Título: Lula monta ministério que dificulta reformas
Autor: Domingos, João e Leal, Luciana Nunes
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2007, Nacional, p. A4

O novo ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva preencheu as conveniências políticas de um governo de coalizão formado por 11 partidos de tendências ideológicas que vão da centro-esquerda à centro-direita, mas reforçou o viés anti-reformas que deve marcar este segundo mandato. Após cem dias do seu segundo mandato, tendo de contornar os problemas naturais de uma aliança tão ampla, o presidente deixou em segundo plano as reformas estruturais que enunciara nas primeiras semanas de governo - previdenciária, trabalhista, sindical, tributária e política.

Para o líder do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) será uma alternativa. ¿Primeiro, vamos de PAC. Depois, será a vez da reforma política¿, disse. Quanto às outras reformas, Múcio acha que ¿as propostas surgirão naturalmente¿, mas não aposta nelas para este ano.

A resistência de alguns ministros, por entenderem que as reformas significarão corte de conquistas históricas, é expressa sem dubiedade pelo ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT). ¿Podem me chamar de antiquado, de atrasado, dizer que estou fora do mundo atual. Mas não vou defender reformas que tiram os direitos do trabalhador. Não tem como sair reforma trabalhista ou sindical sem consenso entre trabalhadores. E o consenso é muito difícil.¿

Lupi vê solução para a reforma trabalhista em um ministério vizinho, onde fica a equipe econômica: ¿Me disponho a trabalhar pela reforma tributária, que é a principal saída para gerar emprego formal.¿ Lupi deixou claro que é contra mudanças na Constituição, no que se refere à questão trabalhista, e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). ¿Muitos companheiros e intelectuais dizem que as regras trabalhistas atuais geram desemprego. Pois eu digo que a automação também gera desemprego. Querem me estereotipar. Esta é minha opinião pessoal, mas estou aberto ao diálogo.¿

COLO DOS POBRES

Lula, que demorou cinco meses para montar a equipe, mostrou, na posse de Lupi, que aceitava a resistência do pedetista. Ao justificar por que não dera a Previdência para Lupi, mas o Trabalho, Lula se explicou: ¿Certamente ele teria dificuldades em alguns temas que vamos ter de discutir na Previdência.¿

Para a Previdência, Lula levou o ex-titular do Trabalho Luiz Marinho, um de seus mais fiéis aliados. Mas nem o presidente deu esperanças de que trabalhará por uma reforma profunda, capaz de acabar com o déficit da Previdência, que em 2006 foi de R$ 41 bilhões.

No discurso de posse de Marinho e Luppi, em 29 de março, Lula admitiu que o déficit vai permanecer, até porque não pretende fazer reformas com medidas jogadas ¿no colo dos pobres¿. Uma das idéias é criar uma idade mínima de aposentadoria no setor privado, como já acontece no serviço público.

Lupi já se candidata a bombardear também essa reforma. ¿A discussão da Previdência é de gestão, de melhorar arrecadação, combater a corrupção e a fraude. De novo, não vou defender mudanças que prejudiquem os mais fracos¿, avisou. ¿Não pode mudar as regras do jogo no intervalo. Pergunte o que acham as famílias que dependem da aposentadoria do vovô para sobreviver. Se o Estado não amparar os que precisam dele, para que servirá?¿

REFORMA POLÍTICA

Nesse ritmo, a reforma política anunciada por Lula pode não ser aquela que, segundo ele, iria revolucionar o sistema eleitoral e político do País. O ministro Tarso Genro, que vinha tratando do assunto, deixou as Relações Institucionais para assumir o Ministério da Justiça.

Nos bastidores, há a informação de que ele pediu ao presidente para continuar no tema. Mas poucos acreditam que arranjará tempo para costurar essa negociação. Walfrido Mares Guia, o substituto de Genro, já confidenciou não ter apetite para tratar da reforma política.

¿Se conseguirmos aprovar os cinco projetos da reforma política que estão prontos para a votação em plenário, teremos feito o mínimo do mínimo¿, diz o relator das propostas, deputado Rubens Otoni (PT-GO). O ¿mínimo do mínimo¿ é o financiamento público de campanha, as listas prévias de candidatos a deputado federal feitas pelos partidos, o fim da coligação para as eleições proporcionais, a possibilidade de criação de federações de partidos, para saltar os obstáculos da cláusula de barreira, e a fidelidade partidária por tempo de filiação.

Otoni conta que o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), acenou com a possibilidade de votar os itens da reforma até maio. Mas ele próprio, defensor da aprovação do pacote básico, acha que não há segurança nenhuma. ¿Se formos para o plenário hoje, não tenho condição de garantir que os cinco pontos serão aprovados.¿

TERCEIRA DIVISÃO

Para o líder do DEM na Câmara, Onyx Lorenzoni (RS), a possibilidade de algum item da reforma política ser aprovado é ¿zero¿. ¿O governo não tem condição de negociar e ainda tem problemas em seu ministério.¿

¿O time que o presidente montou no primeiro mandato era para disputar a primeira divisão, apesar de equívocos e falhas pessoais. O atual é para a terceira divisão. Havia, no primeiro, um Márcio Thomaz Bastos, um Luiz Fernando Furlan, um Roberto Rodrigues¿, afirma Lorenzoni. ¿Bastos tem história e conteúdo; Tarso Genro, que o substituiu, tem só a casca.¿

Para Lorenzoni, Lula só está interessado em aprovar a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e a Desvinculação de Receitas da União (DRU). ¿Essa base gigantesca foi montada para isso, só para isso.¿ O líder do governo na Câmara rebate - admite que o Programa de Aceleração do Crescimento é prioritário, mas garante que as reformas acabarão por ser aprovadas, uma vez que o seu maior defensor é justamente o presidente Lula. ¿Ele vai mandar e elas vão sair.¿