Título: Bolso do eleitor é chave do apoio a Lula
Autor: Oliveira, Clarissa e Manzano Filho, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/04/2007, Nacional, p. A8

Um plano bem-sucedido de políticas sociais lideradas pelo Bolsa-Família, uma estratégia econômica que mexe não apenas em indicadores, mas também no bolso da população e a capacidade de se comunicar como ninguém com a massa do eleitorado. Esses três pilares ajudam a explicar os motivos pelos quais o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem mantendo sua popularidade em alta, apesar de seu governo ter enfrentado uma série de denúncias e crises ao longo dos últimos anos.

A tese foi reforçada pela pesquisa CNT/Sensus divulgada anteontem, que mostrou uma aprovação de 63,7% do eleitorado a Lula. Para especialistas, a distribuição de renda, em especial, tornou-se a 'base de sustentação' do presidente e ajudou a colocar seu governo como aquele que trabalha a favor dos que mais precisam. 'Quando um governo promove uma melhoria no padrão de renda, mexe com a casa e a mesa das pessoas, ele acaba tendo um impacto muito forte na população', diz o cientista político e professor da PUC-SP e da FGV, Marco Antônio Carvalho Teixeira.

Essa não é exclusividade de Lula, lembra Fernando Limongi, professor da USP. Segundo ele, o tucano Fernando Henrique Cardoso se reelegeu sobre a plataforma da distribuição de renda, mas, naquele caso, resultante da criação do real e do controle inflacionário. 'Na prática, a razão é a mesma', afirma.

O historiador José Murilo de Carvalho ressalta, no entanto, que FHC não usou da mesma forma seus próprios programas sociais, que acabaram dando origem à política de distribuição de renda do atual governo. 'Lula os ampliou e transformou em eixo de sua mensagem. Sabe a força que isso tem e consegue usar em seu proveito.'

Outros fatores contribuem para manter a força de Lula e impedir que sua imagem seja arranhada por eventuais crises. Além da origem humilde, que ajuda a criar uma identificação com os mais pobres, o presidente tem também a habilidade de transmitir sua mensagem e de ser melhor compreendido por esses eleitores. 'O Lula é muito bom de comunicação, é um bom político mesmo. Ele é fantástico sob esse ponto de vista', avalia Limongi. Teixeira acrescenta que a força de Lula ultrapassa de longe a do governo que ele próprio comanda.

'DESCOLAMENTO '

Nada disso significa que a população esteja desinformada ou não dê importância aos acontecimentos que atingem o País, na visão desses especialistas. Para José Murilo de Carvalho , há na sociedade um 'descolamento' entre a opinião pública, caracterizada na mídia, e a opinião popular, expressa pelas pessoas em suas casas e nas ruas.

Esta segunda, por exemplo, não sente os efeitos de episódios como a crise do setor aéreo. 'Quem nessa faixa anda de avião? Ninguém', observa o historiador. Outros elementos, segundo Teixeira, ajudam a completar o quadro. Ele afirma que o simples fato de Lula ter sido reeleito há apenas poucos meses contribuiu para evitar eventuais abalos em seus índices de popularidade. 'Só isso já o credencia para ter um começo de governo sem qualquer tipo de constrangimento.'

Análise:

Marco Antônio Carvalho Teixeira Cientista político

'Quando um governo promove uma melhoria no padrão de renda, mexe com a casa e a mesa das pessoas, ele acaba tendo um impacto muito forte na população. A partir daí, as pessoas tendem a se perguntar: por que mudar?'

Fernando Limongi Cientista político

'Não há uma exclusividade do Lula. O Fernando Henrique Cardoso também se reelegeu em cima da distribuição de renda, apesar de denúncias de compra de votos, por exemplo. O Real, é fato, gerou uma distribuição da renda. Na prática, a razão é a mesma'

José Murilo de Carvalho Historiador

'Há na sociedade brasileira, hoje, um descolamento entre opinião pública e opinião popular. A primeira está na mídia, a outra é o povo nas casas, nas ruas. E, para esta, vai tudo bem. Quem, nessa faixa, anda de avião? Ninguém. Os problemas nos aeroportos nada importam para eles'

Ricardo Guedes Cientista político

'Lula se transformou em um símbolo desse pacto, que é desejado pela sociedade. Um pacto que mantém o capitalismo, mas segue as regras da social-democracia, para mitigar os efeitos e desvios do mercado. Ele assiste os pobres dentro das regras'.