Título: Crédito incentiva a fusão de empresas no setor aeronáutico
Autor: Komatsu, Alberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2007, Economia, p. B10

Pequenos fabricantes brasileiros de componentes para aviões protagonizam um movimento de fusões e aquisições inédito na história do setor, estimulados por um projeto coordenado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em parceria com a Embraer, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (Aiab), o banco quer promover o adensamento da cadeia produtiva aeronáutica.

Em contrapartida, a linha de financiamento lançada há nove meses pelo banco para compra de jatos da Embraer por empresas aéreas nacionais não teve nenhum desembolso efetivado. A iniciativa de oferta de crédito faz parte dos esforços para estimular a cadeia produtiva aeronáutica. Apenas a Varig formalizou proposta, mas já está revendo seus planos devido aos custos. TAM, BRA e WebJet manifestaram interesse, mas não oficializaram a intenção.

A região próxima a São José dos Campos, no interior paulista, onde estão os principais fornecedores da Embraer, deverá assistir este ano à formação de três aglomerados de pequenas empresas. O Centro para a Competitividade e Inovação do Cone Leste Paulista (Cecompi) está intermediando a fusão desses fabricantes, o que poderá render um investimento de R$ 60 milhões e faturamento conjunto de R$ 100 milhões, em cinco anos, com a geração de 300 novos empregos.

O gerente-executivo do Cecompi, Agliberto Chagas, revela que fundos de capital de risco já manifestaram interesse em investir nos três grupos.

De acordo com ele, a americana Boeing e a européia Airbus também já estão de olho nessa oportunidade de novos negócios com fabricantes brasileiros. Chagas relata que também é uma oportunidade para essas companhias reduzirem sua dependência da Embraer, que ainda responde pela maior parte de seu faturamento.

'Algumas dessas empresas foram fundadas por ex-funcionários da Embraer. Em alguns casos, quase 100% do seu faturamento vêm da empresa' , afirma Chagas. Para ele, a proporção ideal para esses fabricantes seria de 60% da receita gerada por contratos com a Embraer e os 40% restantes provenientes de terceiros.

Apenas companhias estrangeiras têm comprado aeronaves brasileiras, pois usam linhas de financiamento no exterior, em dólares, com custos menores, alegam executivos do setor. O gerente do departamento de transporte e logística do BNDES, Antonio Carlos Tovar, por sua vez, diz que o empréstimo do BNDES, em reais, é competitivo em relação ao dinheiro obtido fora do País.

Segundo ele, a linha do BNDES tem custo que varia de 8,3% a 9,3% ao ano, dependendo da operação. Nesse cálculo estão incluídas a TJLP (6,5% ao ano), mais 1% de spread do banco e a classificação de risco da tomadora do empréstimo que varia de um índice de 0,8% a 1,8% ao ano. Já um arrendamento (leasing) no exterior é corrigido pela Libor mais 1% a 1,5%, o que leva a um custo final de 5% mais a variação cambial, estima Tovar.

'A grande vantagem é que as companhias brasileiras não têm a variação da taxa de câmbio. A TJLP, corrigida a cada três meses, é um indexador menos variável que a Libor, que é mais volátil', afirma Tovar.

O presidente da Varig, Guilherme Laager, afirmou recentemente que a aquisição do empréstimo no BNDES não é mais prioridade para a companhia. Alegou, além dos custos de financiamento, questões como adequação das aeronaves. 'As negociações com a Embraer não estão fora de cogitação. Mas aviões com menor capacidade tendem a ser rentáveis para destinos com menor demanda', disse Laager.

Segundo fontes do setor, outro problema enfrentado pela Embraer é a grande demanda de seus jatos por companhias aéreas estrangeiras, o que faz com que a fabricante brasileira só possa entregar novos aviões pelo menos em 2008. A Embraer foi procurada, mas não se pronunciou até o fechamento desta edição.

O assessor da presidência do BNDES, Sergio Varella, ressalta que o programa do banco para o adensamento da cadeia produtiva aeronáutica está com os trabalhos adiantados e deverá ser concluído ainda este ano.

Segundo ele, ainda não foi definido se será criada uma linha de financiamento específica para os pequenos fabricantes de componentes e soluções para aviões. Diz que esta é uma 'possibilidade'.

Varella, especialista em aviação do BNDES, ressalta o movimento de empresas que já promoveram fusões e estão se movendo para atender tanto a Embraer quanto outras fabricantes estrangeiras, antes mesmo do projeto do BNDES ser concluído.

Em novembro do ano passado, a Graúna Aerospace, fabricante de componentes para aviões, recebeu aporte estimado em R$ 20 milhões pelo mercado do fundo de investimentos brasileiro Stratus. Essa negociação aconteceu após a Graúna ter incorporado duas pequenas empresas que integravam o consórcio HTA, formado por 11 fornecedores da Embraer, incluindo a própria Graúna. O diretor comercial da empresa, Urbano Cícero Fleury de Araújo, diz que o objetivo é não ter mais do que 50% do faturamento atrelado à Embraer.

Atualmente, a fabricante brasileira de jatos responde por até 80% da receita da Graúna, sendo que esse porcentual já chegou a 95%. Araújo, porém, diz que reduzir a dependência não significa que a empresa vai deixar de aumentar o seu faturamento com a própria Embraer, por meio do ganho de tecnologia com contratos com outras fabricantes que poderá ser repassado à fabricante brasileira futuramente.