Título: Mais instabilidade para as agências
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2007, Economia, p. B2

A oposição adicionou um elemento explosivo na já conturbada discussão em torno das agências reguladoras. Na semana passada, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) apresentou parecer favorável a uma proposta de emenda constitucional (Pec), de autoria do senador Marco Maciel (PFL-PE), que atribui ao Senado o poder de exonerar, a qualquer momento, os presidentes ou diretores das agências, desde que haja 'fato notório de corrupção ou ineficiência', que justifique a medida.

A proposta não esclarece como será avaliada a 'ineficiência' do presidente ou do diretor da agência reguladora e nem em que grau um fato de corrupção pode se tornar 'notório'. Basta que uma denúncia contra a autoridade em questão seja publicada na imprensa? Ou haveria necessidade de apresentação de provas conclusivas, o que só aconteceria quando o processo fosse apreciado pela Justiça?

Na justificativa da proposta, Maciel afirma que o afastamento poderá ocorrer 'a qualquer tempo, em resposta a fatos políticos ou ações deletérias provocadas ou relacionadas negativamente com determinada autoridade'. O senador, que foi vice-presidente da República, diz que 'não parece aceitável que a outorga de poderes para gerir determinado segmento estatal, não possa ser revista, constatados desvios no curso do mandato aprovado pelo Senado'.

Os nomes dos diretores e dos presidentes das agências reguladoras são indicados pelo presidente da República, mas precisam ser aprovados pelo Senado. 'Quem pode escolher, pode, igualmente, desistir da escolha na mesma medida e da mesma forma', explica Maciel. 'A autoridade escolhida, e aprovada, deve ser um servidor público diligente, responsável e operante, e não um detentor de mandato autônomo e independente, com poderes amplamente discricionários, durante o período de seu mandato', diz.

O senador Jefferson Peres, que é o relator da Pec na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), afirma, em seu parecer, que 'a destituição em razão da corrupção ou ineficiência atende ao interesse público'. Para que não ocorram perseguições aos agentes visados, Peres mudou o texto da Pec e propôs que a destituição seja aprovada pela maioria absoluta dos senadores. Mesmo assim, ele admite que essa exigência 'não eliminará de todo o risco de injustiças, mas poderá diminuí-lo consideravelmente'.

Parece evidente o grau de subjetividade na avaliação de 'ineficiência' de um agente público. Ao mesmo tempo, a história política recente do Brasil está repleta de casos de pessoas que foram acusadas de corrupção e que, posteriormente, foram absolvidas pela Justiça. Não há dúvidas que, se aprovada, a Pec aumentará o grau de instabilidade jurídica em que as agências reguladoras já estão submetidas.

A Pec só não foi votada na semana passada porque o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) pediu vistas. Ela poderá ser votada esta semana. Mesmo que venha a ser rejeitada, a proposta mostra que ainda não existe clareza no País sobre o desenho institucional que as agências devem ter. Nem dentro do Congresso e nem dentro do governo Lula.

Em recente entrevista ao Estado, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, criticou a proposta de emenda constitucional apresentada pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que dá autonomia administrativa e financeira às agências. O principal argumento utilizado pela ministra contra a proposta é que a constitucionalização revela a intenção de usurpar do presidente da República o poder de conceder e outorgar os serviços públicos, além de retirar do governo a formulação das políticas setoriais.

Na mesma entrevista, a ministra informou que não leu a Pec. Por isso, ela não sabe que, durante as negociações no Senado, ficou explicitado no texto da proposta que as agências reguladoras são entidades destinadas ao exercício de atividades de regulação e fiscalização, podendo aplicar sanções. Nada mais do que isso. Foram retiradas da Pec quaisquer referências ao poder de conceder ou outorgar serviços ou formular políticas setoriais. A proposta, que já foi aprovada em primeiro turno no Senado, prevê ainda que a lei definirá a forma de controle externo das agências e como será feita a supervisão por parte do Executivo.

Os senadores Jereissati e Mercadante estão tentando construir um marco regulatório estável, permanente para as agências reguladoras, independente de coloração partidária. Mas esse esforço, sabe-se agora, está sendo feito à revelia do governo. Com a oposição do governo, é provável que a Pec não seja aprovada na votação em segundo turno.