Título: Neogovernistas inflam segundo mandato de Lula
Autor: Lopes, Eugênia
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2007, Nacional, p. A7

Alguns deles são chamados de neogovernistas, mas na verdade o que eles são mesmo é sempre governistas. Em seu segundo mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acabou se rendendo às facilidades e ampliou a fatia do governo formada por políticos que no passado enfrentaram o PT e estiveram ao lado de Fernando Henrique Cardoso - e até de outros presidentes, como é o caso do novo ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes (PMDB-PR).

Recebido na semana passada no Palácio do Planalto por Lula, o senador Fernando Collor (PTB-AL) é um bom exemplo de como a política dá voltas. Adversário implacável do petista nas eleições presidenciais de 1989, Collor deixou de lado as críticas e é um dos mais novos aliados do presidente.

Collor não é exceção. Ele faz parte de um grupo bem eclético que vai desde o presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), passa pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), e chega aos líderes do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), e no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). O segundo vice-presidente da Câmara, Inocêncio Oliveira (PR-PE), já foi fiel aliado de FHC, mas hoje é ¿lulista até morrer¿.

Caminho semelhante ao de Collor foi trilhado por Geddel. Apontado no Congresso, junto com Temer, como uma das ¿viúvas de Fernando Henrique¿, o político baiano chegou à Esplanada na condição de um dos principais articuladores da ala do PMDB que aderiu ao Planalto. No primeiro mandato de Lula, foi adversário ferrenho da adesão peemedebista ao Planalto. Chegou a chamar de fisiológica a negociação comandada pelos senadores do PMDB José Sarney (AP) e Renan Calheiros (AL) para apoiar o governo.

O pragmatismo levou Geddel a trocar a oposição pela base. A aproximação ocorreu nas eleições do ano passado, quando, em nome da política baiana, ele apoiou Jaques Wagner (PT), que se elegeu governador do Estado. Foi com o aval do petista que Geddel chegou ao Ministério da Integração Nacional como símbolo da coalizão do governo, segundo palavras do próprio presidente Lula.

FACILIDADES

Líder do PFL nos oito anos da gestão FHC, Inocêncio não esconde os motivos que o levaram a trocar de lado: quem é governo tem mais facilidade de receber benesses e ver pleitos atendidos. Na lista de reivindicações atendidas, ele destaca a criação de campus avançado da Universidade Federal de Pernambuco em Serra Talhada, seu reduto eleitoral, e a instalação de uma usina de biodiesel no município. ¿Tenho mais prestígio hoje em Serra Talhada do que quando era líder do Fernando Henrique. Por isso, sou lulista hoje até a medula e voto nele em qualquer partido que ele esteja.¿

Outro líder da era FHC que foi cooptado por Lula é Romero Jucá. Ele garante, no entanto, que não mudou. ¿São governos diferentes, mas voltados na mesma direção. Não sou adesista. Não mudei um milímetro a minha postura¿, diz o líder do governo no Senado, que no primeiro mandato petista foi ministro da Previdência. ¿Nunca tive de me violentar. Fui conquistado pelo presidente Lula. Não foi em troca de nada.¿

Recém-nomeado líder do governo na Câmara, o ex-pefelista e ex-tucano José Múcio foi para o PTB por questões da política pernambucana. Por oito anos, foi aliado de FHC. No início da gestão Lula, trocou de lado e entrou para a tropa de choque do presidente. Em seu sexto mandato na Câmara, Stephanes é prodígio de sobrevivência política. Ex-PFL, já esteve na Previdência de Collor e FHC.

Segundo o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), professor de História do Brasil, o adesismo é tradição na política brasileira desde o Império. ¿De 1946 para cá, com exceção da época da ditadura, começou-se a construir mecanismos mais sutis de sedução governista com a troca de favores¿, observa.

¿Fernando Henrique e Lula são figuras políticas que sempre questionaram essa cooptação atrasada. Eles poderiam ter sido portadores de uma nova realidade. Mas preferiram sair da história para cair na vida.¿