Título: MST organiza jornada de ações a partir de março
Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/02/2007, Nacional, p. A7
As organizações que atuam em defesa da reforma agrária planejam para este ano uma jornada de movimentações sem precedentes nos primeiros quatro anos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Ela começa a ganhar corpo em março e deve atingir o pico em abril - mas prossegue de forma intensa durante todo o ano. Seus alvos principais serão o governo Lula e as empresas do setor do agronegócio, especialmente as que atuam com reflorestamento e sementes patenteadas.
¿Vamos aumentar a pressão, gastar mais o nosso gás, porque esse governo é igual feijão velho e duro - se não botar na panela de pressão, não cozinha¿, explica Marina dos Santos, porta-voz da coordenação nacional do Movimento dos Sem-Terra (MST). Resumindo o generalizado descontentamento que se observa no meio destas entidades em relação ao desempenho de Lula na área da reforma agrária, considerado pífio, ela acrescenta: ¿Estamos diante de um caso claro de dupla personalidade: é um governão eficiente e capaz para as grandes empresas; e governinho para os pobres.¿
Em março, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que reivindica terras para famílias que foram desapropriadas com a construção de hidrelétricas, fará manifestações nas capitais, para protestar contra o preço das tarifas de energia. O MST participará de atos contra o presidente americano George W. Bush, cuja visita ao Brasil, com propostas para o setor de produção de álcool, é vista como ingerência no modelo agrícola nacional.
Ainda em março, a Via Campesina, organização internacional, que no Brasil reúne cinco entidades, entre as quais a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o MST, põe em marcha uma série de ações contra o agronegócio. Seus representantes citam com freqüência a Aracruz - líder mundial na produção de celulose branqueada de eucalipto -, que tem entre seus acionistas uma instituição estatal, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A empresa é acusada por eles de causar desequilíbrios ambientais e uma nova fase de concentração de terras.
Abril é tradicionalmente o mês que concentra o maior número de invasões. Elas marcam o início da época do plantio e lembram o massacre de 17 de abril de 1996, em Eldorado dos Carajás, no Pará, quando 19 sem-terra foram mortos pela polícia. Neste ano, o número de invasões pode superar o do chamado Abril Vermelho, que assustou o governo Lula em 2004. A Via Campesina e a CPT também devem organizar um acampamento no centro de Belém.
Em data ainda não definida, mas que deve ser entre maio e junho, o MST pretende levar a Brasília cerca de 15 mil militantes, para participarem do 5º Congresso Nacional da entidade - e protestarem contra a lentidão da reforma agrária.
O congresso anterior foi realizado há sete anos, no governo de Fernando Henrique Cardoso, apontado como inimigo dos sem-terra. O de agora terá um clima de menos animosidade e existe a possibilidade de contar com a presença do antigo amigo Lula. Até agora, porém, nada foi acertado com o Planalto.
¿Esperávamos mais desse governo, que veio de um partido onde a reforma agrária parecia uma cláusula pétrea no seu programa¿, diz José Batista Afonso, da coordenação nacional da CPT. ¿O que vimos até agora foi frustrante: a reforma nunca foi assumida como política de governo e está desaparecendo até dos discursos.¿
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) vai seguir o ciclo de manifestações que faz todos os anos. A diferença, agora, segundo seu presidente, Manoel José dos Santos, é o esforço para reunir cada vez mais pessoas e cobrar as promessas do governo. Entre outros eventos, a Contag quer reunir 5 mil jovens agricultores em Brasília, no final de março, no Festival da Juventude; e 50 mil mulheres na Marcha das Margaridas, em agosto, também na capital federal.
Para Santos, o governo faria mais pela inclusão social se desse mais atenção à reforma agrária e à agricultura familiar.