Título: Acordo do gás deve reduzir espaço da PDVSA na Bolívia
Autor: Brito, Agnaldo
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2007, Economia, p. B4

O acordo anunciado ontem entre os governos brasileiro e boliviano pode ter tirado o projeto de industrialização do gás natural boliviano das mãos da estatal venezuelana PDVSA e colocado nas mãos da Braskem, empresa do Grupo Odebrecht.

A PDVSA e a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) anunciaram, no fim do ano passado, um projeto para extrair do gás vendido ao Brasil frações nobres, como o etano, usado na indústria petroquímica, e o propano e butano, usados como GLP (gás de cozinha).

Um aditivo ao contrato de importação de gás natural da Petrobrás segrega essas frações para cobrança à parte. A perspectiva, a partir dessa decisão, é que a estatal brasileira finalmente construa a unidade de processamento para a extração dessas frações.

O projeto é a semente para a constituição de um pólo gasoquímico. Cria-se, com isso, uma base para a montagem de uma indústria petroquímica, projeto que tinha a participação da Braskem e cuja localização era Corumbá (MS). A reportagem do Estado tentou falar com a Braskem sobre a nova perspectiva, mas não obteve sucesso.

A Braskem esteve sempre interessada em utilizar o etano presente no gás boliviano para a produção de polietileno, uma das resinas para produção de plástico mais consumidas no mundo. Além da petroquímica, o negócio seria feito em parceria com a Petroquisa, braço petroquímico da Petrobrás. Estimativas indicam que o projeto pode render cerca de US$ 1,2 bilhão em receitas anuais.

'Ao aceitar assinar um aditivo ao contrato em vigor, no qual admite pagar mais por essas frações nobres, é de se supor que o projeto brasileiro de um pólo gasoquímico na fronteira seja de fato viabilizado', avaliou Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE).

Para Pires, ainda pairam dúvidas se a criação das duas categorias de produtos no gás boliviano (de maior e menor valor) não afeta os consumidores de gás em Mato Grosso do Sul, São Paulo e nos Estados do sul.

Saturnino Sérgio da Silva, vice-presidente e diretor de Infra-Estrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirmou ontem que as condições previstas nos contratos de compra do gás natural não se alteram com o acordo anunciado ontem. Ele disse que a Petrobrás e o Ministério de Minas e Energia asseguraram que o modelo de reajuste trimestral com base numa cesta de três óleos combustíveis (usados para balizar o preço do gás) está mantido.

A retirada de frações nobres do gás (agora pagas à parte) não afeta o setor. Segundo ele, a capacidade calorífica do combustível prevista em contrato será mantida. 'O setor industrial considerou bom o acordo e acha que, asseguradas essas condições, os investimentos em consumo de gás podem voltar', disse Silva. Sem a crise boliviana e com produção no Brasil, o consumo poderia crescer 20 milhões de metros cúbicos por dia. 'É o consumo que está represado', calcula Silva.