Título: Alckmin retorna em maio de olho em 2008
Autor: Marchi, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2007, Nacional, p. A5

Cinco meses depois de derrotado no segundo turno, o ex-governador Geraldo Alckmin decidiu sua vida: volta ao Brasil em maio e imediatamente começa a viajar pelo País para agradecer os votos que recebeu, ajudar o PSDB a se organizar para as eleições municipais de 2008 e retomar a carreira política. Ele não afirma se concorrerá em 2008, mas deixa pistas muito claras de que é candidatíssimo à Prefeitura de São Paulo. Alckmin reconheceu erros estratégicos que cometeu nas eleições, mas justificou que enfrentou a máquina do governo e do PT.

Em entrevista ao Estado, durante rápida passagem pelo Brasil, aprofundou críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Gaba-se de ter inserido na agenda brasileira os temas do crescimento e do emprego. Assinala que, de fora, ficou mais aguda a sua percepção de que o governo Lula não tem um projeto de Brasil e de que o País está perdendo oportunidades de crescer em níveis semelhantes aos que crescem seus competidores.

Ele rechaça a idéia de uma trégua a Lula: ¿A oposição é necessária no regime democrático¿. Não reclama das traições que teria sofrido de aliados na campanha: ¿Não vou ficar choramingando, bola para a frente¿, simplificou. Até maio ele ficará na Harvard University, em Boston, freqüentando um ciclo de estudos aconselhado pelo seu sucessor, o governador José Serra. Lá, sem carro, mora num apartamento de um quarto, no qual divide tarefas com a mulher, Lu: ele limpa a casa, passa roupa e tira o lixo; ela cozinha, lava os pratos e a roupa. Pela primeira vez longe do poder em 12 anos, diz que não sofre por isso e está aprendendo a manejar melhor o computador. Eis a entrevista:

Como o sr. está se sentindo longe do poder, depois de 12 anos no Palácio dos Bandeirantes? As pessoas ainda ligam?

Você tem de reaprender algumas coisas. Quando você sai do poder, tem de fazer um curso para aprender a se virar sozinho. Lá, eu e a Lu estamos aprendendo computador, internet, falar inglês. Mas eu já estou acostumado com essa coisa de entrar para o poder e sair dele. É importante, do ponto de vista pessoal, estar mais perto das ruas. Quando voltar de Harvard, vou percorrer o País todo para agradecer os votos que recebi. Afinal de contas, tive 40% dos votos do País, venci as eleições em todo o Sul, boa parte do Sudeste e do Centro-Oeste. Vou dar aulas em duas faculdades e me dedicar a organizar o PSDB.

De cabeça fria, como o sr. analisa que tivesse 40 milhões de votos no 1º turno e perdesse mais de 2 milhões de votos no 2º?

No segundo turno, funcionou para valer a máquina do governo e do PT, as pesquisas eleitorais induziram o eleitorado. Lula gastou, durante a campanha, 1% do PIB em gastos correntes, R$ 20 bilhões. É claro que isso provoca um desnível.

O intervalo de duas semanas do 1º para o 2º turno não esfriou o ânimo do eleitorado com um candidato que vinha em ascensão?

Foi um erro e um erro grave. A nossa lógica foi que, quando veio o 2º turno, a campanha deveria ser mais curta para não dar ao adversário espaço para usar a máquina do governo. Cometemos um erro porque deu uma esfriada na eleição.

Por que o sr. não defendeu as privatizações do governo Fernando Henrique durante a campanha?

Há um equívoco. Meu adversário criou uma verdadeira mentirobrás, dizendo que eu iria privatizar o Banco do Brasil, a Caixa Econômica, a Petrobrás. Eu reagi às mentiras. Procurei dizer que hoje o debate não é sobre privatização, mas sobre concessões e Parceria Público-Privada. A grande prioridade é trazer o setor privado para participar de investimentos.

Durante a campanha o sr. não encontrou um antídoto eficaz contra o Bolsa-Família. O que o sr. acha hoje do programa?

Sou favorável aos programas de complementação de renda. Mas eles não podem virar moeda de troca com o voto. Eu disse na campanha que o Bolsa-Família é transitório e que precisamos gerar empregos. Tanto bati na tecla certa que ficou na agenda nacional. Ficou tão forte que Lula tentou dar uma resposta, lançando o PAC, que, aliás, passa a léguas de distância das reformas, cuja falta inibe o crescimento. O mundo cresce 5%, os emergentes crescem 7%, os asiáticos crescem 10% e o Brasil cresce 2% ou 3%. Alguma coisa está errada. Os verdadeiros entraves do crescimento não estão sendo colocados.

Houve traições em seu arco de alianças?

O nível de solidariedade na política é baixo. Mas tive boas surpresas, muita gente suou muito a camisa. Quero agradecer publicamente a Tasso Jereissati, presidente do PSDB, que mergulhou na campanha; Jorge Bornhausen, presidente do PFL, muito firme; e Roberto Freire, presidente do PPS.

O sr. não deveria ter começado essa lista de agradecimentos com José Serra e Aécio Neves?

Eles ajudaram. Mas é natural que quem é candidato dê prioridade a sua campanha. Eu não vou ficar choramingando, bola para a frente.

O que o sr. acha de uma trégua que Lula pedirá ao PSDB?

Li outro dia no Estado que Lula vai propor uma trégua ao PSDB. Ele não entende a lógica democrática. A oposição é necessária no regime democrático. Se ele quer dois anos sem oposição, vira um regime de partido único. Que oposição é essa? É tão patriótico ser governo quanto ser oposição. O que a oposição tem de fazer é criticar, fiscalizar, cobrar.

O que o sr. achou do novo ministério de Lula?

Como é que pode, seis meses depois da eleição, não ter nem ministério para governar. E ter uma maioria que é uma colcha de retalhos, sem nenhum projeto, só para prorrogar a CPMF. Se esperar mais um pouco, acaba o primeiro ano, que é fundamental.

O sr. é candidato à presidência do PSDB em novembro?

Não. Não preciso ser presidente do PSDB para trabalhar pelo partido.

Mas é candidato à Prefeitura de São Paulo ano que vem, não?

Definido é que trabalharei pelo PSDB nas eleições municipais. Partido político precisa ter base municipal. A eleição da capital é importante, mas não é hora de discuti-la.

Afinal, qual a estratégia do PSDB na oposição?

O PSDB precisa voltar a seu manifesto, a amassar barro, estar perto dos movimentos populares. O governo age cooptando os que pode cooptar; os que não pode, desidrata, enfraquece. É o caso do PSDB, do PFL e do PPS. Nós já perdemos sete deputados. Aliás, nem perdemos, porque a saída dessas pessoas não foi perda.

O Brasil aprendeu a combater a criminalidade?

Não se pode combater a criminalidade no Brasil sem a liderança do governo federal. Crime organizado é federal. E a omissão do governo federal é inaceitável. Foi assim no primeiro mandato e sinto, no segundo, uma ausência total. Precisamos reformar os códigos penal e de processo penal. Como está, a lei é muito dura com o pequeno, mas muito fraca com o crime organizado.

Quem é: Geraldo Alckmin

É ex-governador de São Paulo e candidato derrotado à Presidência em 2006.

Formou-se em medicina na Universidade de Taubaté e especializou-se em anestesiologia no Hospital do Servidor Público de São Paulo.

Nasceu em Pindamonhangaba, em 7 de novembro de 1952. É casado com Maria Lúcia Alckmin. Tem três filhos.