Título: 'CPI é instrumento para complicar o governo'
Autor: Rosa, Vera e Augusto, Claudio
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/04/2007, Nacional, p. A6

O ministro das Relações Institucionais, Walfrido Mares Guia (PTB), é um mineiro habilidoso. Na articulação política há menos de um mês, o ex-titular do Turismo toma café da manhã, almoça e janta com parlamentares, governadores e prefeitos - como reparou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua tarefa, agora, é reconstruir pontes com a oposição para barrar a CPI do Apagão Aéreo, esticar a validade da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e da Desvinculação das Receitas da União (DRU) e aprovar as medidas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 'Qual governo não evita CPI?', argumenta.

Mares Guia acha que os adversários de Lula só querem 'fustigar' o Planalto com as investigações, mesmo as relacionadas à Infraero - estatal que administra os aeroportos e enfrenta uma penca de denúncias de corrupção. 'A CPI, hoje, é um instrumento da oposição para complicar o governo', afirma. Considera, porém, um 'absurdo inominável' a interpretação de que o intuito do Executivo seja esconder falcatruas. 'Quem está num órgão público e fez alguma coisa não recomendável, ou comeu mosca, que pague o pato', insiste.

Ao falar ao Estado,ele diz ainda que não haverá 'porteira fechada', com o preenchimento dos cargos de cada ministério por um único partido. 'Porteira fechada era uma utopia na cabeça de alguns dirigentes partidários. Agora, que temos 11 partidos na coalizão, como vamos fazer isso?'

Até o ano passado, o governo resistia a conceder 1% a mais no Fundo de Participação dos Municípios aos prefeitos, sob o argumento de que isso dependia da conclusão da reforma tributária. O que fez o Planalto mudar de posição?

Foram dois fatos relevantes. O primeiro foi o êxito da reunião do presidente Lula com os governadores (em 6 de março), em que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avançou na proposta de reforma tributária. Então ele achou que seria melhor retirarmos a proposta que está no Congresso e mandar uma nova, em negociação com os governadores. O segundo fato é o momento singular da economia, que propicia - além das desonerações que faremos no PAC, de R$ 6,5 bilhões - analisar os pleitos dos prefeitos.

O recuo foi para que os prefeitos ajudassem o governo a impedir a CPI do Apagão Aéreo e a votar a prorrogação da DRU e da CPMF?

Não é recuo. É mudança de posição estratégica. Recuo é andar para trás. Nós andamos para a frente para resolver o problema. Ainda estamos aguardando uma decisão da Justiça sobre a CPI do Apagão Aéreo. A DRU e a CPMF devem ser aprovadas até setembro porque é preciso ter carência de três meses para entrarem em vigor novamente.

Suas prioridades, então, são a CPMF e as medidas provisórias que integram o PAC?

A primeira coisa é aprovar o PAC. Essa é uma prioridade imediata. Ao contrário do que vocês disseram, eu acho que o PAC está indo bem. Nós já aprovamos três Medidas Provisórias, incluindo o Fundeb.

Mas ainda é muito pouco, não? Um programa que foi anunciado há quase três meses praticamente não saiu do papel...

O Congresso começou a funcionar em 1º de fevereiro. Então, tem dois meses. Esse foi o tempo para os deputados chegarem, o governo se organizar, fazer a nomeação dos ministros...

Senadores de oposição também querem criar uma CPI no Senado, paralela à iniciativa da Câmara, para investigar irregularidades da Infraero. Como o sr. vê isso?

Se quiserem fazer, façam. Agora, se a Infraero gerencia bem ou mal, constrói bem ou mal é outra questão.

A Infraero não pode estar na CPI?

Não sei. A Constituição diz que CPI tem de ter foco. Quem está num órgão público e fez alguma coisa não recomendável, ou comeu mosca, que pague o pato.

A impressão que passa é o que o governo teme essa CPI...

Não. Qual governo não evita CPI? Sem querer citar outros governos, de outros matizes, quem deixou uma CPI funcionar? Só o Lula, que deixou três. Os outros não deixaram e intervinham pessoalmente. A CPI, hoje, é um instrumento da oposição para complicar e fustigar o governo. Dizer que nós estamos querendo esconder alguma coisa porque não somos a favor da CPI é, no mínimo, um absurdo. É partir da premissa de que quem quer CPI é honesto e quem não quer não presta. Isso é um absurdo inominável.

A que o sr. atribui o crescimento da aprovação do presidente, no auge da rebelião dos sargentos controladores de vôo? À economia?

Em primeiro lugar, à liderança do presidente. Em segundo, à economia. É o camarada que há quatro anos ganhava R$ 200 e comprava 70 quilos de arroz. Agora ele ganha R$ 380 e compra 300 quilos. E o terceiro ponto são as políticas sociais. Temos um foco, que é o programa Bolsa-Família.

Ministro, o sr. mostra enorme disposição de negociar. Já fechou acordo com prefeitos e agora diz ser possível melhorar o texto que trata da fiscalização da Receita sobre prestadores de serviço. O sr. é o novo bombeiro do governo?

Eu sou o articulador político. (...) Mas temos de matar um leão a cada meia hora. E não podemos sair arranhados.

Aliados reivindicam 'porteira fechada' para o preenchimento de cargos dos principais ministérios. Como resolver isso?

Se reclamam, reclamam com vocês. Na reunião ministerial, o presidente Lula disse que quer todos os ministérios pluripartidários. Não sei quem inventou esse negócio de porteira fechada.

Mas quando foi feita a proposta do governo de coalizão o que se dizia é que, para funcionar, cada partido seria responsável por determinado ministério...

Porteira fechada era uma utopia na cabeça de alguns dirigentes partidários. Agora, que temos 11 partidos na coalizão, como vamos fazer isso?

Por que a Secretaria dos Portos ainda não foi criada? O PSB está aflito.

Porto não é assunto para resolver problema de acomodação política. É assunto profissional. A razão de criar a secretaria é para ter uma musculatura muito forte, diretamente ligada ao presidente. Os portos hoje passaram a ser estratégicos para o desenvolvimento do País.

O fato de o sr. ser do PTB de Roberto Jefferson, que denunciou o mensalão, não causa desconforto? O sr. mesmo já falou em sair do partido.

O que me causou um certo mal-estar foi o fato de, eu sendo ministro, não ver o meu partido se posicionar a favor do governo. Mas o PTB agora está representado no Conselho Político. Eu não tenho razão para sair do PTB, a menos que o partido não me queira.

O sr. pretende ser candidato ao governo de Minas em 2010?

Lá em Minas, a gente aprende o seguinte: 'Política é igual a nuvem, cada dia está de um jeito.' Nesse cargo em que eu estou, se eu pensar em ter projeto político, em vez de ajudar o presidente, eu atrapalho.

A era do toma-lá-dá-cá do primeiro mandato acabou?

Acabou. Honestamente, acho que é simplificar demais achar que um partido vem para o governo porque vai ganhar um cargo ou uma emenda. E não tem sentido fazer política de terra arrasada. Tudo para a situação e nada para a oposição. Quero deixar portas abertas.

O sr. quer reconstruir pontes com a oposição? É isso?

O tempo todo. Se alguém botar fogo eu vou lá, pego o martelo e o prego e construo a ponte de novo (risos).

Quem é: Walfrido Mares Guia

É sócio da rede de ensino Pitágoras, que está entre as maiores do País

Foi secretário de Planejamento de Belo Horizonte em 1983 e secretário de Educação de Minas de 1991 a 1994

Em 1994, elegeu-se vice-governador de Minas

Foi ministro do Turismo no primeiro mandato de Lula.