Título: Famílias continuam sem resposta após 6 meses da queda do vôo 1907
Autor: Tavares, Bruno e Rigi, Camilla
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/03/2007, Metrópole, p. C3

Poucos foram os avanços passados seis meses do maior acidente aéreo do Brasil. Desde que o Boeing 737-800 da Gol colidiu com o jato Legacy, em 29 de setembro de 2006, matando 154 pessoas, o Ministério Público Federal (MPF) de Mato Grosso aguarda o inquérito da Polícia Federal e o delegado Renato Sayão, que preside inquérito, pode pedir novo prazo para concluir as investigações. Enquanto isso, apenas duas das famílias das 154 vítimas conseguiram na Justiça o direito a uma pensão alimentícia. A boa notícia é que o número de controladores de vôos aumentou, segundo fontes da Aeronáutica.

Mas, para especialistas, isso não é o bastante. Desde a colisão, controladores aumentaram, por si só, o rigor com alguns procedimentos. Se recusam, por exemplo, a monitorar mais do que 14 aeronaves ao mesmo tempo. A categoria argumenta que esse é o limite de segurança. Entretanto, o parâmetro não consta de nenhuma norma internacional. ¿Há alguns anos, o sistema de controle de vôo não tem a agilidade necessária para atender à demanda. O acidente só deu visibilidade ao problema¿, avalia o engenheiro de uma empresa que presta serviços à Aeronáutica.

Na opinião dele, desde a colisão entre o Boeing e o Legacy, a Força Aérea passou a publicar normas como se estivesse ¿editando medida provisória¿. ¿O comando deixou de ouvir todas as partes envolvidas no setor e isso é muito ruim.¿ O melhor exemplo disso, segundo o engenheiro, é a proibição de mudanças no nível de vôo minutos antes da decolagem. Como os planos de vôo são emitidos com até duas semanas antecedência, diz ele, os pilotos não têm condições de saber com exatidão o peso de decolagem. ¿Antigamente, era muito comum o comandante pedir para voar numa altitude diferente da original para economizar combustível. Sem essa possibilidade, você engessa a operação. Para piorar, não há qualquer reflexo na segurança de vôo¿, diz o engenheiro.

Oficiais da FAB ouvidos pelo Estado discordam dessa tese. Para eles, a principal reivindicação dos controladores - o respeito à jornada de trabalho - foi atendida. ¿Uma nova turma de profissionais militares começará a trabalhar em breve e os civis estão sendo treinados. A questão de procedimentos, menos urgente, ainda está sendo revista. Se houver alguma recomendação, ela será feita no relatório final do acidente.¿

O inquérito sobre o acidente depende hoje de laudos do Instituto Nacional de Criminalística (INC) sobre falha ou mal uso dos equipamentos do Legacy, como o transponder, para ser concluído. A solicitação inclui até a análise dos peritos no manual do avião, para que ele fique compreensível ao delegado responsável e ao procurador da República designado ao caso, Thiago Lemos de Andrade.

O delegado já tomou vários depoimentos e pretende confrontá-los com os laudos para fazer os indiciamentos.

Para as famílias, houve algumas conquistas e decepções. ¿Seis meses depois e é como se fosse um dia depois do acidente¿, desabafou a controladora financeira, Angelita Rosicler de Marchi, viúva do executivo Plínio Luiz Siqueira Júnior. Para o presidente da Associação de Familiares e Amigos das Vítimas, Jorge Cavalcante, não há dinheiro que pague a dor que tiveram, mas ele admite que algumas famílias precisam de acordos rápidos para sobreviver.

A Gol não informou quantos acordos já foram firmados. A empresa foi condenada a pagar pensão para duas famílias. Os valores são R$ 10 mil e R$ 3.500.

Amanhã, as famílias devem se reunir em Brasília, Rio de Janeiro e Porto Alegre para homenagear as vítimas em uma missa. Os locais e horários ainda serão definidos.