Título: Governo tenta blindar Meirelles
Autor: Rabelo, João Bosco e Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/02/2007, Economia, p. B1

Diante de pressões generalizadas pela mudança da política monetária do Banco Central (BC), o governo desencadeou ontem uma operação destinada a garantir a permanência de Henrique Meirelles na presidência do banco. O aval do presidente Lula a Meirelles veio por meio dos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Paulo Bernardo, que garantiram não ter nenhum fundamento os rumores que davam ontem como certa a saída de Meirelles. ¿Essa notícia não tem fundamento nenhum¿, disse Mantega. ¿Boatos são assim mesmo¿, fez coro Bernardo.

Os dois ministros agiram para devolver ao mercado a tranqüilidade que as declarações de véspera de seu colega do Trabalho, Luiz Marinho, retiraram. Segundo Marinho, o BC errou ao reduzir o ritmo de queda dos juros. Ontem, o ministro chegou a responsabilizar a política de Meirelles pela redução da oferta de empregos no País.

A declaração de Marinho encontra Meirelles no seu momento mais difícil, isolado, dentro do governo, na defesa da política de juros. Meirelles, que tinha em Palocci uma barreira ao ¿fogo amigo¿, agora não encontra aliados para enfrentar o número crescente de interlocutores de Lula que advogam uma mudança na diretoria do BC e nos rumos da política monetária.

Só nos dois últimos dias, Meirelles sofreu críticas públicas do ministro do Trabalho e do presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP). Nos bastidores, a guerra é mais intensa e ideológica. ¿Até o fim de 2006, a discussão interna sobre os juros tinha um viés eleitoral, pois o PT e seus aliados queriam mais gastos para garantir a reeleição de Lula; agora, eles querem a mudança do modelo¿, contou ao Estado uma fonte do governo.

O recrudescimento das críticas a Meirelles resultou do temor de que a forte valorização do real ante o dólar crie maiores dificuldades a vários setores da economia, como a indústria têxtil e de calçados e o agronegócio, e sepulte a agenda do desenvolvimento que foi explicitada no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Nos debates internos, segundo testemunhas, o presidente do BC contrapõe o argumento de que a última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), de reduzir o juro em apenas 0,25 ponto porcentual, e não mais em 0,50 ponto porcentual , não teve nenhuma relação com o PAC. Segundo este argumento, a decisão do Copom estava ligada à forte expansão dos gastos públicos no período pré-eleitoral.

Os seus críticos, no entanto, argumentam que o movimento feito pelo Banco Central é incompatível com o espírito do PAC. Eles sustentam que a principal variável do PAC é a forte redução da taxa de juros até o final do segundo mandato de Lula. Só desta forma, dizem, seria aberto espaço fiscal para os investimentos em infra-estrutura previstos no PAC. Ao mudar a trajetória dos juros, o BC encolheu o espaço para os gastos.

Hoje, no governo, os ministros Mantega, Dilma Rousseff (da Casa Civil), Tarso Genro (das Relações Institucionais), Luiz Marinho (do Trabalho), Luiz Fernando Furlan (do Desenvolvimento), além do vice-presidente, José Alencar, e do assessor especial Marco Aurélio Garcia, formam coro contra a política de juros do BC. Consultores informais do presidente Lula também bombardeiam a política de Meirelles, como é o caso do ex-ministro Delfim Netto e o deputado Ciro Gomes (PSB-CE).

A isso se somam lideranças do PT, como o seu presidente Berzoini e o senador Aloizio Mercadante (SP), estimulados pela redução da ênfase do PSDB na oposição ao governo. Nas discussões internas, Meirelles tem explicado que o atual movimento do câmbio é passageiro e de fôlego curto. A queda do dólar resultaria, segundo essas explicações atribuídas a ele, da decisão do Fed americano, que indicou a manutenção da taxa de juro nos Estados Unidos. Esse anúncio teria provocado movimentos especulativos em todo o mundo, incluindo o Brasil. A prova de que essa trajetória tem fôlego curto seria o comportamento de ontem do mercado de câmbio, quando o dólar subiu e atingiu R$ 2,092.