Título: Governo argentino quer retratação formal de Gabrielli
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/03/2007, Economia, p. B8

O governo argentino ainda espera uma explicação formal do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, sobre as declarações feitas na terça-feira no Rio de Janeiro sobre o sistema de preços imposto pelo presidente Néstor Kirchner na área energética. A informação partiu de fontes citadas pelas agências de notícias que acompanham a visita do ministro do Planejamento da Argentina, Julio De Vido, a Quito, no Equador.

O governo Kirchner não teria ficado satisfeito com as explicações do presidente da Petrobrás em um comunicado à imprensa emitido na quarta-feira à noite em Buenos Aires, no qual Gabrielli indicava que suas declarações publicadas pela mídia haviam sido 'interpretadas de forma errada'.

Apesar das declarações no comunicado, no qual a Petrobrás 'reafirma publicamente sua disposição de manter uma forte presença na Argentina' e destaca os significativos investimentos que planeja no país nos próximos anos, o governo argentino estaria esperando uma declaração formal (não por meio da imprensa) de Gabrielli.

As versões da imprensa sustentavam que Gabrielli, na terça-feira, havia criticado o sistema de preços de Kirchner e alertado sobre a falta de estímulos a investimentos que ele provocava. Na quarta-feira, o ministro De Vido reagiu dizendo que não permitiria que uma empresa 'estrangeira' e 'estatal' se 'intrometesse' na política interna argentina e 'condicionasse investimentos'.

De Vido ameaçou até suspender as concessões petrolíferas da Petrobrás no país. Na ocasião, o governo Kirchner também comunicou à Embaixada do Brasil seu mal-estar. De Vido - normalmente de poucas palavras - também declarou que 'nenhuma empresa está obrigada a ficar na Argentina'.

O ministro, em um ato falho, tentou explicar que a política de preços era o fruto do consenso entre o governo e os empresários. Mas pronunciou uma frase que mostra que Kirchner, na realidade, impõe sua vontade: 'A política de combustíveis é produto de consensos, e é determinada pelo governo'.

As declarações de Gabrielli foram respaldadas pelo establishment argentino, que também costuma criticar o sistema de preços imposto por Kirchner. Na área energética, o presidente pressiona as empresas de combustíveis para não elevarem seus preços. As empresas de energia vivem sob congelamento de tarifas para os consumidores residenciais desde Eduardo Duhalde (2002/2003), antecessor de Kirchner. Além deles, donos de supermercados, pecuaristas, e dezenas de setores da economia argentina são forçados a obedecer ao polêmico congelamento de preços aplicado pelo governo.

Os analistas econômicos ressaltaram que a Petrobrás foi vítima da costumeira reação do governo Kirchner aos empresários que ousam enfrentá-lo. No âmbito político, a expectativa é que a Petrobrás poderia ser alvo de inspeções nos próximos dias, como retaliação pela suposta insolência de Gabrielli. Há dois anos, Kirchner convocou a população a boicotar os combustíveis da Shell por causa do aumento de preço.