Título: 'Cotas ocultam problema que deveriam resolver'
Autor: Rodrigues, Alexandre
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/04/2007, Vida&, p. A14
Quatro anos depois de assumir a reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em meio a uma grave crise financeira, Aloisio Teixeira, professor do Instituto de Economia, prepara-se para um novo mandato numa condição bem mais confortável: pela primeira vez a consulta acadêmica encerrada ontem se deu com chapa única pela reeleição dele e da vice-reitora Sylvia Vargas. O ambiente tranqüilo contrasta com o clima de guerra que tomou conta da UFRJ em 1998, quando Teixeira venceu a disputa, mas não assumiu. O então ministro Paulo Renato Souza deu posse ao terceiro colocado da lista tríplice, José Vilhena.
Novamente vencedor em 2003 e empossado pelo governo Lula, de quem foi crítico da política econômica, Teixeira elogia o ministro da Educação, Fernando Haddad. Em entrevista ao Estado, o reitor diz que o acesso democrático ao ensino superior público passa pela expansão e o fim do vestibular, não pelas cotas.
A UFRJ sempre foi palco de concorridas disputas para o cargo de reitor. O que mudou para que acontecesse pela primeira vez uma eleição com chapa única?
A experiência do (José) Vilhena foi muito traumática para a UFRJ. Vivemos quatro anos praticamente sob intervenção do governo federal e nada andou na universidade. Isso ajudou a criar uma consciência de que a UFRJ deveria vencer aqueles conflitos para manter a posição de liderança do sistema (de universidades federais). Nesses quatro anos, trabalhamos sistematicamente para a pacificação. Normalizamos a vida institucional.
Não haver concorrentes então significa aprovação à sua gestão?
Não significa que haja unanimidade. Talvez seja mais interessante para as pessoas a permanência desse modelo onde todo mundo tem espaço para falar.
O senhor viveu momentos dramáticos, como a ameaça de corte de luz no campus do Fundão por falta de pagamento. Como é hoje a situação financeira da UFRJ?
É melhor do que quando eu peguei. Em 2003 nosso orçamento era de R$ 47 milhões. Neste ano será de R$ 104 milhões. Também houve um aumento considerável de recursos para pesquisa vindos de fontes do Ministério da Ciência e Tecnologia e de empresas como a Petrobrás. O orçamento, no entanto, ainda é insuficiente. Priorizamos o auxílio ao estudante e temos um programa de bolsas para graduação que é dos melhores do País. São quase 5 mil bolsas.
Então a UFRJ conseguiu respirar?
Não. Continuamos asfixiados. Continuamos sempre com dificuldades de pagar luz, telefone. Investimos muito em segurança. Ainda é um problema, mas houve uma redução no número de ocorrências.
O senhor foi empossado pelo então ministro Cristovam Buarque. A relação com o MEC se alterou com Tarso Genro e Fernando Haddad?
A relação entre o MEC e as universidades federais, em particular a UFRJ, se transformou nesses quatro anos. Eu, como cidadão e economista, tenho várias restrições à política do governo (Lula), mas não tenho nenhuma dúvida em dizer que na área do Ministério da Educação houve uma forte descontinuidade em relação ao governo anterior (de Fernando Henrique). Os reitores hoje têm acesso livre ao ministro. O presidente Lula já recebeu todos os reitores em audiência coletiva. Todas as propostas do MEC relativas às universidades foram trazidas aos reitores. Claro que há críticas ao MEC, mas não posso deixar de reconhecer que houve uma mudança de qualidade nessas relações.
Como lidou com a pressão para adotar cotas para negros?
Eu pessoalmente não sou favorável à política de cotas, qualquer que seja o formato. A cota acaba escondendo o problema que pretende resolver. Só 2% dos jovens entre 18 e 24 anos têm acesso ao sistema público superior. Nenhuma cota não modifica isso.
O acesso deve passar pela ampliação de vagas?
Sim. Pelo fim do vestibular, que é um dos principais instrumentos de exclusão que temos hoje. Nos Estados Unidos, 65% dos jovens estão na universidade. Lá houve um grau de universalização. Aqui, não é que não existe discriminação, mas temos de ir além disso e transformar o sistema. A universidade tem de cumprir a sua função social, que é voltar-se à sociedade.