Título: Amazônia não atingirá metas da ONU
Autor: Amorim, Cristina
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2007, Vida&, p. A28

Os nove Estados que compõem a Amazônia Legal deram passos tímidos demais para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, estabelecidos pelas Nações Unidas e aceitos pelo governo brasileiro. Ainda que tenham obtido sucesso em uma ou outra meta, a avaliação geral não poderia ser mais negativa.

A maioria dos objetivos não apenas deixará de ser atingida no prazo - 2015 - como os Estados estão muito distantes de mudar situações degradantes de pobreza, mortalidade infantil e materna, falta de acesso à educação, desigualdade entre os sexos, taxas elevadas de doenças infecciosas e insustentabilidade ambiental. É o que demonstra o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), ONG de Belém (PA), em um estudo inédito.

Os pesquisadores Adalberto Veríssimo e Danielle Celentano avaliaram 17 indicadores e traçaram a evolução de sete dos oito Objetivos do Milênio entre 1990 e 2005. ¿Em geral¿, escrevem, ¿essa melhoria ainda é insatisfatória e a região está abaixo da média nacional¿.

Entre dez metas estudadas, duas apontam inversão. Uma delas é a taxa de desmatamento da floresta amazônica: foi de 10% em 1990 (13,7 mil km2) para 17% em 2005 (18,8 mil km2), com picos de mais de 20 mil km2. Ainda que sem patamares estabelecidos frente à ONU, o Brasil se comprometeu a reverter a perda de recursos naturais.

Só Mato Grosso, Estado campeão de desmatamento da Amazônia, derrubou 7.145 mil km2 em 2005. O secretário de Meio Ambiente do Estado, Luiz Henrique Daldegan, reconhece os números desfavoráveis da perda de recursos ambientais, porém aposta em medidas tomadas pelos poderes federal e estadual para reverter, enfim, essa tendência.

Entre elas estão o desmantelamento, em 2005, de uma rede de corrupção que favorecia a retirada ilegal de madeira; ações de comando e controle; regulamentação do corte permitido; contratação de agentes ambientais e parceria com ONGs. ¿Eu vejo hoje a questão ambiental não como uma política, mas como uma questão moral de toda a sociedade¿, disse Daldegan.

Outra meta que cresceu, em vez de cair, é o número de casos de aids. Em 1990, havia 1,2 caso para cada 100 mil habitantes da região. A relação passou para 12,4 em 100 mil em 2004. O salto pode ser explicado em parte pela ampliação e melhoria do serviço de diagnóstico na rede pública. Mas a justificativa não alivia a responsabilidade: a meta da ONU é, até 2015, deter e começar a reduzir a propagação da doença.

VARIAÇÕES

¿O estudo demonstra que há um passivo socioeconômico muito evidente, o que deixa a questão ambiental mais fragilizada¿, diz Veríssimo. Tal passivo é conseqüência do processo de ocupação da Amazônia. A migração ocorre sem planejamento e o governo chega apenas quando os problemas já estão plenamente consolidados.

A conseqüência se reflete nos números. Ainda que 73% da população amazônica seja computada como urbana, isso não significa que ela tenha acesso às facilidades normalmente vinculadas às cidades. Um excelente exemplo é o da mortalidade de mulheres no parto.

O número de óbitos para cada 100 mil nascidos vivos na Amazônia subiu de 57 em 1996 (o dado mais antigo disponível para o Imazon) para 58 em 2004. Em comparação, no Brasil o número aumentou de 52 para 54 no mesmo período - enquanto a meta é reduzir para 13 mortes por 100 mil nascidos vivos.

Os números também mascaram problemas recorrentes na Amazônia, como os próprios pesquisadores frisam. Um deles é a qualidade dos serviços prestados na região. ¿Os recursos naturais estão sendo convertidos sem se refletir na melhoria da qualidade de vida da população¿, afirma Danielle.

De acordo com os Objetivos do Milênio, o Brasil precisa ter 100% de crianças com idade escolar no ensino fundamental. Em todos os Estados da Amazônia Legal, este índice variava, em 2005, de 93% (no Acre) a 99% (em Rondônia). Contudo, quantidade neste caso acaba não significando qualidade.

Segundo o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2003, o desempenho dos estudantes da região nas provas de língua portuguesa e matemática ficou 7% abaixo da média nacional. Média esta já bastante deficitária:no País, apenas 5,99% dos alunos testados tinham nível adequado de conhecimento em matemática. Em língua portuguesa, o índice foi de 5,34%.