil e a ida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Washington. Do lado americano, a idéia é habilitar o Brasil a desempenhar novo papel na América Latina e atuar como intermediário na relação com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. "Este será o ano de aproximação com todos os governos eleitos na América Latina, em especial o Brasil", disse Burns em palestra em São Paulo.
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que se reuniu com o subsecretário durante uma hora ontem em Brasília, não rejeitou a idéia da intermediação, mas definiu condições. "O Brasil não fica passando recado de ninguém. Eles têm embaixador lá (em Caracas). Há formas de diálogo sem necessidade de o Brasil se arvorar sobre mediação", afirmou. Durante a conversa com Burns, o ministro Amorim lembrou o papel de mediador já exercido pelo governo brasileiro no passado.
Os dois resistiram a admitir que a questão da Venezuela teria sido tema das discussões bilaterais. O subsecretário americano deixou claro que o tema foi tratado, mas preferiu não revelar detalhes. "Eu acho que um assunto como este é melhor ser deixado para ser tratado de maneira privada", disse.
"Trocamos idéias sobre a Venezuela", relatou Amorim. "O que sempre digo é que boa política não é a do isolamento, mas a do diálogo. É claro que é preciso que os dois queiram dialogar. Falamos um pouco do passado, como nas ocasiões, inclusive, em que o Brasil pôde ajudar no diálogo entre a Venezuela e outros países", explicou o chanceler. "Ouvi dele que eles também têm disposição para o diálogo. Agora, como se processa o diálogo, não chegamos a este ponto."
VISITAS
Celso Amorim admitiu a necessidade de aumentar o nível de consultas e visitas entre Brasil e EUA, como deseja o governo Bush. Nos próximos dias, será confirmada a data da chegada da secretária de Estado Condoleezza Rice e anunciada a ida do presidente Lula a Washington para um encontro com o presidente George W. Bush. Além disso, funcionários de escalões intermediários de ambos os países vão ampliar as consultas e visitas bilaterais.
A viagem do subsecretário Burns tem como objetivo mostrar que os EUA estão dispostos a dar uma guinada em sua política externa. ¿O Brasil é uma potência regional e me espanta o fato de não termos um acordo bilateral na área de comércio e investimentos¿, disse Burns anteontem. Ele justificou o fato de a América Latina ter ficado à margem das preocupações americanas em 2006 alegando que foi um ano eleitoral nos EUA. A verdadeira explicação vai além. Depois de seis anos centrando esforços nos conflitos no Oriente Médio, foi a vitória democrata nas eleições legislativas - encaradas como referendo sobre o Iraque - que fez o governo Bush perceber que é preciso mudar de rumo.
Saíram de cena os discursos inflamados sobre o dever americano de proteger o mundo de países que representam ameaças globais - o chamado ¿eixo do mal¿. Entraram, ao menos na retórica, as preocupações com a questão ambiental, o respeito ao multilateralismo e a busca de novas alianças. ¿Vivemos em um mundo multilateral. Não podemos enfrentar todos os problemas sozinhos¿, disse Burns. Bush planeja um giro pela América Latina - que inclui México, Guatemala e passagem em março pelo Uruguai.
Neste contexto, o Brasil seria um importante parceiro dos EUA na região. ¿Partilhamos as mesmas preocupações: combater ameaças como a criminalidade e o narcotráfico e defender a democracia e a abertura econômica¿, disse Burns.
O subsecretário propôs ampliar os investimentos em pesquisa e produção de biocombustíveis como primeiro passo dessa aproximação. Ontem, ele se encontrou com o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, que em seguida disse estarem Brasil e EUA estudando parceria para criar um projeto de produção de etanol na América Central. A idéia foi lançada em reunião do subsecretário com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na tarde de ontem. "Vários países da região são importadores de petróleo e têm condições de produzir localmente o etanol, com tecnologia brasileira e americana", disse Furlan. O ministro explicou que o próximo passo é escolher um país para colocar em prática um projeto-piloto.