Título: País suporta juro 2,25 pontos mais baixo, diz estudo
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/04/2007, Economia, p. B3

Na tarde de quarta-feira, quando os diretores do Banco Central (BC) concluírem a terceira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) deste ano, a taxa básica de juros poderá atingir o menor nível da história. Mas a marca ainda está longe de ser motivo de comemoração, já que o País continua na liderança dos maiores juros reais (descontada a inflação) do mundo. Além disso, um estudo revela que a taxa brasileira poderia, tranqüilamente, estar 2,25 pontos porcentuais abaixo da atual, de 12,75% ao ano.

O trabalho feito pelos economistas Edmar Bacha (Instituto de Estudos de Política Econômica), Márcio Holland (Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas) e Fernando Gonçalves (Fundo Monetário Internacional) mostra que o País reúne condições para respaldar taxa nominal na casa de 10,5% ao ano e juro real de 6,5%, sem correr riscos. ¿Tivemos muitas melhoras nos fundamentos econômicos, mas nossa taxa de juros continua como a de um país de inflação elevada¿, diz Holland.

Com base em um painel de 66 países industriais, desenvolvidos e emergentes, eles avaliaram fatores determinantes para as elevadas taxas de juros reais, como o risco sistêmico (riscos de diluição inflacionária, volatilidade inflacionária, de calote da dívida e renda per capita dos países). Outros itens como restrições a depósitos em dólares, controles de capital e qualidade jurisdicional também foram incluídos no estudo, que durou um ano e meio para ser concluído.

Desta forma, eles descobriram que em países com algum grau de dolarização da economia - o que não é permitido no Brasil - a taxa de juros real é mais baixa. As avaliações permitiram a criação de uma série de taxas reais de juros estimadas para o Brasil no período de 1996 e 2006. Neste caso, seguindo os padrões internacionais e dadas as características de risco do Brasil, o estudo verificou que as taxas reais foram superiores às vigentes em quase todos os anos do período avaliado. No ano passado, por exemplo, a taxa ficou 4,2 pontos porcentuais acima da realizada.

Outro exercício do estudo - intitulado ¿O Brasil é diferente? Risco, Dolarização e Juros nos Mercados Emergentes¿ - foi calcular a taxa de juros com base em um comportamento conservador/prudente/inteligente de um banqueiro central. Ainda assim, a taxa de juro real brasileira foi maior que as verificadas nos últimos anos. No ano passado, ficou 1,7 ponto acima e neste ano mais de 2 pontos.

O modelo prevê ainda que o impacto do investment grade (grau de investimento) no juro real estimado seria de dois pontos porcentuais, derrubando a taxa para 4,5% ao ano. ¿A posição de investment grade acelera a queda dos juros¿, destaca Holland, ressaltando a necessidade de o governo criar condições para obter em breve a tão esperada classificação de risco.

MODELO EQUIVOCADO

Para muitos economistas do mercado, e até mesmo do governo, o resultado do estudo é sinal de que o modelo do BC é equivocado. Outros vão mais pela tese de que os dirigentes da autoridade monetária erraram a mão ao elevar a taxa em 2005 e no ritmo lento do ciclo de corte.

¿Quando você dá um sinal para o mercado fica difícil mudar drasticamente. Ou seja, se o BC começa a cortar meio ponto num mês, não dá pra cortar 2 pontos no mês seguinte. Isso deixaria o mercado perdido¿, afirma um economista, que prefere não se identificar.

Mas, assim como no futebol, quando o assunto é a taxa de juros brasileira cada economista tem uma tese. O economista do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Sicsú, diz que o problema está na taxa de crescimento potencial (o quanto a economia pode crescer sem acelerar a inflação), entre 3% e 3,5%, e que precisa ser alterada. Para ele, o Brasil poderia ter uma taxa de crescimento maior, com juros menores e sem inflação, se os investimentos aumentarem.

A taxa de juros, afirma, pode ser bem menor que a atual e ainda assim não provocar fuga de investimento estrangeiro, criando crise cambial: ¿Hoje já temos uma taxa bem inferior à dos últimos anos e ainda assim continuamos a atrair capital externo.¿ Ao reduzir a taxa de juros, diz, o BC estará também diminuindo a despesa financeira do governo, que em 2006 foi R$ 163,5 bilhões.

Com a redução desses custos, o País diminui o déficit nominal, reduz a relação dívida/PIB e tem mais condições de investir em áreas importantes, como infra-estrutura, educação e segurança, exemplifica Sicsú. De acordo com cálculos do economista, a despesa com segurança pública no ano passado foi 48 vezes menor que a despesa financeira dos últimos quatro anos. ¿O aumento dos investimentos mudaria as condições físicas para o Brasil crescer mais.¿

O economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Edgard Pereira, também encontra no PIB potencial um argumento para a elevada taxa de juro. ¿Como vimos na revisão do IBGE, há uma subestimativa do PIB potencial. As taxas de crescimento foram maiores do que as previstas e os investimentos menores, o que significa maior produtividade da economia,¿, argumenta. Com números subestimados, diz Pereira, você põe a taxa num nível maior do que o necessário para manter a inflação controlada.

Na opinião da professora-doutora da Unicamp, Maryse Farhi, há uma série de explicações para os juros elevados. Uma delas é que o modelo usado pelo BC está errado. ¿Eles assumiram esse modelo, cuja visão é muito rígida, e estão levando em frente. Primeiro tomam uma decisão e depois produzem uma explicação para o que fizeram.¿