Título: Aula para populações tradicionais da Amazônia
Autor: Girardi, Giovana
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2007, Vida&, p. A18

Um convênio entre o Museu Paraense Emílio Goeldi, o Ministério da Ciência e Tecnologia, o Instituto Evandro Chagas e universidades do Pará está levando noções de ciência às populações tradicionais do Estado.

O projeto CentrAlCiência, ou Centro de Recursos em Educação Científica, Tecnológica e Ambiental, coordenado por Waldinete Oliveira da Costa, pesquisadora do Goeldi, tem como meta fazer com que as pessoas mais simples tenham acesso ao conhecimento.

'Só assim elas terão a possibilidade de tomar decisões conscientemente. Isso vale desde o momento em que a pessoa vai comprar um óleo no supermercado e possa ser capaz de identificar as diferenças para a saúde entre um tipo e outro, até a decisão de consumir ou não um produto transgênico, chegando inclusive ao processo de escolha de um candidato na eleição', defende a educadora.

A intenção de Waldinete não é modesta, tampouco pode ser cumprida a curto prazo. Mas ela acredita que na prática todo mundo pode ser alfabetizado cientificamente - mas, para isso, as mais diferentes culturas têm de ser atingidas. 'Queremos ter curso para a dona de casa, para o analfabeto, para a comunidade pesqueira, para os plantadores de açaí, para o agricultor familiar. Do que ele precisa? Aumentar a produção? Então vamos trabalhar nesse sentido, introduzir conhecimentos sobre os rios, sobre o solo.'

Ela defende que o conhecimento seja disseminado de 'forma significativa', mas para isso é preciso prestar atenção nas peculiaridades da região. 'Não vamos falar de uva em locais que não têm a fruta, mas sobre coisas que existem aqui, sobre as propriedades e os nutrientes do cupuaçu, do açaí.'

CURSOS SOB MEDIDA

Para que os cursos correspondam às necessidades e características de cada município, o primeiro procedimento do grupo é fazer um levantamento da demanda local.

Só depois são elaboradas aulas e atividades compatíveis com a vocação daquela sociedade. Cada curso conta com 35 especialistas e tem uma carga de 180 horas. Treze cidades do Pará já foram mapeadas e tiveram as primeiras oficinas iniciadas no ano passado. No final de fevereiro, o perfil de outros 12 municípios começou a ser avaliado. De acordo com Waldinete, nessa avaliação os pesquisadores tentam identificar princípios científicos presentes na identidade cultural daquele sujeito.

'Por exemplo, o caboclo, o índio, eles sabem que para fazer um chá primeiro é preciso ferver a água e só depois colocar as folhas. Não sabem exatamente por que, mas fazem assim. A ciência vem explicar que se a planta esquentar a mais de 100 graus vai perder suas propriedades químicas. Queremos fazer a junção do saber tradicional com o científico', defende. 'Por mais que o adulto seja iletrado, ele não é um analfabeto da vida. Temos de aproveitar esse conhecimento. Isso é o que vai facilitar o aprendizado.'