Título: Investimento e arbitragem
Autor: Wald, Arnoldo
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/02/2007, Economia, p. B2

Há, atualmente, um consenso quanto à necessidade fundamental da realização de importantes investimentos na infra-estrutura para superar os gargalos existentes e garantir, assim, não só o crescimento do País, mas também o seu desenvolvimento. Reconhece-se, por outro lado, que os recursos necessários devem ser tanto públicos como privados, nacionais e estrangeiros, pois os montantes necessários não podem ser atendidos sem a conjugação de esforços de todos os interessados, utilizando-se tanto os financiamentos quanto as diversas formas de joint venture.

Com a aprovação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a criação de um clima de confiança retomamos uma fase de realização de grandes obras públicas que, na maioria dos casos, vai depender de parceria entre o Estado e a iniciativa privada. Cabe, aliás, lembrar que, mesmo em relação aos investimentos das estatais e até do FGTS, existem interesses privados legítimos que devem ser resguardados, abrangendo os dos acionistas minoritários, no primeiro caso, e os dos trabalhadores, no segundo. Ora, é sabido que, em todo empreendimento no qual se unem parceiros com interesses distintos, podem surgir, no decorrer do tempo, divergências e até conflitos cujas soluções devem ser objeto de previsão nos instrumentos contratuais, a fim de evitar decisões arbitrárias e as que sejam de insegurança jurídica.

A arbitragem tem sido um método feliz e eficaz de encontrar fórmulas conciliatórias e garantir soluções equilibradas nas eventuais divergências entre o poder público e o empresariado. Nos últimos dez anos, em virtude de nossa nova legislação e de uma jurisprudência construtiva dos tribunais, em particular do STF e do STJ, conflitos entre entidades públicas e concessionárias puderam ser resolvidos mediante decisões arbitrais, que, na maioria dos casos, têm sido cumpridas sem maiores delongas.

Considerando a relevância do bom funcionamento das instituições para incentivar e garantir os investimentos, especialmente os realizados em contratos de longo prazo, torna-se importante fortalecer a arbitragem e não permitir que interferências indevidas venham a prejudicar a sua utilização.

Em primeiro lugar, cabe desfazer as eventuais dúvidas remanescentes quanto ao uso da arbitragem em todas as relações entre as autoridades e o empresariado, que já foi consagrado pela lei nas concessões e nas Parcerias Público-Privadas (PPPs). Essa arbitragem deve ser independente e institucional, e não pode ser atribuição da agência reguladora, pois lhe é vedado ser, ao mesmo tempo, parte e juiz no litígio. Acresce que o caráter institucional da arbitragem dá garantias quanto às normas aplicáveis, que nem sempre existem quando falta o controle de uma Câmara experiente e responsável perante a sociedade.

No direito societário, é também preciso que as estatais, como as demais empresas privadas, utilizem a arbitragem para resolver eventuais divergências entre a maioria e os minoritários, garantindo, assim, adequadamente a governança corporativa, que tem sido uma das preocupações do governo, conforme salientado em entrevista dada pela ministra-chefe da Casa Civil.

Também é preciso evitar qualquer restrição à autonomia de vontade das partes, na nomeação e no funcionamento dos árbitros, descabendo, pois, uma regulamentação na matéria, que se pretendia realizar no Ministério da Justiça. Sendo a arbitragem um instituto que reflete a liberdade para encontrar soluções pacíficas e eficazes, não se justificam medidas restritivas. Quando muito, o que se pode admitir - e até recomendar - é o cadastramento das Câmaras de Arbitragem, a fim de evitar o funcionamento de instituições inidôneas.

Finalmente, talvez tivesse chegado a hora de repensar na negociação de tratados internacionais de proteção aos investimentos com novas características. Seriam convenções de terceira geração que dariam ao capital estrangeiro investido em infra-estrutura as mesmas garantias de equilíbrio econômico-financeiro asseguradas às empresas nacionais.

Considerando-se que as políticas públicas mudam, de acordo com as contingências até em virtude de alterações do contexto internacional, a garantia de segurança jurídica dada ao investidor constituiria um importante incentivo para colocar os seus recursos na infra-estrutura de nosso país. A arbitragem seria a forma de assegurar uma solução rápida e eqüitativa no caso do conflito, conciliando os interesses privados e públicos.