Título: Ameaça ao transporte
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2007, Notas e Informações, p. A3

O contrato firmado entre a Prefeitura e 6,4 mil perueiros, concentrados em nove cooperativas, está ameaçado. A 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça (TJ), de São Paulo, ratificou liminar de primeira instância que declarava nula a licitação feita em fevereiro de 2003 para contratação dos operadores. A liminar foi concedida na ação impetrada pelo perueiro autônomo João de Deus Rodrigues Romão, que alegou desrespeito à Lei Municipal 13.241/01, que previa a contratação de 4,9 mil operadores organizados ou não em cooperativas.

A Prefeitura recorreu da decisão ao Supremo Tribunal Federal (STF) argumentando que a legislação permitia ao Município escolher entre a contratação de pessoas físicas ou jurídicas. No último dia 12, a presidente do STF, ministra Ellen Gracie, recusou-se a conhecer o pedido do governo municipal para suspender os efeitos da liminar. Conforme a ministra, o Supremo não pode julgar a causa, porque não se trata de questão constitucional, mas, sim, de legalidade. A Prefeitura aguarda, ainda, a apreciação de outros recursos, encaminhados à presidência do Tribunal de Justiça. Há também a possibilidade da apresentação de recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Se a decisão de primeira instância for mantida, a Prefeitura será obrigada a cancelar os contratos para a prestação de serviços que movimentaram, no ano passado, R$ 1,2 bilhão, no transporte de 91 milhões de passageiros por mês. Sem os microônibus e vans, o novo modelo de transporte público não funcionará.

Os veículos menores de transporte de passageiros passaram a ter importância fundamental no Sistema Integrado de Transporte Urbano, implantado na gestão Marta Suplicy. Tirar os perueiros da ilegalidade e integrá-los ao sistema formal era absolutamente necessário, tanto para a melhoria do serviço prestado como para o controle da qualidade do transporte - principalmente no item segurança - e para a ampliação do atendimento à população.

Pelo novo modelo de transporte, os ônibus passaram a atender às linhas estruturais, circulando pelos principais corredores de ligação dos bairros com o centro da cidade. Microônibus e vans cumprem itinerários internos nos bairros, atendendo à movimentação local de passageiros. O sistema teve a aprovação geral dos especialistas em transporte público. O modelo assegura a prestação do serviço principalmente aos moradores das periferias distantes, onde os ônibus de grande porte não conseguem circular por causa das más condições das vias e do alto custo para as empresas.

A decisão do TJ pode, assim, anular todo o esforço para melhorar o serviço de transporte da capital. A disputa judicial se iniciou em 2003, quando o juiz Edson Ferreira da Silva, da 13ª Vara da Fazenda Pública, determinou a suspensão do processo de contratação das cooperativas de perueiros por considerar ilegal a exclusão dos autônomos. Na época, a Prefeitura conseguiu, por meio de recursos, levar adiante a licitação. O contrato com as cooperativas, válido até 2010, foi firmado no valor de R$ 2,4 bilhões.

No segundo semestre de 2006, os desembargadores do TJ, Elmano de Oliveira, Luís Ganzerla, Aroldo Viotti e Ricardo Dipp, negaram recursos apresentados pela administração municipal contra a ação do perueiro autônomo João de Deus Rodrigues Romão. Vários outros pedidos de liminar para barrar a licitação foram apresentados, em 2003, pela Associação de Transportadores em Auto Lotações do Estado de São Paulo que quer, agora, que a Prefeitura cancele imediatamente os contratos com as cooperativas.

O sistema de transporte entraria em colapso e milhões de pessoas seriam prejudicadas. A decisão da Prefeitura de contratar cooperativas e não autônomos é tecnicamente correta. Afinal, que sistema administrativo seria necessário para fiscalizar e controlar o serviço prestado por 6,4 mil perueiros? Sabendo-se que se trata de um setor visado por máfias, inclusive de traficantes, quanto mais pulverizado estivesse muito mais difícil seria mantê-lo sob regras e muito mais complicado garantir a segurança dos passageiros.

O que deve prevalecer é o interesse de toda a população e não apenas o de alguns perueiros.