Título: 'O PDT resolveu apoiar o governo e eu me curvei'
Autor: Domingos, João
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/02/2007, Nacional, p. A6

Durante os quatro anos do primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Jefferson Péres (PDT-AM) foi um oponente que beirou a irascibilidade quando se referia às propostas do governo. No fim de agosto, na campanha eleitoral, ele chegou a dizer que o país vivia uma 'crise ética' e a 'putrefação moral', porque um presidente 'sabidamente conivente com um dos piores escândalos de corrupção' era o favorito nas pesquisas. Na última terça-feira, no entanto, Péres anunciou que dará 'apoio crítico' a Lula.

A mudança radical de posição do senador foi comunicada depois de audiência de mais de duas horas com o presidente, na companhia de outros dirigentes do PDT. Eles deixaram o encontro com a promessa de uma vaga no primeiro escalão para o partido, que passou para a base aliada do governo.

Em entrevista ao Estado, Péres disse que sua decisão de sair da oposição para o apoio crítico se deu por disciplina partidária e não por cargos que o partido possa vir a ter na administração de Lula. Afirmou que lutou contra a adesão do PDT à base governista, mas foi derrotado. De fato, ainda na campanha eleitoral, o senador admitia que, se seu partido aderisse ao governo, ele 'taparia o nariz' e acataria. Os principais trechos da entrevista:

Como o senhor vai se comportar agora em relação ao governo?

Apoio crítico. Não abdico disso. Fui contra a participação no governo. Achava que o PDT devia ficar independente. Sem aquela oposição ferrenha que fazem o PFL e o PSDB, mas fazendo oposição. Independente, sem participar de bloco oposicionista, numa linha de completa autonomia. Eu e o senador Osmar Dias (PR) fomos vencidos. O partido resolveu apoiar. Eu me curvei. Tinha dois caminhos. Ou aceitava isso ou deixava o PDT. Fui escolhido líder da bancada, mas não abdicarei. Vou dar apoio crítico. Sempre que entender que o governo merece críticas, as farei.

O senhor conversou com o presidente a respeito dessa mudança?

Disse a ele: passei quatro anos fazendo oposição ao senhor. Não disse contra o governo, para não causar constrangimentos, não quis ser grosseiro. Então, disse a ele que o partido decidiu apoiar e que vou seguir o partido.

Mas a mudança foi muito súbita...

Nem tanto. Sempre concordei com muitas coisas do governo Lula e disse isso várias vezes da tribuna. Por exemplo, a política econômica. Disse ao presidente que ele foi muito responsável, não seguiu economistas de seu partido e entendeu que a condução da política monetária teria de ficar a cargo do Banco Central. Disse ao presidente que ele está de parabéns por isso. Na política social, acho que o Bolsa-Família deveria ter uma porta de saída, preparar as pessoas para andar com as próprias pernas, mas de qualquer maneira tirou milhões da miséria absoluta. Disse ao presidente que se o governo não atrapalhar o País vai entrar no crescimento. Os fundamentos econômicos são bons. Disse-lhe que não precisa ter inveja do crescimento da Argentina e da Venezuela. A Venezuela está com inflação de 18% e a Argentina com 10%, maquiada. E o senhor está aí numa situação confortável. Disse ainda: Presidente, sou professor de economia, trabalhei 25 anos na Federal do Amazonas, e digo sem nenhum desejo de agradar, mas lhe digo que em 60 anos de história econômica do Brasil nós nunca vivemos uma situação econômica tão confortável.

O que achou do Programa de Aceleração do Crescimento?

O que vier em termos de aumento de investimentos, é claro que tem de apoiar. Mas faltaram duas coisas, que o presidente deveria ter anunciado logo. A consolidação do marco regulatório, que muita gente do PT ainda não entendeu que atrairia uma montanha de investimentos para a infra-estrutura. E faltou o governo ter dado uma sinalização forte para os agentes econômicos de que iria conter a expansão dos gastos correntes. Não digo cortar, porque isso é muito difícil. Mas acho que deveria ter apontado metas para que os gastos correntes caíssem.

O que acha da edição de medidas provisórias pelo presidente?

Acho exageradíssima. Temos de mudar isso. O Senado até já aprovou a mudança, mas a proposta está parada na Câmara.

Como o senhor fará na votação de um projeto do governo que for contra a sua consciência?

Libero o partido, me abstenho, voto contra, saio, mas não voto a favor. Fui eleito pelo PSDB, mas quando fui contra a reeleição do presidente Fernando Henrique minha situação ficou insustentável. Tive de deixar o partido. Soube que à época, lá no Planalto, mandaram buscar todos os cargos do senador Jefferson. Não tinha nenhum.