Título: Nogueira Batista vai para o FMI
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Fonte: O Estado de São Paulo, 24/02/2007, Economia, p. B6
Crítico da atual política econômica do governo e um dos formuladores da moratória da dívida externa brasileira em 1987, o economista Paulo Nogueira Batista Júnior foi indicado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para representar o Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI). Ele vai substituir Eduardo Loyo, que deixou o posto de diretor-executivo ¿por motivos de ordem pessoal¿, segundo nota divulgada ontem pelo Ministério da Fazenda.
Com isso, mais um economista conservador, remanescente da equipe do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, vai desembarcar do governo, acentuando os temores de que está em andamento uma mudança na condução da política econômica. A troca está programada para abril, após a reunião de primavera do Fundo. ¿Isso está parecendo o cerco de Stalingrado. Daqui a pouco, vão cortar a luz e a água¿, desabafou um integrante do Banco Central (BC).
Assim como no célebre episódio da segunda guerra mundial em que a cidade russa bloqueou durante meses o avanço das tropas nazistas, a diretoria do BC vem se transformando em uma espécie de célula de resistência da ortodoxia econômica dentro da equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Numa semana repleta de especulações sobre trocas na diretoria do BC, a notícia da saída de Loyo caiu como uma bomba.
Antes de ir para o FMI, Loyo havia sido integrante da diretoria do BC. Lá, ele teve uma atuação muito estreita com Afonso Bevilaqua, que ocupa o topo de lista de prováveis demitidos da instituição.
Nogueira é crítico da política de juros, apontada por ele como a principal causa da atual valorização do real ante o dólar. Ele até escreveu um artigo sobre a atuação de Bevilaqua, no qual informa que o diretor do BC é gordo e tem muito peso nas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom), que fixa a taxa de juros.
¿É estranho que um crítico da política monetária tenha sido escolhido para representar o Brasil em um foro ortodoxo como o FMI¿, comentou o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria Integrada. ¿É típico das contradições deste governo.¿
Entre os técnicos da área econômica, a escolha foi interpretada como uma atitude de ¿enfrentamento¿ do Fundo. Nogueira Batista era assessor para Assuntos da Dívida Externa do Ministério da Fazenda em fevereiro de 1987, quando o Brasil deixou de honrar seus compromissos externos.
Mais recentemente, escreveu artigos elogiando a reestruturação da dívida argentina, condenada pelo FMI. O Fundo prega políticas responsáveis nas finanças internacionais, justamente o contrário dos calotes.
Apesar de toda a carga simbólica, a ida de Paulo Nogueira Batista ao FMI não deverá trazer problemas para o País, avalia Mailson. Primeiro, porque o Brasil está longe de precisar de um novo empréstimo do organismo internacional. ¿Estamos tendo quase uma indigestão de reservas internacionais¿, comentou.
Em dezembro de 2005, o Brasil quitou antecipadamente as dívidas que tinha com a instituição e hoje só se relaciona com o FMI na condição de sócio e fundador.Além do mais, o economista irá ao FMI como representante do governo. Nessa condição, terá de deixar suas opiniões pessoais de lado e defender a política econômica oficial. Finalmente, qualquer eventual tentativa de abalar as estruturas do FMI e suas políticas deverá se perder em meio à pesada burocracia da instituição. ¿Nada lá muda em menos de dois anos¿, afirmou o ex-ministro.
¿Não há conseqüências de ser irrelevante¿, alfinetou um técnico. O problema, alertam interlocutores experientes do FMI, é a tendência de perda de qualidade no diálogo com o organismo internacional.
O FMI não pode rejeitar o nome, mas Nogueira Batista representará um grupo de países e precisa da aprovação deles. O grupo é formado por: Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago.