Título: Ilan Goldfajn aprova decisão do BC
Autor: Racy, Sonia
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2007, Economia, p. B2

Consultado sobre a decisão do Copom, o ex-BC Ilan Goldfajn, hoje dirigente da Ciano Investimentos, evita se aprofundar, limitando-se a dizer que achou a decisão boa, avaliando que o debate sobre a política monetária tem perdido perspectiva. Sobre o cenário internacional, Goldfajn acredita que os EUA entraram em novo ciclo econômico.

Veja aqui trechos da sua entrevista dada à coluna:

O que o senhor achou do resultado do Copom?

Havia espaço para mais? Achei a decisão boa, dentro do esperado pelo mercado e indicado pelo Banco Central (BC). Acredito que, ao longo do ano, vai ficar claro que a inflação está de fato sob controle, apesar das ameaças de uma demanda mais forte. Isto permitiria reduções adicionais de juros pelo BC.

Como o senhor está vendo a dosagem da política monetária?

O debate sobre a política monetária tem perdido a perspectiva maior. A inflação foi debelada e deve permanecer neste nível mais baixo (3%-4%). É um ganho para todos, mas principalmente para os mais pobres. Os juros têm sido reduzidos e continuarão caindo, só é necessário manter as conquistas atuais. Isso foi obtido sob um clima adverso e, recentemente, sem ajuda da política fiscal. Julgar o BC pelo ritmo de queda, de 0,25 p.p. ou de 0,5 p.p., é perder essa perspectiva.

E os gastos públicos. Há espaço para aumentar impostos?

O crescimento dos gastos públicos este ano já estava encomendado, desde as promessas eleitorais do ano passado. Os impostos terão que aumentar para fazer frente a isso. Com isso, retardamos a aceleração do crescimento.

Nunca, em sua história, o Brasil conseguiu cortar gastos. Precisamos 'quebrar' para isto acontecer?

Espero que não. Precisamos da conscientização de que aumentar gastos públicos não traz crescimento, pelo contrário.

O que o senhor achou da decisão do CMN de mudança no cálculo da TR, que resultou no atrelamento do rendimento da poupança a 85% do rendimento do CDI?

Foi compreensível e era esperado. Resolve um problema mais urgente, o da remuneração da poupança se tornar um piso para os juros que os bancos pagam e, por conseqüência, retardando a queda dos juros nas hipotecas e ao consumidor. Mas defendo que temos que repensar a forma de remuneração da poupança, e também no seu direcionamento obrigatório.

Quando o senhor estava no BC, a autoridade monetária, antevendo o futuro, montou um interessante projeto para evitar esta confusão. O que é este projeto e por que ele não andou?

O BC, assim como o CMN, tem sempre a obrigação de pensar em formas de aperfeiçoar os instrumentos financeiros disponíveis à população. E quanto mais se antecipar às necessidades futuras melhor. Foi o caso no passado e, tenho certeza, é hoje.

O que o senhor acha do modelo da poupança?

O direcionamento obrigatório não tem ajudado a resolver o problema imobiliário. Na realidade, pode ser que o tenha retardado. Também acredito que o objetivo original da poupança, de render 6% de juros mais TR, não é compatível com uma economia estabilizada, cujos juros deveriam convergir para valores menores.

A TR ainda é um bom indicador?

Seria bom o Brasil desenvolver um tipo de Libor.

Por mais que o BC intervenha no mercado de câmbio, a cotação do dólar continua caindo. As reservas já ultrapassaram os US$ 100 bilhões. Essa intervenção do BC tem razão de ser?

Tem, razão prudencial, num sentido específico. Há que considerar como excepcional e temporário este período da economia mundial, com crescimento e liquidez (e respectivos fluxos de capital), que levam à apreciação cambial. Se for temporário mesmo, vale a pena suavizar os movimentos para evitar uma reviravolta no futuro.

Tem gente que defende o uso de reservas externas para investimentos em infra-estrutura. O que o senhor acha disto?

Se as reservas forem usadas para aumentar gastos (mesmo os meritórios, como os de infra-estrutura), a dívida pública líquida vai aumentar. Não há saída fácil, há que substituir gastos.

Qual o destino do saldo na balança comercial? O setor produtivo brasileiro tem condições de competir externamente com dólar fraco? Como se adequar?

O saldo tem surpreendido positivamente já faz alguns anos, e parece ser o caso, mais uma vez, este ano. O setor produtivo tem se adaptado não somente ao valor do dólar, mas à sua causa original, que é o crescimento ininterrupto dos gastos públicos. Um controle desses gastos aliviaria o dólar, os juros e a carga tributária, facilitando a vida para o setor privado.

Nos últimos dez dias, instalou-se forte turbulência nos mercados. Há praticamente três anos, o mundo espera uma desaceleração da economia americana. Ela chegou?

O mundo mudou, estamos em outra fase do ciclo econômico americano. Houve uma mudança forte nos preços, queda das bolsas, mas o cenário ainda não está claro. Ainda se tem dúvidas sobre a desaceleração americana, real foco desta nova turbulência. E a China só vai desacelerar se isto acontecer, primeiro, nos EUA.