Título: Representantes do governo têm diagnósticos divergentes
Autor: Monteiro, Tânia e Scinocca, Ana Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/04/2007, Nacional, p. A4

A audiência pública para discutir a crise aérea ontem na Câmara foi marcada por um verdadeiro apagão de explicações entre os seis principais representantes do setor convidados a falar na Comissão de Fiscalização e Controle da Casa. Os representantes do governo não se entenderam sobre as características da crise aérea.

Enquanto o ministro da Defesa, Waldir Pires, e o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, tentavam afinar o discurso para convencer deputados de que a crise teve início com o acidente da Gol, em setembro, o diretor-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Milton Zuanazzi, apresentou dados que, segundo ele, confirmam que não há crise alguma.

O cenário traçado por Zuanazzi foi ironizado pelos parlamentares. ¿Está tudo muito bem e estamos acordando de um sonho. Não há apagão, e sim céu de brigadeiro¿, afirmou o deputado Índio da Costa (DEM-RJ).

¿A crise do transporte aéreo está longe de ser uma crise. Crise foi a que superamos a partir de 2004¿, afirmou, insistindo que o Brasil viveu crise aguda de 1999 a 2003. Na outra ponta da mesa, o brigadeiro José Carlos Pereira, presidente da Infraero, preocupou-se em ressaltar os investimentos em obras feitos pelas estatal, deixando de lado qualquer assunto que lembrasse crise entre controladores e Aeronáutica e tumultos sucessivos no embarque de passageiros pelos aeroportos do País.

Apesar do esforço para esconder as diferenças de pensamento, Pires e Saito divergiram logo nas explanações iniciais em relação à proposta de desmilitarização do controle do tráfego aéreo. Entre os dois representantes da indústria do turismo, diretamente relacionada com o setor aéreo, mais divergência. A representante do Ministério do Turismo, Janine Pires, apresentou números de aumento de desembarque de passageiros e crescimento da receita. O presidente da Associação Brasileira de Agentes de Viagens (Abav), João Pereira Martins Neto, lamentava o fato de o apagão aéreo ter sido responsável pela queda de faturamento entre 35% a 40%.

Depois de quase uma hora de diagnósticos tão conflitantes, o momento mais marcante da audiência foi a defesa entusiasmada que Pires fez de si mesmo e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ministro não conseguiu disfarçar a pressão que vem sofrendo. ¿Em que país da Europa o ministro da Defesa é responsável por tudo? Onde está a lei que diz que a competência é do ministro da Defesa?¿, perguntou, para, em seguida, ele próprio responder. ¿O presidente da República é a única autoridade que pode e deve fazer acordo tendo como objetivo os interesses da Nação¿, disse.

A frase foi uma explicação para o acordo feito pelo ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, com os controladores que acabou com a greve do dia 30 de março, depois que o governo prometeu, em documento assinado por Bernardo, que não haveria punições por causa do motim dos controladores.

¿O presidente é quem decide acima das ordens singulares, ainda que as reponha depois. Naquele momento, não tinha alternativa¿, sustentou o ministro. Pires negou que no dia 30 tenha saído de Brasília em um jatinho para uma festa no Rio. Afirmando que a competência de gerenciar o setor passa longe de seu ministério, lembrou que ao voltar dos EUA Lula retomou as conversas com Saito, ¿porque é o que diz a lei¿.

O ministro negou que a Infraero tenha demitido funcionários para que eles não deponham na CPI do Apagão.

Ao ser questionado por deputados, demonstrou irritação e chegou a bater a mão na mesa - sobretudo ao ser provocado por Índio da Costa, que falou em ¿irresponsabilidade¿ de Pires. ¿Não me achei irresponsável de nada. Eu assumo as minhas responsabilidades. O presidente da República fez o que tinha que fazer.¿

Pires negou ter recebido convite dos controladores para discutir a crise. ¿Nunca me pediram audiência e eu lamento.¿ Em 2 de novembro, dia seguinte ao primeiro apagão, ele se reuniu com os representantes da categoria, o que gerou atrito com o então comandante Luiz Carlos Bueno.