Título: O bloqueio de bens do PT
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2007, Notas e Informações, p. A3

É importante que se deixe claro - para que os desavisados não tratem o assunto como mera intriga política - que bloqueio de bens não significa condenação decretada, comprovação irrefutável de culpa ou conclusão irrecorrível de processo judicial. O bloqueio tão-somente assegura a concretização de ressarcimentos a serem, eventualmente, determinados pela Justiça. Isto posto, o pedido de bloqueio de bens do Partido dos Trabalhadores (PT) e do secretário particular do presidente Lula, Gilberto Carvalho, por suposto envolvimento em esquema de propinas que teriam operado na área de transporte coletivo na gestão de Celso Daniel - o prefeito de Santo André assassinado em 2002 -, é uma conseqüência natural e necessária de um longo processo investigativo de cinco anos, feito pelo Grupo de Repressão ao Crime Organizado do ABC, braço do Ministério Público (MP). Não cabe, aqui, avaliar se os valores a serem bloqueados devam ser iguais, maiores ou menores do que o montante de R$ 5,3 milhões, constante do pedido dos promotores.

Na ação civil pública distribuída para a 7ª Vara Cível do Fórum de Santo André, os promotores Roberto Wider Filho, Adriana Ribeiro Soares de Morais e Amaro José Thomé Filho sustentam que um grupo de empresários e agentes políticos municipais violou a Lei da Improbidade Administrativa. Além de Gilberto Carvalho e do PT, são acusados solidariamente na ação os empresários Sérgio Gomes da Silva - ex-segurança de Celso Daniel, conhecido como ¿Sombra¿, acusado pelo Ministério Público de ser o mandante da morte do prefeito e que esteve preso preventivamente entre dezembro de 2003 e junho de 2004 -, Ronan Maria Pinto, Irineu Nicolino Martin Bianco, Humberto Tarcisio de Castro, Luiz Marcondes de Freitas Júnior, o ex-vereador petista Klinger Luiz de Oliveira Souza e a empreiteira Projeção Engenharia Paulista de Obras. Os promotores também pedem a condenação de Carvalho à suspensão dos direitos políticos, perda da função pública e ressarcimento do Tesouro. Para eles, parte do dinheiro que teria sido arrecadado ilicitamente abasteceu campanhas eleitorais do PT.

Estimam os representantes do MP que o prejuízo sofrido pela prefeitura de Santo André é de R$ 5,3 milhões. ¿O PT recebeu parcela daqueles recursos, por isso não é justo que fique fora da ação¿ - observou o promotor Wider. Quanto a Gilberto Carvalho, o promotor afirma que ele ¿agia em nome próprio e em função da quadrilha; sua missão era encaminhar o dinheiro ao partido¿. O resumo conclusivo do Ministério Público, após cinco anos de investigação, é direto, enfático e contundente: ¿Formaram uma quadrilha determinada a arrecadar recursos através de achaques a empresários, bem como através de desvio de dinheiro dos cofres públicos municipais, conforme outras denúncias já ajuizadas, relativas a contratos de obras públicas e de coleta e destinação final de lixo, ambas recebidas judicialmente.¿

Foi no esquema espúrio de arrecadação de recursos eleitorais, montado em Santo André - e depois em outros municípios -, que, provavelmente, se originou o processo de deterioração ética de um partido que tinha na ¿ética na política¿ uma de suas principais bandeiras ideológicas. Mensalão, valerioduto, sanguessugas, assim como eufemismos que seriam apenas ridículos se não fossem trágicos, em termos de padrões éticos do espaço público, são os novos termos da linguagem política cabocla, gerada, justamente, por esquemas como o de Santo André. Não nos esqueçamos, porém, que no campo da tragédia ainda há uma, em aberto, sobre a qual a sociedade brasileira está longe de ser esclarecida: é o assassínio brutal do prefeito Celso Daniel, então coordenador do programa de governo do candidato Luiz Inácio Lula da Silva. As responsabilidades por esse crime hediondo ainda não foram devidamente apuradas. As conclusões a que chegou a polícia paulista não são peremptórias e os fatos permitem supor que nem tudo foi esclarecido. Afinal, uma fartura de indícios mostra que não se pode separar o caso do ¿propinoduto¿ da cruel eliminação de Celso Daniel.