Título: Quissamã multiplica obras e dinheiro sobra
Autor: Gobetti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2007, Nacional, p. A6

Com mais da metade de seu orçamento garantida pelas receitas do petróleo, Quissamã, cidade de pouco mais de 16 mil habitantes no norte fluminense, conta, segundo a prefeitura, com 100% de esgoto tratado, todas as crianças de 7 a 14 anos na escola e um hospital com 60 leitos, além de 10 postos de saúde e um centro de especialidades médicas.

Fechou o exercício de 2005 com receitas de R$ 122.520.720,83 e despesas de R$ 118.280.328,84, de acordo com o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e situação financeira tranqüila. Tudo resultado de royalties e participações especiais cujo valor, a partir de 1999, ¿explodiu¿ na região, garantindo em 2006 mais de R$ 85 milhões extras para a cidade, que pôde investir e manter as contas em dia.

¿Dinheiro não sobra não¿, contesta o prefeito, Armando Carneiro (PSC). ¿A região é a mais pobre do Estado, de lavoura canavieira, com um desnível social fortíssimo. Tínhamos uma dívida social que tinha de ser resgatada.¿

Um dos pontos em que o município, criado em 1989, investiu o dinheiro do petróleo foi precisamente o saneamento: a prefeitura fez uma rede coletora de 45 quilômetros, com elevatórias e a Estação de Tratamento de Piteiras, que não precisará ser ampliada por 15 anos, já que pode atender a 30 mil pessoas. Também o Hospital Municipal Mariana Maria de Jesus não precisará ser ampliado por anos, já que, informou Carneiro, pode suprir uma cidade de até 50 mil habitantes. A prefeitura mantém um programa de saúde da família, tem 100% de crianças de 0 a 5 anos vacinadas, dá suplementação alimentar às de baixo peso, distribui preservativos masculinos e femininos.

A rede escolar municipal subiu de 9 para 17 escolas (12 com ensino infantil e 3 com creches), atendendo a 4 mil alunos, todos com direito a transporte, material didático, uniforme e merenda dados pelo município. Quatro das escolas têm cursos de informática, com banda larga gratuita. O município paga ainda bolsas de estudo integrais a cerca de 1.300 pessoas, para ensino médio, superior e pós-graduação, incluindo transporte para municípios vizinhos, quando necessário.

¿Quando me formei, era uma das três únicas pessoas da cidade com curso superior¿, recorda o prefeito.¿Sem os royalties, não daria para fazer tudo isso. Realmente, é uma situação privilegiada.¿ Agora, explica Carneiro, a prioridade é a economia. ¿Precisamos nos livrar da dependência dos royalties.¿ Para isso, a prefeitura criou uma zona especial de negócios numa área de 240 mil metros quadrados. Já estão instalados no local uma metalúrgica, um laticínio e uma fábrica de açúcar.

O município pretende ainda aproveitar a vocação canavieira para atrair investimentos na produção de etanol. Mas há dificuldades: a última usina de cana da cidade foi fechada em 2002 e a população local já não quer trabalhar nas duras colheitas. ¿O pessoal de Quissamã, com mais estudo, não quer mais cortar cana, é preciso importar trabalhadores até da Bahia¿, relata o prefeito.

Na prefeitura, são cerca de 1.700 funcionários, consumindo cerca de R$ 3 milhões por mês, com salário médio de R$ 1,1 mil. A Câmara Municipal gasta cerca de R$ 300 mil mensais.

Carneiro acompanha com interesse as discussões sobre as mudanças nos royalties no Congresso, mas acha ¿complicado¿ mexer nas leis. Ele lembra que as cidades da região norte fluminense receberam impactos por causa da descoberta do petróleo, na Bacia de Campos, que atraiu muita gente em busca de emprego. ¿Em Macaé, não há dinheiro que chegue. Há o bônus e há o ônus¿, diz. Ele admite, contudo, mudanças na legislação dos royalties que obriguem as administrações a focar o dinheiro, pela ordem, em educação, saúde e desenvolvimento econômico. ¿O petróleo vai acabar¿, ressalta.