Título: Campos fica bilionária, mas não presta contas
Autor: Gobetti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2007, Nacional, p. A6

O município campeão no recebimento de royalties no País, Campos dos Goytacazes (RJ), com R$ 847 milhões em 2006, há cinco anos não presta contas à Secretaria do Tesouro Nacional de acordo com o que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal. O orçamento da cidade pulou de R$ 80 milhões em 1997 para R$ 1,2 bilhão em 2006, mas ninguém sabe exatamente como o dinheiro foi gasto.

Governada por Alexandre Mocaiber (PDT), a cidade mais rica do litoral norte fluminense não divulga nem mesmo os dados mais elementares de execução orçamentária pelo site oficial da prefeitura. Na última quarta-feira, o prefeito anunciava que prestaria contas à população, mas a página do município na internet revelava, no link ¿Contas Públicas¿, que não havia nenhuma informação cadastrada.

A controladora-geral do município, Marcilene Nunes, diz que a atual administração não recebeu nenhum dado relativo ao período 2001-2004, quando a cidade foi governada por Arnaldo Vianna (PDT), mas promete regularizar a situação nos próximos 15 dias.

A Lei Fiscal prevê que os municípios devem apresentar ao Tesouro relatórios, bimestrais e anuais, mostrando onde e como estão gastando os recursos públicos. No caso de Campos, a última vez que algum tipo de dado foi informado ao Tesouro foi em 2000. Por causa dessa irregularidade, a prefeitura fica inabilitada para assinar convênios com o governo federal.

Mocaiber, que assumiu provisoriamente em 2005 e definitivamente em março de 2006, após um segundo processo eleitoral (a eleição de 2004 foi anulada, por causa de abusos de poder econômico), garante ter preparado corretamente os relatórios de sua gestão. ¿Se alguém da época passada não mandou os dados, não sei¿, afirma ele, que era aliado de Vianna.

O prefeito anterior, que é deputado federal, teve suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas e só conseguiu tomar posse graças a uma liminar judicial. O Estado tentou ouvi-lo durante toda a semana, mas ele não respondeu à reportagem. A assessora e mulher do parlamentar, Ilsan Vianna, apenas disse que a administração do marido prestou informações ao TCE.

A atual controladora-geral de Campos revelou que o município nem sequer tinha cadastro na Caixa Econômica Federal para enviar ao Tesouro os dados exigidos pela Lei Fiscal. Ela afirma que conseguiu preparar os relatórios relativos a 2005 e 2006, mas não pode enviá-los porque não tinha as informações relativas a 2001, 2002, 2003 e 2004. Foi montada uma força-tarefa de funcionários para pesquisar em 36 órgãos da administração direta e indireta os dados dos quatro anos da gestão anterior.

¿Esse atraso é um problema, que fez todas as nossas contas serem reprovadas pelo TCE¿, diz Marcilene. ¿Fez nosso município ficar inadimplente. Não pudemos nos habilitar a receber verbas de saúde, educação, promoção social.¿

TRANSPARÊNCIA

A falta de transparência nas contas públicas de Campos fica mais grave quando se verifica a explosão do orçamento local. As receitas do município, turbinadas pelos royalties do petróleo, cresceram 1.400% em 10 anos. As receitas próprias, segundo informações extra-oficiais, não cobrem sequer a folha de pagamento da prefeitura. Por isso, é possível que a prefeitura esteja usando o dinheiro dos royalties para pagar salários, o que é proibido por lei.

¿Tem muita despesas de pessoal que está sendo mascarada com a terceirização e a contratação de pessoas jurídicas¿, afirma o engenheiro Roberto Moraes, do Observatório Socioeconômico do Norte Fluminense. ¿Nenhum lugar do Brasil teve tamanho crescimento de receita em tão pouco tempo.¿ Segundo ele, os investimentos em meio ambiente (finalidade principal dos royalties) ¿não têm passado de 0,5% do orçamento nos últimos anos¿.

A prefeitura, por sua vez, diz que investiu, nos últimos quatro anos, R$ 124 milhões em 56 projetos econômicos e está se preparando para o dia em que a fonte do Tesouro secar.