Título: Desarticulação faz Brasil perder na OMC
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/03/2007, Vida&, p. A17

O Brasil perdeu para si mesmo no tribunal da Organização Mundial do Comércio (OMC), que anteontem decretou que o governo precisará modificar sua lei de importação de pneus recauchutados. A disputa foi aberta pela Europa, que ontem criticou duramente o comportamento do Itamaraty de tentar dar uma dimensão ambiental ao caso. O Estado teve acesso a partes do documento dos árbitros, ainda confidencial. Ele deixa claro que o problema no País não é a existência de medidas ambientais, mas a 'falta de consistência' em sua aplicação por parte do governo.

Para especialistas que também tiveram acesso ao relatório, a derrota do País foi resultado da desarticulação entre os ministérios nos temas comerciais e ambientais. A briga começou em 2005 quando Bruxelas alegou que a lei brasileira era discriminatória. Ela estabelecia a proibição da importação de pneus recauchutados. No processo, o Brasil insistiu que a norma existia por motivos ambientais. Acontece que os produtos de alguns países continuam entrando no Brasil. Países do Mercosul, por uma decisão do tribunal do bloco, conseguiram ter acesso ao mercado. Além disso, por meio de ações judiciais, importadores conseguem derrubar barreiras e entrar com os pneus no Brasil.

A OMC, em sua argumentação, deu razão ao fato de que um país pode aplicar leis ambientais como forma de barrar a entrada de um produto. Mas, caso tenha a lei, precisaria aplicar a todos os países. Além disso, não poderia permitir que liminares autorizem a importação.

Para advogados, o Brasil teria duas opções a partir de agora. A primeira seria bloquear todos os pneus recauchutados de todos os países. Para isso, precisaria impedir importação do Uruguai. E teria de acabar com as liminares, o que envolveria coordenação entre Justiça e Ministério do Meio Ambiente. A segunda opção seria abrir o mercado, como querem os europeus, e criar um sistema para lidar com o produto.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, questionou o enfoque dado pela imprensa à decisão. 'É uma interpretação da União Européia que os jornalistas brasileiros 'compram' imediatamente.' Segundo ele, o relatório é 'muito favorável' à tese brasileira. 'Nos protege e acata a nossa argumentação de que razões de meio ambiente podem ser invocadas', afirmou.

Em Genebra, a disputa está sendo tratada com cautela pelo impacto que pode ter, principalmente entre ambientalistas. A UE, porém, atacou o Brasil, acusando o governo de estar tentando desviar a atenção da disputa e usando argumentos 'equivocados' para legitimar suas medidas. 'Nossa disputa é industrial, não ambiental', disse um porta-voz da Europa. Bruxelas classificou de 'lamentável' o comportamento do governo de 'usar motivos ambientais' para justificar seus argumentos.

Para explicar o caso, o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) convidará o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, ministro Roberto Azevedo, a comparecer à Comissão de Meio Ambiente da Câmara.