Título: Acordo evita revisão de contrato da estataL
Autor: Pamplona, Nicola
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/02/2007, Economia, p. B1

O acordo Brasil-Bolívia sobre o gás deverá evitar a renegociação do contrato que transformou a Petrobrás em prestadora de serviços na Bolívia, firmado em outubro de 2006 com a estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolívia (YPFB). Concluído na noite de quarta-feira passada, o acordo previu a elevação do preço do gás boliviano importado pelo País e a promessa de investimento de US$ 3 bilhões na construção de um pólo gasoquímico do lado boliviano da fronteira.

O recuo brasileiro, determinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, teve pelo menos um objetivo prático: poupar a Petrobrás de novos problemas jurídicos na Bolívia que, em última instância, poderia significar a perda de seu direito de operação em dois megacampos de gás no país.

Na negociação, o presidente boliviano, Evo Morales, garantiu ao governo brasileiro que o contrato de outubro será desengavetado e enviado o mais rápido possível para a aprovação do Congresso. Essa promessa deixou claro que a ameaça do novo presidente da YPFB, Manuel Morales, de rever o contrato, foi usada como moeda de troca na mesa de negociação.

Na noite de anteontem, com o retorno de Evo Morales e de sua delegação a La Paz, o governo boliviano deu sinais de que poderá cumprir a contrapartida. O ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas, declarou na ocasião que os contratos da YPFB com a Petrobrás e com outras 11 empresas serão encaminhados ao Congresso boliviano até 15 de março.

'O governo tem urgência porque, uma vez que os contratos sejam protocolados (registrados como recebidos pelo Congresso), seus termos começarão a ser implementados e isso significa maiores investimentos', afirmou Villegas, segundo nota da Agência Boliviana de Informação (ABI).

A iniciativa, entretanto, deverá desencadear uma nova disputa no governo boliviano. Empossado em 29 de janeiro, Manuel Morales tem um projeto claro: rever todos os 44 contratos assinados pela estatal com as multinacionais que atuam nos setores de gás e de petróleo no final de outubro. Fiel seguidor do partido de Evo Morales, o Movimento ao Socialismo (MAS), Manuel Morales substituiu Juan Carlos Ortíz, profissional do setor que antes havia presidido a Petrobrás da Bolívia.

A moeda de troca imposta na negociação desta semana, em Brasília, faz parte da estratégia de Evo Morales de alcançar seus objetivos. Não se trata de uma novidade para o governo brasileiro nem para a Petrobrás. O contrato de outubro foi 'arrancado' sob a clara ameaça de a companhia ser expulsa da Bolívia, o que poderia reduzir as garantias de abastecimento de gás ao Brasil. A Petrobrás cedeu à assinatura de um contrato que a subordinou às regras do decreto de nacionalização do setor de gás e de petróleo e a reduziu à condição de prestadora de serviços, remunerada pela YPFB e sem direito à comercialização do gás.

Em última instância, a reabertura do contrato de outubro poderá levar à perda completa de seu direito de operação nos megacampos de San Alberto e San Antonio e da exploração futura de jazidas ainda intactas.

Em grau menor, poderá eliminar algumas vantagens que conseguiu manter a duras penas, na negociação com a YPFB, em relação a suas concorrentes. A Petrobrás conseguiu esquivar-se do peso de 82% em pagamentos de impostos - previsto no decreto - e cravar 50% no contrato. A companhia também assegurou o recebimento dos valores relativos ao custo de produção e à amortização de seus investimentos nos dois campos.