Título: Fabricante quer sobretaxa contra importado chinês
Autor: Komatsu, Alberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/02/2007, Economia, p. B5

No último trimestre do ano passado, 12 setores industriais brasileiros entraram com novo pedido de investigação de dumping contra produtos importados da China. Ao contrário do duelo Brasil-China, que ganhou notoriedade por causa da indústria têxtil, desta vez a guerra é de bugigangas, como são conhecidas as miudezas facilmente encontradas em ambulantes.

São escovas de cabelo, enfeites de Natal, cadeados, óculos escuros e pneus para bicicletas, cujos fabricantes nacionais decidiram não assistir passivamente ao encolhimento de seu parque industrial. Caso não seja estabelecida uma sobretaxa para os similares chineses, executivos falam até em fim da atividade.

O setor de escovas para cabelo tinha 30 fábricas no País e dominava 100% do mercado, em 2000. Agora, restaram dois fabricantes, que respondem por 20% deste segmento. O presidente do Sindicato da Indústria de Móveis de Junco e Vime e Vassouras e de Escovas e Pincéis no Estado de São Paulo (Simvep), Manoel Miguez, diz que as demissões no período chegam a 1.500. ¿Algumas empresas que fabricavam escovas desistiram do investimento e passaram distribuir aqui produtos importados da China¿, afirma Miguez.

Ele conta que o imposto cobrado sobre as escovas no mercado chinês é de 17%, e depois de subsídios e deduções a taxa cai para 1%. Os encargos salariais, que no Brasil são de 107% ao mês, diz Miguez, se restringem a 8% na China.

Também diretor da Escovas Fidalga, Miguez afirma que um terço da capacidade instalada está ociosa. Ele diz que o objetivo do pedido de investigação de dumping é estabelecer uma sobretaxa ao produto chinês para que a indústria brasileira possa competir em condições de igualdade. ¿Somos contra cotas. Não queremos barreiras para ter reserva de mercado, que tem de ser aberto.¿

¿Um pedido de investigação de dumping é feito quando um produto exportado para o Brasil tem preço inferior ao seu valor de custo, causando estragos no mercado doméstico¿, afirma o secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China, Rodrigo Maciel. Ele explica que, se for comprovada a prática de dumping, é fixada uma sobretaxa. Diferente da solicitação de salvaguarda, que resulta num limite de exportações.

CADEADOS

As duas maiores fabricantes de cadeados do País, a Pado e a Papaiz, defendem a renovação de uma sobretaxa de 63% sobre os produtos chineses. Executivos das duas empresas dizem que o cadeado chinês é vendido no País por um preço menor do que o custo da matéria-prima, que é o latão. Em relação ao produto nacional, o chinês tem, em média, preço 40% inferior.

¿Se um produto é equivalente ao brasileiro ou melhor, eu concordo com a competição. Só não concordo com o prejuízo ao consumidor¿, afirma o presidente do conselho de administração da Pado, Alfons Gardemann. Caso não seja renovada a sobretaxa para o produto chinês, ele diz que terá de demitir 500 funcionários, de um total de 960. A ociosidade da fábrica está em 20%. A Pado, diz o executivo, tem redirecionado sua produção para fechaduras. E passou a fazer serviços que eram terceirizados, como polimento dos cadeados.

A Papaiz já tem estudado planos alternativos para a possibilidade de o governo não renovar a sobretaxa para o produto importado da China. A presidente do conselho de administração da empresa, Sandra Papaiz, diz que já pensou em mudar o perfil da companhia: de produtora para distribuidora. Segundo ela, a empresa importaria cadeados prontos, até mesmo da China, para distribuí-los no País com a marca Papaiz. ¿Mas não queremos virar comerciantes. Nossa vocação é a indústria¿, afirma Sandra.

É possível comprar uma cartela com 12 cadeados pequenos fabricados na China por R$ 30. Esse é o preço cobrado por um ambulante no centro do Rio. De acordo com o vendedor, que pediu para não ser identificado, o preço para ele sai por R$ 13. Sua barraca vende utilidades e ferramentas e 90% dos produtos são chineses. O líder de vendas, conta, é o cadeado.

As fabricantes de pneus para bicicletas estão atualmente com 20% de ociosidade na produção, conta o diretor-geral da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (Anip), Vilien Soares. Segundo Soares, o objetivo da investigação de dumping é aumentar a atual sobretaxa sobre o produto chinês de US$ 0,15 para US$ 0,85 por quilo.

¿O setor teve que redirecionar a produção. As fabricantes não fazem somente pneus para bicicletas, mas para outros veículos, como motocicletas¿, afirma Soares. O Departamento de Defesa Comercial (Decom), órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento responsável pelas investigações de dumping, informa que, assim que são protocolados, os pedidos têm prazo de até 18 meses para serem concluídos.