Título: Cadastro ficava na mão de ONGs e grupos religiosos
Autor: Tosta, Wilson
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2007, Nacional, p. A8

Uma complexa articulação de 2 mil ¿colaboradores¿ - dos quais cerca de 1.600 eram sacerdotes de denominações religiosas, como igrejas evangélicas e católicas - e organizações não-governamentais (ONGs) marcou o Cheque-Cidadão. Esses parceiros é que cadastravam as famílias para receber o benefício.

Eles levavam os cadastros à então Secretaria da Família e Assistência Social e todo mês iam pegar os cheques - vales no valor de R$ 100 que podiam ser trocados apenas nos supermercados - para distribuí-los aos inscritos, famílias vivendo abaixo da linha da miséria. Os mercados entregavam os vales à sua associação, que os trocava por dinheiro, por sua vez repassado aos comerciantes que tinham vendido as mercadorias.

Com as mudanças, tudo isso acabou. O benefício será pago em dinheiro, em agências da Caixa Econômica Federal. O acúmulo de benefícios por cerca de 70% das famílias do Cheque-Cidadão vai acabar: nos próximos meses todos serão transferidos para o Bolsa-Família e passarão a receber só esse valor a partir de maio.

O procedimento será outro para quem está inscrito apenas no Cheque-Cidadão: só passará para o Bolsa se, depois de cadastrado no programa federal, via prefeituras, demonstrar que tem direito ao benefício, por suas condições sociais. Caso contrário, não receberá mais nenhum dos dois benefícios.

A Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos já começou a cruzar os cadastros do Cheque e do Bolsa-Família, ajudada pela estatal de processamento de dados, o Proderj. A governadora anterior, Rosinha Garotinho, se recusava a compartilhar os cadastros do Rio com a União. Estima-se que o Estado gastava R$ 120 milhões anuais com o Cheque-Cidadão.

CRÍTICAS

Criados ainda no governo Anthony Garotinho (1999-2002), os programas sociais que o governo Sérgio Cabral Filho quer extinguir ou dividir com o governo federal desde o início provocaram controvérsia. Seus críticos reclamavam que os programas eram usados de forma populista ou assistencialista, apontando manipulação política da miséria. Os Garotinho sempre negaram essas acusações e classificavam de elitistas todos os que faziam críticas.

Em entrevista ao Estado, no fim de 2006, para analisar a herança deixada pelos Garotinho, o coordenador da Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida, Maurício Andrade, disse que os últimos oito anos de governo no Rio tiveram como ¿marca favorável¿ a pretensão de ter uma atuação abrangente na área social. Mas criticou o que classificou de falta de transparência do setor, que, segundo ele, não divulgava informações detalhadas sobre a aplicação dos recursos que recebia.

Andrade também atacou o tamanho dos programas, considerado pequeno, e a intensa propaganda do governo estadual em torno deles. Outro problema que marcou a gestão de Rosinha, na sua opinião, foi a falta de integração entre governo federal, Estado e municípios para tratar das questões sociais.

¿É uma política menor, provinciana, da maioria dos Estados e também do Rio: há uma disputa pela pobreza para garantir a dependência do pobre¿, disse ele. ¿Uma política mesquinha e atrasada, cada governo que assume inventa um nome novo para os programas. Uma concorrência burra.¿