Título: Aprovado, mesmo sem algumas notas no boletim
Autor: Iwasso, Simone
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/04/2007, Vida&, p. A26

O Ministério Público de São Paulo deve concluir até o fim do mês inquérito aberto para investigar casos de alunos de escolas da rede estadual que foram aprovados sem parte das notas no boletim devido à falta dos professores de algumas disciplinas. Os casos foram divulgados no fim do ano passado em uma pesquisa feita com estudantes pela organização não-governamental Educafro, voltada para o atendimento da população de baixa renda.

¿Detectamos que há um problema. Quando o professor se ausenta, por motivos de licença ou outros motivos, acaba aparecendo a figura do professor eventual ou substituto, que ganha por aula dada, não tem vínculo com a escola e não ministra a mesma disciplina¿, afirma a promotora Fernanda Leão, do Grupo Especial de Inclusão Social do Ministério Público.

¿Ouvimos os alunos, vimos os boletins, chamamos os professores. E agora pretendemos averiguar também o número excessivo de licenciados. Apenas considerando 2 diretorias de ensino, das 13 que existem, já estou com dois volumes de professores ausentes por motivos de saúde¿, complementa ela.

A própria Secretaria da Educação disponibilizou um grupo de trabalho para avaliar junto com a promotora os casos e apurar as ocorrências levantadas até o momento. Por meio de uma nota oficial, a secretaria informou também que alunos não ficam sem aulas, pois ¿no início de cada ano letivo são feitas atribuições já prevendo um quadro para substituições a partir de um processo de classificação. Na hipótese de alunos, eventualmente, ficarem sem aulas, as escolas preparam calendário de reposição para garantir carga horária mínima¿.

Seja como for, na ponta da rede está o aluno, que é afetado e tem seu aprendizado interrompido. Como Tiago Menezes, de 17 anos, que conta ter ficado metade do ano passado sem professor de geografia. Em seu boletim, aparece um espaço em branco onde deveria estar sua nota. No caso de Juliana Ramos Rodrigues, de 17 anos, no ano passado, quando estava no 2ª ano do ensino médio, em um dos bimestres não houve aula suficiente de filosofia para que houvesse avaliação. ¿No meu boletim veio conceito A, mas a gente não fez prova nem trabalho, porque o professor não veio e o substituto deu outras coisas pra fazer¿, conta.

TRABALHO EM DOBRO

Longe das investigações do Ministério Público, muitos alunos enfrentam problemas com a ausência de seus professores e não sabem para quem reclamar. ¿Não tem um dia em que eu tenho todas as aulas que eu deveria ter¿, conta Leonardo Arouca, de 13 anos, aluno da 7ª série de um colégio da zona norte de São Paulo.

Segundo ele, os professores substitutos resolvem a ausência do professor titular apenas em termos. ¿Eles dão a matéria que querem, que pode não ter nada a ver com o que estamos aprendendo¿, relata. ¿Eu tenho problemas em ciência porque no ano passado a professora faltou o ano todo.¿

Em outra escola da mesma região, Zohara Romcy, de 17 anos, também enfrenta muitas dificuldades. Está no 2º ano do ensino médio e passou metade do 1º ano sem aulas de filosofia e matemática. ¿Depois, a gente tem de correr atrás, fazer trabalhos em dobro para tentar recuperar tudo isso.¿ O problema é que ela quer entrar na faculdade de Administração e sabe que vai ter dificuldades por conta do que não aprendeu na sala de aula. ¿Vou ter de `ralar¿ bem mais, vai ser bem mais complicado¿, acredita.