Título: Investindo, apesar de tudo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2007, Notas e Informações, p. A3
Desde o início desta década, quando as privatizações nos setores de telefonia, energia elétrica e bancos estaduais ainda atraíam grandes volumes de capitais externos, o ingresso bruto de investimentos diretos estrangeiros não atingia o volume registrado nos últimos meses. Os dados do Banco Central mostram que, no período de 12 meses encerrado em janeiro (são os números mais recentes), o fluxo bruto de investimentos estrangeiros alcançou US$ 33,4 bilhões, valor muito próximo do recorde histórico de US$ 34,6 bilhões registrado em 1999 e 2001.
O Brasil não é mais, como foi durante parte da década passada, o destino preferencial dos investimentos externos aplicados nas economias emergentes. A China tornou-se o principal pólo de atração de investimentos externos e, só no ano passado, absorveu um fluxo líquido (isto é, já deduzidas as remessas feitas pelas empresas estrangeiras para suas matrizes) de US$ 70 bilhões, mais do triplo do ingresso líquido de investimentos no Brasil em 2006 (de US$ 18,8 bilhões).
Apesar da vantagem disparada da China, o Brasil não foi ignorado pelos investidores. Por três meses seguidos, o ingresso líquido de investimento direto estrangeiro foi superior a US$ 2 bilhões (US$ 2,7 bilhões em novembro, US$ 2,5 bilhões em dezembro e US$ 2,4 bilhões em janeiro), o que sugere que o País deve superar em 2007 a média de US$ 15 bilhões a US$ 18 bilhões mantida nos últimos três anos. Mesmo com o fraco desempenho da economia, o Brasil pode absorver anualmente US$ 25 bilhões em investimentos diretos estrangeiros líquidos. ¿Os números mostram que o Brasil continua no páreo¿, observou o diretor de pesquisa macroeconômica do Bradesco, Octavio de Barros, ao jornal Valor, que publicou reportagem sobre o assunto.
Até há seis ou sete anos, boa parte dos investimentos estrangeiros destinou-se à aquisição de empresas privatizadas pelo governo federal e por alguns governos estaduais. Para muitos grupos privados que ainda não atuavam no País, aquela era a oportunidade para rapidamente ocupar amplos espaços na economia brasileira; no caso dos que aqui já atuavam, era a possibilidade de, também rapidamente, ampliar sua fatia no mercado nacional.
Como não há empresas sendo privatizadas nem o Brasil dispõe de áreas praticamente inexploradas como as que ainda podem ser encontradas na China, o fluxo atual de investimentos externos é canalizado para setores e atividades existentes. É uma indicação muito forte de que, apesar das muitas dificuldades ainda existentes no País para a realização de negócios, os grupos estrangeiros querem atuar aqui. O Brasil, lembram os economistas que estudam o fluxo de capitais externos, dispõe de um mercado interno amplo, sua estrutura produtiva é diversificada, há disponibilidade de mão-de-obra com razoável grau de treinamento, entre outros atrativos.
No ano passado, os setores que mais receberam investimentos estrangeiros foram os de intermediação financeira, energia, metalurgia básica e celulose e papel. Dois segmentos que receberam volume elevado de recursos no ano passado foram os de comércio e de imóveis, que podem receber ainda mais investimentos em 2007.
Há, ainda, campos que oferecem novas oportunidades, como o da produção do etanol e outros biocombustíveis, e até mesmo o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado pelo presidente Lula, que, se funcionar como anuncia o governo, demandará grande volume de investimentos em infra-estrutura.
Da mesma forma que, pelos dados do Banco Central, se detecta o aumento do interesse de grupos estrangeiros em investir na economia brasileira, também no setor privado nacional há indicações de que os investimentos estão em alta. A produção de máquinas e equipamentos utilizados na produção de outros bens cresce bem mais depressa do que a produção industrial total.
Se o ambiente fosse mais favorável - com um sistema tributário mais racional e menos oneroso, regras claras e um governo que estimulasse mais, e inibisse menos, a atividade empresarial -, sem dúvida a disposição do empresariado para investir seria muito mais nítida. Mesmo assim, ele mostra que, apesar de tudo, está em busca do crescimento.