Título: Argentinos acham que guerra foi 'loucura'
Autor: Palacios, Ariel
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2007, Internacional, p. A12

Vinte e cinco anos após a Guerra das Malvinas, a maioria dos argentinos acredita que a invasão das ilhas foi um erro. Uma pesquisa realizada pela consultoria OPSM Ibope revelou que 76,1% da população argentina considera que a ocupação das ilhas e a posterior guerra contra os britânicos, em 1982, foi ¿uma loucura¿. Apenas 15,1% acreditam que a Argentina teve chances de vencer o conflito.

Para 40,4% dos entrevistados, a melhor forma de negociação diplomática para reaver as ilhas seria por intermédio da ONU. Já 21,9% apóiam a utilização do mesmo modelo da entrega programada de Hong Kong à China. Apenas 17,6% são a favor de uma soberania compartilhada das ilhas com a Grã-Bretanha. A condução de uma nova guerra para recuperar o arquipélago teve 0%, ou seja, não recebeu apoio suficiente que tivesse valor estatístico na pesquisa.

O levantamento também deixou claro o peso que as Malvinas possuem nas prioridades políticas dos argentinos. Segundo o relatório, em comparação com outros problemas do país, como a falta de segurança, desemprego e inflação, as negociações para recuperar as ilhas são ¿importantes¿ e ¿muito importantes¿ para 73,1% dos argentinos.

Ontem, associações de veteranos de guerra e líderes da oposição criticaram a ausência do presidente Néstor Kirchner nas cerimônias oficiais realizadas na segunda-feira em memória aos mortos na Guerra das Malvinas. A cerimônia foi realizada na cidade de Ushuia, no extremo sul do país. A oposição afirma que Kirchner não participou do evento para esquivar-se de uma grande manifestação na cidade de professores públicos da Patagônia, em campanha por melhores salários.

INCIDENTE

Um Boeing brasileiro quase foi derrubado por engano em 1982 pela poderosa Força-Tarefa britânica enviada pela primeira-ministra Margareth Thatcher para expulsar as tropas argentinas que haviam ocupado as Malvinas.

O episódio, que já era conhecido, foi relembrado ontem pelo almirante Sir John Foster `Sandy¿ Woodward, em entrevista ao jornal portenho Clarín. Woodward, comandante da Força-Tarefa, disse que a confusão envolvendo um vôo da Varig que ia de Durban, na África do Sul, para o Rio de Janeiro, ocorreu porque os militares britânicos confundiram o avião brasileiro com um Boeing 707 adaptado pela Força Aérea argentina para reconhecimento aéreo.

Na ocasião, a frota britânica descia pelo Atlântico Sul rumo às Malvinas. ¿O avião havia se aproximado de nós várias noites seguidas. Chamei o quartel-general e disse que deveria derrubá-lo. Me disseram que não, pois a guerra ainda não havia começado. Na noite seguinte o avião voltou a aparecer em nosso radar, na mesma direção. Foi quando eu disse, depois de checar tudo, para que não disparassem contra ele. Estive a 30 segundos de ordenar que o derrubassem. Teria caído em um minuto, com a horrenda perda de vidas de inocentes brasileiros¿, contou o almirante ao jornal.

NEUTRALIDADE

Durante a Guerra das Malvinas o Brasil permaneceu neutro. A decisão do governo do então presidente João Baptista Figueiredo tranqüilizou os militares argentinos, que poucos anos antes entraram em estado de tensão com o Brasil por causa da crise da hidrelétrica de Itaipu (a Argentina queria que a capacidade da obra fosse menor). Ao mesmo tempo, a neutralidade brasileira acalmou os britânicos, que entenderam que Figueiredo tampouco colaboraria ativamente com a Argentina.

Woodward lamentou ainda que a Guerra das Malvinas tenha acontecido, ¿pois não solucionou coisa alguma¿. De acordo com ele, o conflito atrasou qualquer solução diplomática em relação ao território por mais 50 anos. O almirante disse também ao Clarín que as forças britânicas ¿não tinham treinamento nem preparação para realizar uma operação anfíbia a 24 mil quilômetros de casa¿.