Título: 'Real forte é um problema ruim'
Autor: Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2007, Economia, p. B1
O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, afirmou ao Estado que discorda da avaliação de que a valorização cambial no Brasil seja um 'problema bom' para o País.
'Pelo contrário, é um problema terrivelmente ruim, que está - vou usar uma expressão forte - dissolvendo as relações interindustriais e as relações de mercado. A conseqüência é um clima tremendamente ruim e a dispensa de 350 mil trabalhadores.' Almeida lembrou que só nas cadeias de vestuário foram demitidas cerca de 200 mil pessoas e, no setor de calçados, quase 140 mil.
As declarações do secretário expõem a discordância entre o setor majoritário do Ministério da Fazenda e o Banco Central sobre a política de juros e câmbio e quebram a trégua entre os dois lados ordenada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um dia antes, em reunião ministerial, Lula havia reiterado a determinação de pôr fim às divergências públicas entre membros do governo.
Elas atingem também o ministro Guido Mantega, que, apesar de já ter várias vezes manifestado preocupação com a taxa de câmbio, tem ultimamente recorrido à explicação de que o real valorizado reflete os bons fundamentos da economia.Na segunda-feira, o novo secretário de Acompanhamento Econômico da Fazenda, Nelson Barbosa, que até pouco tempo era adjunto de Almeida, também havia afirmado que a valorização do câmbio era um 'problema bom'.
Para Almeida, a visão de que o câmbio seria um 'problema bom' tem se disseminado dentro e fora do governo e pode prejudicar o País. O secretário destaca que o real está 'sobrevalorizado' por causa dos juros altos, embora admita que a queda no risco país e a acumulação de reservas colocam a moeda brasileira em trajetória de fortalecimento. 'O câmbio está sobrevalorizado em conseqüência de algo que não é uma virtude: o juro mais alto do planeta. O grande problema chama-se câmbio, irmão siamês do maior juro do mundo.'
O secretário não quis apontar as soluções para o problema, mas alfinetou o primeiro escalão do governo. 'As soluções existem. Não vou dizer porque vai parecer pressão sobre quem executa as políticas, mas elas são mais do que sabidas. Estão colocadas sobre as mesas de todas as autoridades. Todo mundo sabe como resolver. O que falta é decisão.'
As afirmações de Almeida repercutiram mal no Ministério da Fazenda. Ao tomar conhecimento delas, Mantega chamou Almeida para conversar. No início da noite, a assessoria do ministro transmitiu apenas uma curta informação: 'Não há o que comentar. As declarações do secretário foram em caráter pessoal'. Nos corredores do ministério, comentava-se a possibilidade de Almeida deixar o cargo.