Título: Justiça cassa 57 deputados no Equador
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2007, Internacional, p. A23

A Justiça eleitoral do Equador abriu uma grave crise de governabilidade no país ao destituir ontem 57 dos 100 membros do Congresso, controlado pela oposição ao presidente esquerdista Rafael Correa. A medida foi uma retaliação do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) a uma manobra política com a qual esses parlamentares pretendiam bloquear a convocação, para 15 de abril, de um plebiscito sobre a instalação de uma Assembléia Constituinte.

No início do dia, os 57 haviam votado a favor de um processo político para cassar quatro dos sete juízes do TSE - que aprovaram recentemente a convocação da consulta popular e são tidos pela oposição como aliados de Correa. Na véspera, 52 desses 57 deputados também haviam apoiado uma tentativa de destituir o presidente do tribunal eleitoral, Jorge Acosta, que se recusou a deixar o cargo alegando que o processo não teria sido legítimo.

Em um comunicado, Correa deu seu apoio à decisão do TSE. ¿O governo nacional fará com que seja cumprida a lei e, portanto, a resolução da Justiça eleitoral¿, assegurou a porta-voz do presidente, Monica Chuji. Até a noite de ontem, não estava claro qual seria o alcance dessas decisões - ou mesmo se os processos de cassação abertos pelo TSE e pelo Congresso teriam legitimidade.

O problema é que a Constituição equatoriana dá margem para ampla interpretação. Pela lei, o Legislativo é responsável pela indicação dos membros do TSE e tem o direito de indiciá-los e até destituí-los se eles cometerem alguma infração constitucional.

É com base nessa regra que o Congresso está tentando derrubar os quatro juízes e votou a cassação de Acosta. Sua justificativa é que o TSE convocou o plebiscito antes de o Congresso ter acesso à proposta redigida pelo Executivo para o estatuto da Assembléia - o que seria ilegal. Por outro lado, a lei também estipula que, quando um processo eleitoral está em curso, o TSE se torna a máxima instância judicial do país, podendo destituir qualquer funcionário público que, no seu entender, esteja dificultando o processo de votação.

Esse foi o argumento usado pelo tribunal eleitoral para anunciar a cassação dos 57 congressistas. ¿Eles ( os deputados de oposição) querem desarticular o TSE e enganar a população do Equador para que ela não possa fazer o referendo¿, disse Acosta.

PROMESSA DE CAMPANHA

A disputa de poder entre o TSE e o Congresso equatoriano vem esquentando nas últimas semanas por causa da aprovação do referendo sobre a Constituinte, uma promessa de campanha com a qual Correa prometeu impulsionar uma revolução socialista no Equador e ¿cortar o poder exercido por grupos hegemônicos no aparato estatal¿.

Embora a convocação da consulta tenha sido aprovada em fevereiro no Congresso - depois de muita negociação e intensa pressão do governo e de seus grupos de apoio -, a oposição acusa o Executivo de não seguir as diretrizes negociadas na ocasião ao redigir a proposta da Assembléia.

O grande medo dos partidos opositores é que a Constituinte ganhe poderes para dissolver o Congresso - proposta que o presidente se disse disposto a incluir em sua lista de atribuições.

Além de Acosta, os outros indiciados pelo Congresso são Elsa Bucaram, René Mougé e Hernán Rivadeneira - todos aliados do presidente, segundo a oposição. No Congresso, o governo de Correa não tem nenhum representante porque seu partido boicotou as eleições legislativas de outubro do ano passado.