Título: Ministro não negocia com 'faca no pescoço'
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2007, Nacional, p. A4
Pressionado pelas lideranças militares, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comandou ontem uma ofensiva contra os controladores de vôo militares que se amotinaram. Escalado como negociador, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, recebeu os controladores no ministério e disse que o governo não negocia ¿com a faca no pescoço¿. Na noite de sexta-feira, em nome de Lula, o ministro fizera promessas aos sargentos amotinados.
O tom da reunião foi bastante diferente do de sexta-feira, quando o governo se comprometeu, entre outras coisas, a não punir culpados. A nova estratégia deu certo. Acuados, os controladores se viram obrigados a recuar ¿para não arrebentar a corda¿. Ao fim do encontro, um dos controladores presentes disse que eles não farão paralisação na Páscoa. A estratégia, agora, é ¿ganhar a opinião pública e mostrar que, diferentemente do governo, eles cumprem seu acordo¿.
Bernardo deixou claro que o governo não ficaria refém dos controladores e exigiu mudança de postura deles para que pelo menos parte dos pedidos seja atendida. Um dos principais desejos dos controladores, a desmilitarização do setor, foi mencionada superficialmente pelo ministro. Bernardo avisou que ela segue adiante desde que os controladores trabalhem dentro da normalidade, evitando transtornos como o de sexta-feira. ¿Fica muito difícil negociar e discutir com constantes ameaças de retomada do movimento, de fazer greve novamente e transformar a Páscoa em um inferno¿, disse o ministro.
No encontro, Bernardo fez um relato resumido das exigências do presidente. Embora tenha dito que Lula continuava aberto ao diálogo, deixou claro que negociação pressupõe ¿respeito mútuo entre as partes¿ e vontade de preservar a execução dos serviços públicos essenciais, de tal forma que a população não seja prejudicada.
Bernardo nem sequer discutiu propostas. Não houve propriamente negociação. Para o governo, o importante era estabelecer regras claras para o diálogo e mostrar os limites legais a que todos estão subordinados. O ministro não discutiu possível anistia aos sargentos insubordinados.
O Palácio do Planalto, aliás, deu sinais claros de que quer o tema fora da agenda. ¿Não é papel do presidente falar de anistia¿, afirmou o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, negando que haja recuo de Lula na questão. ¿Não acho que ele tenha voltado atrás, pois a idéia de anistia nunca existiu. O presidente não pode se sobrepor à Justiça.¿
DESGASTE
Os representantes dos controladores queixaram-se da forma como estão sendo mostrados ao País pela imprensa. Rejeitaram o papel de vilão e reafirmaram as precárias condições em que fazem o controle do espaço aéreo brasileiro.
Para eles, a imagem da categoria ficou bastante desgastada com o episódio. Um controlador chegou a dizer que a classe é constituída de ¿patriotas¿, ao contrário do que estaria sendo veiculado pela imprensa.
Só no fim da tarde, depois de avaliar a posição do Planalto, os controladores decidiram apaziguar os ânimos. Eles entendem que o governo endureceu por pressão e voltará a negociar. ¿Profissional tenso pode levar a um acidente e isso é muito preocupante¿, disse um controlador.
A mudança de discurso do governo, afirmam, é um gesto para não manchar a imagem das Forças Armadas.
Antes mesmo de ter conhecimento do recuo dos controladores Bernardo já tinha considerado a conversa positiva e assegurado que o governo realmente pretende fazer mudanças no controle de tráfego aéreo. ¿Queremos ouvir todas as partes envolvidas, mas queremos fazer isso em clima de tranqüilidade, sem faca no pescoço¿, repetiu.
CARGOS
A Câmara aprovou ontem à noite medida provisória que cria 172 cargos de técnico para os Cindactas.
Desse total, 137 vagas são para técnico de Defesa Aérea e Controle de Trafego Aéreo. Não há vagas para controladores de vôo.