Título: Petróleo e aço trazem riqueza e homicídios
Autor: Carranca, Adriana
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2007, Especial, p. H2

A promessa de emprego fácil e de melhor qualidade de vida que surgiu com a chegada, em 1970, da indústria do petróleo em Macaé, antiga vila de pescadores do norte fluminense, associou a cidade à imagem de um porto seguro para se morar. Menos de três décadas depois, o eldorado se revelou uma fraude, pois, embora esteja entre os dez maiores PIBs do País, tem a marca da desigualdade social e figura na lista dos dez municípios com as mais altas taxas de homicídios do Brasil.

A história de Macaé guarda semelhanças com a de Serra, pólo siderúrgico da região metropolitana de Vitória, no Espírito Santo. E não só pela disposição no ranking da violência. As duas cidades, anunciadas como terras de oportunidades, sofreram um processo de urbanização acelerado, com uma rede social e uma infra-estrutura de serviços que não acompanharam o ritmo do crescimento populacional. Os postos de trabalho se mostraram inalcançáveis para muitos, em decorrência da qualificação profissional.

A maneira como as transformações se deram, segundo especialistas, pode ajudar a compreender o motivo de Serra ter hoje a 4ª maior taxa de homicídios do País, e Macaé, a 10ª. Considerando apenas a população juvenil, elas ocupam, respectivamente, a 2ª e a 5ª colocações. O Estado do Rio surge ainda na lista com Itaguaí, onde está localizado o Porto de Sepetiba, e o Espírito Santo aparece com a capital Vitória, e Cariacica, na região metropolitana, também caracterizada pela ocupação acelerada do espaço urbano.

¿Venderam uma imagem muito simplificada de Macaé. A cidade acabou crescendo de forma desordenada, grande parte dos migrantes ficou fora da indústria do petróleo e houve especulação imobiliária¿, avalia Faber Paganoto, geógrafo do Grupo de Estudos Espaço e População, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. ¿Tudo isso vai ter como conseqüência o aumento da violência.¿

Segundo ele, os recursos públicos em Macaé, que tem 160 mil habitantes e onde o PIB saltou de R$ 2,7 bilhões para R$ 18,3 bilhões, entre 1999 e 2004, estão concentrados nos bairros mais ricos. Só nos últimos seis anos, o repasse de royalties e participações especiais provenientes do petróleo cresceu mais de 1.000%, chegando a R$ 390 milhões. A cidade, diz o secretário de Governo André Braga, paga o preço de ter sido anunciada como um paraíso. ¿A facilidade é para poucos. Que sirva de exemplo para que outros pólos invistam logo em qualificação para a população local ter emprego¿, diz.

Em Serra, a propaganda de que havia emprego para todos na cidade também vingou. Secretária-executiva do Centro de Defesa dos Direitos Humanos, Marta Falqueto conta que, em 1970, havia 35 mil moradores. Hoje são estimadas 394 mil. ¿O dinheiro que as pessoas trouxeram era pouco, não deu nem para construir as casas. Muitos caíram na informalidade, outros na prostituição e na criminalidade. Mas isso não explica tudo em relação à violência¿, alerta, citando como outras razões a existência de grupos de extermínio, a impunidade e carência de vagas no ensino médio e de policiais.

Coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade Federal do Espírito Santo, Cláudio Zanotelli ressalta que a questão não é criminalizar a pobreza, mas compreender que, de fato, há uma associação entre urbanização acelerada e violência, e que o poder público precisa responder com políticas sociais. ¿Estão querendo armar a guarda municipal em Vitória. É uma visão puramente repressiva. Não é por aí.¿

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Estado diz que os investimentos nas áreas social e de segurança só voltaram a ocorrer em 2003, ¿depois de uma década de governos marcados por escândalos¿.