Título: Feira livre ministerial
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/03/2007, Notas e Informações, p. A3

Marcado e remarcado tantas vezes quantas se poderia esperar se o Brasil fosse uma república bananeira, o parto da montanha da formação do novo Ministério não deve passar desta quinta-feira, asseguram os oráculos do Planalto. O último motivo alegado para a mais demorada definição de uma equipe presidencial que já se viu no Brasil se dissipou domingo com a convenção do PMDB que reelegeu o deputado Michel Temer para o comando do partido, na condição de candidato único, desde que o ex-ministro do Supremo Nelson Jobim deixou a disputa da qual não tinha a mais remota chance de sair vencedor.

O presidente Lula primeiro apoiou, depois descartou Jobim, ao se dar conta de que a sua candidatura não tinha lastro na legenda, não obstante a guinada pró-Temer lhe custar a zanga dos jobinistas Renan Calheiros, presidente do Senado, e do seu antecessor José Sarney. (Este, por sinal, recebeu uma barretada do Planalto, com a escolha da senadora Roseana, sua filha, como líder do governo no Congresso.) Sendo todos os envolvidos dotados de acendrado pragmatismo, o jogo de conveniências vai de vento em popa.

Temer, que apoiou a candidatura presidencial do tucano Geraldo Alckmin, desfila como lulista desde criancinha e foi honrado na convenção com a presença do presidente petista da Câmara, Arlindo Chinaglia, que fez questão de bradar ¿Viva o PMDB¿, em seu discurso. Mas o símbolo acabado do neolulismo é outro peemedebista, o deputado baiano Geddel Vieira Lima, que no governo Fernando Henrique chicoteava o PT sem dó nem piedade e só por milagre não será o novo ministro da Integração Nacional. Mas só um ET ainda teria o direito de se espantar com a politicagem federal.

A tal ponto ela se converteu numa enorme feira livre em que tudo se vende, se compra e se pechincha, que o loteamento do Executivo mobiliza pencas de candidatos polivalentes aos cargos em negociação. Para acomodar ambições pessoais e partidárias, Lula não vê problema algum em ensaiar a nomeação de um aliado, hoje para o Ministério X, amanhã para o Y, depois para o Z, mesmo que as áreas não guardem relação entre si e sem que a afinidade do cogitado com qualquer dessas Pastas tenha alguma importância. Retrucará o presidente que nomeou para a Fazenda um médico que era prefeito e tão bem se saiu que ainda estaria no cargo se não se envolvesse numa baixaria contra um pobre caseiro.

Mas não se divisa nenhum Palocci em potencial nos nomes que circulam pela novela da reforma do Gabinete, enquanto corre solta a ficção de que a maioria deles é tocador de sete instrumentos. Por exemplo, há quem brinque com o nó em que se converteu a eventual nomeação da ex-prefeita Marta Suplicy para um Ministério - qualquer Ministério -, dizendo que, se não quiser magoá-la, Lula deveria criar o Ministério da Marta, onde ela poderia tratar de questões ora urbanas, ora educacionais, ora turísticas¿ De seu lado, o presidente vem lotando um partido-ônibus (o PR, fruto da fusão entre o PL e o Prona) com os adesistas incertos sobre o mais vantajoso porto de abrigo para o seu súbito lulismo.

Menos ostensiva, mas não menos feroz, tem sido a troca de cotoveladas entre o PT e os outros condôminos da administração federal pelo segundo escalão nos Ministérios e cargos de direção nas estatais. O Globo noticiou domingo que a palavra de ordem nesse embate é ¿despetização¿. No primeiro mandato, a partilha não levou em conta o peso específico dos partidos da base, avaliado pelo critério do tamanho das suas bancadas. O PT foi contemplado com a presidência de 9 estatais de grande porte, a começar da Petrobrás e Caixa Econômica Federal. O PMDB levou 4, a exemplo da Eletronorte e da Transpetro.

Nas mensagens dos aliados a Lula, nenhuma palavra sobre programas administrativos e competências técnicas - e muitas palavras sobre a impossibilidade de se votar a favor do governo em questões sensíveis, como foi a derruba da CPI do Apagão Aéreo, e deixar o PT com a parte do leão na máquina federal em Brasília e nos Estados. Nem as aparências se salvam.