Título: Aliados brigam por pastas que atendem prefeitos
Autor: Leal, Luciana Nunes e Samarco, Christiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/02/2007, Nacional, p. A4

Não são apenas recursos bilionários que atraem o interesse dos partidos por alguns ministérios, gerando um impasse até agora insolúvel na construção do primeiro escalão do governo. Além do dinheiro, programas espalhados por mais de 5 mil municípios, como os do Ministério da Saúde, e obras de grande visibilidade, como as moradias populares do Ministério das Cidades, alimentam a disputa entre os aliados.

Criado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro mandato, o Ministério das Cidades está agora no centro da briga entre PT e PP por ser considerado uma alavanca para a sucessão presidencial de 2010.

O atual ministro, Márcio Fortes, não faz esta associação direta, mas reconhece o impacto das ações de sua pasta. ¿Quando você entrega uma casa ao cidadão, vê o cidadão olho no olho. Quando entrego uma chave da porta da casa, vejo a alegria das pessoas. É um ministério que fala com o cidadão diretamente. E que trata da vida cotidiana, de água, esgoto, de contenção de barreiras, de acesso dos portadores de deficiência, de vias expressas, de regularização fundiária¿, descreve Fortes, indicado pelo PP, que tenta mantê-lo no cargo. No entanto, está no páreo a petista Marta Suplicy, ex-prefeita de São Paulo e um dos nomes do partido para concorrer de novo à prefeitura ou até à Presidência.

Outro ponto de atração do ministério é a proximidade com prefeitos, por causa do grande número de parcerias firmadas diretamente com os municípios. Prefeitos satisfeitos são preciosos cabos eleitorais no futuro. ¿Temos intensa relação com governos estaduais, prefeituras e com deputados e senadores. Mas sou técnico e minha missão é cumprir a política do governo¿, diz Fortes.

No caso da Saúde, o fato de as ações estarem espalhadas pelo País quase todo é o grande trunfo que faz o PMDB, atual detentor do ministério, travar uma briga interna pela pasta. Existem ainda programas de grande apelo, como as farmácias populares e atendimento odontológico. Se o ministro for um político com senso de oportunidade, terá chances preciosas de aparecer, seja na entrega de uma ambulância ou aplicando a primeira dose em um bebê nas campanhas de vacinação.

Além dos programas de atendimento direto ao público, o escândalo dos sanguessugas mostrou os interesses escusos que envolvem a Saúde. A descoberta da máfia que aprovava emendas para compra superfaturada de ambulâncias expôs relações criminosas entre parlamentares, governantes e funcionários do ministério.

Também o Ministério da Integração Nacional foi alçado à condição de um dos mais cobiçados, por causa da expectativa de que, finalmente, Lula ponha em prática o plano de transposição do Rio São Francisco, que pretende deixar como marca de seu governo. A obra terá investimento federal de R$ 6,6 bilhões e, embora enfrente a resistência de Bahia e Alagoas, é a grande esperança de Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Para levar adiante o plano ambicioso, o ministro (que atualmente é Pedro Brito) terá que vencer as barreiras da Justiça, como ações impetradas por prefeituras e ambientalistas.

Com a experiência de quem lidera a bancada do governo no Senado e já foi ministro da Previdência, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) explica que, do ponto de vista do Congresso, a Esplanada dos Ministérios se divide em quatro categorias: os cobiçados, os estratégicos (Fazenda, Planejamento, Casa Civil e Relações Institucionais), os institucionais (Justiça, Relações Exteriores, Defesa, Desenvolvimento e Comunicações) e os intermediários (Ciência e Tecnologia, Esportes e Turismo). Para Jucá, Integração Nacional é importante - interessa muito ao Nordeste -, está na lista dos cobiçados, ao lado de Saúde, Transportes, Educação e Cidades, mas é tido como uma pasta regional. Uma das vantagens da Integração Nacional é a capilaridade, ou seja, o fato de chegar a um grande número de municípios. ¿Ainda assim, é considerado um ministério regional¿, afirma Jucá.

Na disputa pela Integração Nacional, um dos cotados é o deputado baiano Geddel Vieira Lima (PMDB), representante de um Estado contrário à transposição do São Francisco. O PSB, que ocupa o ministério atualmente, não está disposto a entregar a pasta. Se virar ministro, Geddel vai trabalhar para garantir políticas compensatórias à transposição.

Ninguém briga por Ciência e Tecnologia ou pelas secretarias especiais que, além de orçamentos apertados e engessados, têm ações mais pontuais e de pouca publicidade. Um importante líder do PSB diz que é uma honra estar à frente do Ministério da Ciência e Tecnologia, mas que é de pouca serventia para atender aos reclamos das bases eleitorais, já que não tem representação nos Estados nem pode empregar os correligionários, já que os cargos de direção são técnicos demais e, por isso, reservados mais a cientistas do que a apadrinhados.