Título: As más notícias do BNDES
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Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2007, Notas e Informações, p. A3

Nem tudo é boa notícia no relatório recém-divulgado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), apesar do aumento de 22% nos desembolsos e de 46% nas consultas nos 12 meses terminados em fevereiro. Nesse período, o BNDES desembolsou R$ 55,03 bilhões, na maior parte para a indústria, e aprovou consultas no valor de R$ 79,90 bilhões. O valor desembolsado no primeiro bimestre, R$ 7,02 bilhões, foi 64% maior que o de um ano antes, enquanto o valor aprovado, R$ 9,94 bilhões, foi 128% superior ao de janeiro e fevereiro de 2006. Esses dados permitem algum otimismo, pois indicam tanto a expansão dos investimentos quanto a disposição dos empresários de aumentar os gastos de capital em várias atividades. Mas também há áreas de sombra no cenário composto pelas cifras e porcentagens.

Em 12 meses, os desembolsos para a agropecuária foram 12% menores que os do período anterior. Esse resultado é facilmente explicável. Nos últimos três anos, muitos produtores perderam dinheiro, outros mal conseguiram cobrir os custos e milhares tiveram dificuldades para pagar as dívidas.

O governo voltou a refinanciar os débitos no ano passado e agora conclui mais um esquema de renegociação. Com isso a agropecuária deve ganhar novo fôlego. Mais importante que isso, as perspectivas para a safra 2006-2007 são muito boas, até agora, tanto pelo volume previsto de produção quanto pela rentabilidade esperada. Mas a melhora das condições ainda não se reflete plenamente nos grandes números do BNDES.

O valor dos financiamentos aprovados para a área rural nos 12 meses terminados em fevereiro é apenas 7% maior que o do período anterior, totalizando R$ 4,2 bilhões. Depois de anos de retração, a reação ainda parece lenta. Mas há razões, pelo menos, para se apostar em recuperação do investimento depois da comercialização dos produtos colhidos neste ano. O resultado se verá, provavelmente, nas vendas de máquinas e equipamentos.

Menos animador é o quadro do investimento na infra-estrutura, embora o valor desembolsado entre março de 2006 e fevereiro deste ano não tenha diminuído, mas igualado o dos 12 meses anteriores.

Esse valor foi distribuído muito desigualmente entre os vários subsetores. Houve aumento nos valores desembolsados para transportes e telecomunicações, mas o total destinado à construção diminuiu 10%, enquanto o montante entregue para energia elétrica encolheu 21%.

Os dados sobre os investimentos em eletricidade são particularmente preocupantes, porque não foram só os desembolsos que diminuíram. O valor das aprovações para novos projetos, R$ 4,11 bilhões, foi 28% menor que o dos 12 meses terminados em fevereiro do ano passado. No bimestre, os desembolsos, modestos R$ 77,3 milhões, foram 13,8% maiores que os de um ano antes, mas o valor das aprovações, R$ 524,9 milhões, diminuiu 11,38%. Esses números parecem justificar as mais graves preocupações motivadas pelas projeções da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Em seu estudo mais recente, a agência apresentou dois cenários. No mais otimista, a oferta de eletricidade crescerá apenas 12% até 2010. No mais sombrio, a expansão não deverá ultrapassar a modestíssima taxa de 5,6%. Funcionários do governo têm negado o risco de novo apagão no final desta década, mas é cada vez mais difícil afastar o temor. Os novos números do BNDES, especialmente os valores aprovados para novos projetos até fevereiro, reforçam, em vez de atenuar, os motivos de preocupação.

Segundo o presidente do banco, Demian Fiocca, os projetos de infra-estrutura incluídos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já se refletem no aumento das aprovações, mas a boa notícia, nesse caso, não vale para o setor de energia elétrica.

Além disso, a expansão dos financiamentos aprovados para o transporte terrestre (21%) não é tão tranqüilizadora, quando se sabe do atraso de importantes licitações para investimentos em rodovias.

Gargalos de infra-estrutura já são uma realidade e seus efeitos só não são mais sensíveis porque a economia tem crescido pouco. Nenhum dado novo, até agora, permite contemplar o futuro com mais otimismo.