Título: Lula vai à Guiana, por causa de Chávez
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/03/2007, Nacional, p. A18

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa hoje na Guiana, antiga colônia inglesa no Caribe, da reunião do Grupo do Rio, um organismo considerado fantasma pela diplomacia latino-americana, formado por 20 países da região. A princípio, ele resistia a participar do encontro. Só confirmou presença depois que o venezuelano Hugo Chávez, avisou ao presidente da Guiana, Bharrat Jagdeo, que estava a caminho de Georgetown. É consenso entre diplomatas que Lula está empenhado em deter a influência de Chávez.

A uma semana da visita a São Paulo do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, Lula se esforça para mostrar que o Brasil é um interlocutor influente de Washington num continente de governos radicais, segundo diplomatas.

Criado em 1986 para discutir uma crise na Nicarágua, o Grupo do Rio foi esvaziado com a criação de novos blocos econômicos e políticos - e mesmo com os apelos do governo da Guiana vão sobrar cadeiras no encontro. Os organizadores esperam apenas oito presidentes em Georgetown, uma cidade que chama a atenção pela pobreza e por igrejas e sobrados de madeira em estilo vitoriano, mal-conservados e abandonados.

Lula desembarcou ontem à tarde em Georgetown, acompanhado de comitiva integrada pelo assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia e pelo ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. Antes do encontro de hoje, Lula tomará café da manhã com a presidente do Chile, Michelle Bachelet, e o do México, Francisco Calderón. Anfitrião do encontro do Grupo do Rio, Bharrat Jagdeo oferecerá um almoço aos visitantes.

A agenda não estava fechada e o encontro estava sem foco até minutos antes da chegada de Lula a Georgetown. A Declaração de Turkaeyen pode incluir temas que vão da questão nuclear do Irã a promessas não cumpridas de ajuda dos EUA ao Haiti. Não deve faltar no documento assuntos como a democratização nas Nações Unidas e na Organização Mundial do Comércio, o meio ambiente e a produção de combustíveis limpos.

Presidente de um dos cinco países mais pobres da América Latina, Jagdeo vai tentar tirar proveito do encontro para discutir com Chávez um problema de fronteira com a Venezuela que se arrasta dede 1899. Também vai implorar para Lula cumprir promessa feita há dois anos de retomar as obras da ponte sobre o Rio Tacutu, ligando a Guiana a Roraima. A construção foi paralisada em 2001, depois que o Tribunal de Contas da União detectou desvio de recursos.

A Guiana espera ainda ganhar apoio para que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) perdoe uma dívida de US$ 248 milhões. O BID já se manifestou favorável ao perdão de dívidas na América Latina. Bolívia, Haiti, Honduras e Nicarágua também podem ser beneficiados pela decisão. O anúncio oficial sai neste mês.

A reunião anterior do Grupo do Rio ocorreu no ano passado, na Argentina. Diplomatas defenderam a realização de mais um encontro, o 19º desde os anos 1980. ¿Quando há graves problemas, como a crise na Nicarágua ou o golpe na Venezuela, o grupo aparece¿, disse o coordenador brasileiro do Grupo do Rio, Eduardo Gradilone.

Terceiro na hierarquia do Itamaraty, o subsecretário para América do Sul, Jorge Taunay, admitiu que há preocupação em evitar ¿duplicação de esforços¿, como definiu o problema do excesso de organismos políticos. ¿Nós na América Latina estamos conscientes de que temos de estar preocupados com isso.¿ Taunay afirmou que o Mercosul, a Comunidade Sul-Americana de Nações e o Grupo do Rio têm ¿finalidades diferentes¿. ¿Uma coisa não esvazia a outra.¿