Título: Governadores já legislam por MPs
Autor: Brandt, Ricardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2007, Nacional, p. A10

A edição de medidas provisórias está liberada nos Estados e municípios desde agosto de 2006, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou definitivamente a prática, desde que estabelecida nas constituições estaduais. Considerada peça-chave para efetivação do Programa de Aceleramento do Crescimento (PAC) e duramente criticada como instrumento autoritário de governo federal, as MPs já são adotadas em seis Estados e alguns municípios.

Acre, Maranhão, Paraíba, Piauí, Santa Catarina e Tocantins adequaram suas constituições e já editam MPs. Algumas prefeituras, como Palmas (TO) e João Pessoa (PB), também podem usar medidas provisórias, pois o instrumento está previsto em suas leis orgânicas.

Na Paraíba, o mecanismo foi instituído em 1994, por emenda constitucional, mas só foi usado pela primeira vez em 2003, primeiro ano do governo de Cássio Cunha Lima (PSDB), reeleito em 2006. A MP 1 criou, sem polêmicas, o Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico (Condetur) da Paraíba. Virou lei dois meses depois.

Em João Pessoa (PB), um dos poucos municípios que utilizam MPs, houve confusão. Em 2005, as decisões do prefeito, Ricardo Coutinho, de criar a Secretaria de Habitação Social e de autorizar o município a disponibilizar áreas públicas do patrimônio e aliená-las a qualquer título, por meio de MPs, gerou protestos na Câmara. O prefeito foi acusado de abuso.

ESPECIALISTAS

Para a oposição e para juristas, as MPs não são um problema em si. O erro estaria na forma como são usadas. Para eles, os presidentes da República e os governadores passaram a usar as medidas provisórias em excesso, de forma desvirtuada e como instrumento para atropelar o Poder Legislativo.

¿Os governantes têm abusado, criminosa e impunemente, da sua utilização, banalizando um instrumental que, sem dúvida, é necessário, nos casos de extrema urgência e relevância e não é estranho aos países mais adiantados como instrumento necessário e insubstituível de governabilidade¿, afirmou Leon Frejda Szklarowsky.

De fato, o número de medidas provisórias editadas pelos últimos presidentes comprova esse uso abusivo. Ao longo de seu primeiro mandato (2003-2006), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou o equivalente a uma MP por semana. Mas o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso detém até hoje o título de presidente que mais editou MPs no período de um ano - foram 82 medidas, assinadas em 2002.

Para especialistas, a decisão do STF confirmando que Estados e municípios podem usar as MPs para governar deve provocar um movimento de mudanças nas constituições estaduais. Para que possam fazer isso, porém, os governadores - eleitos e reeleitos - precisam mandar para as Assembléias Legislativas projetos de emenda às constituições estaduais.

Essa obrigatoriedade foi expressa pelo Supremo, que em sua última decisão afirma que ¿a Corte reconheceu, por maioria, a constitucionalidade da instituição de medida provisória estadual, desde que, primeiro, esse instrumento esteja expressamente previsto na constituição do Estado e, segundo, sejam observados os princípios e limitações impostas pela Constituição Federal¿.

Pela legislação, os governantes podem editar medidas provisórias para tratar sobre impostos, questões administrativas, salários dos servidores, entre outras, desde que haja urgência e relevância. É vedado o uso das medidas provisórias para tratar sobre assuntos de processo penal e civil, sobre a organização do Judiciário e sobre direitos políticos, entre outros.

POLÊMICA

Desde a Constituição de 1988, as MPs foram instituídas no País como uma forma de o Executivo atuar como legislador, em casos de urgência e relevância. Mas sempre se discutiu juridicamente se esse instrumento podia ou não ser adotado por governadores e prefeitos.

O Tocantins foi um dos primeiros Estados a editar MPs, em 1990, o que acabou gerando o primeiro processo no STF sobre o tema, movido pelo PMDB, que questionava o direito do governador de tomar decisões dessa forma. Mas foi uma ação do PT de Santa Catarina contra o uso dessas medidas, julgada em 16 de agosto de 2006, que confirmou a possibilidade de governadores e prefeitos legislarem por MPs.