Título: A insistência dos prefeitos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2007, Notas e Informações, p. A3
Como fazem de maneira sistemática desde 1998, de dois a três mil prefeitos chegaram ou estão chegando a Brasília para uma reunião com autoridades federais - aguarda-se a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no encontro marcado para a manhã de hoje - na qual, como ocorreu nas nove ocasiões anteriores, pedirão mais dinheiro. Dirão que, por falta de recursos, está ficando impossível administrar suas prefeituras. Muito provavelmente ouvirão das autoridades federais que sua reivindicação é justa e que providências estão sendo tomadas para aliviar sua situação, mas as soluções duradouras devem fazer parte da reforma tributária, que depende de longas e difíceis negociações.
É um ato organizado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), cujo presidente, Paulo Ziulkoski, diz que é preciso mudar com urgência a maneira como o governo federal repassa recursos para as prefeituras. Desde o início do primeiro governo Lula a CNM vem reivindicando a elevação de um ponto porcentual (de 22,5% para 23,5%) da parcela da receita do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) destinada ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM). A mudança aumentaria em R$ 1,7 bilhão o total das transferências constitucionais para as prefeituras.
Por causa das transferências que recebe da União - além da parcela do FPM a que têm direito automaticamente, muitas prefeituras recebem também transferências voluntárias - e do governo de seu Estado, a grande maioria das prefeituras municipais do País não se vê na obrigação de obter recursos próprios para pagar seus gastos administrativos e os investimentos necessários para melhorar os serviços prestados à população.
Quanto mais as prefeituras dependem das transferências, menor é a disposição dos prefeitos de cobrar os tributos típicos dos municípios, como o ISS, o IPTU e o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. As transferências asseguram a sobrevivência financeira da prefeitura. Se quiser mais recursos, o prefeito recorre à boa vontade das autoridades federais ou estaduais, em troca de acordos e compromissos políticos.
Esta é uma questão que a CNM e outras instituições que falam em nome dos prefeitos e dos municípios não costumam tratar. Também ao governo federal não interessa discutir esse tema, ou outros ligados às regras de repartição da arrecadação tributária. Tendo sérios problemas para equilibrar suas contas, nos últimos anos o governo tratou de fazer crescer a receita dos tributos que não precisa dividir com os Estados e municípios, como as contribuições federais.
Diminuiu, por isso, o peso dos tributos cuja receita a União precisa dividir com outros níveis de governo. Do total arrecadado pela União, a parcela que corresponde ao IR e ao IPI se reduziu de 70% em 1980 para 41% em 2005. Isso quer dizer que, mesmo mantida a regra para a constituição dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios, a cada ano é menor a fatia do bolo tributário que a União é obrigada a transferir.
O governo Lula tem acenado com a possibilidade de atender à principal reivindicação dos prefeitos, que é o aumento do FPM. Em janeiro, o presidente da República disse a um grupo de 130 prefeitos esperar que a reforma tributária finalmente comece a caminhar e, nela, se defina o caso do aumento das fontes do FPM. É isso que os prefeitos estão cobrando agora.
Não satisfeitos com esse pedido, agora trazem uma lista maior. Querem que o governo federal obtenha dos governos estaduais o compromisso de aumentar também o repasse do ICMS para as prefeituras, eleve os investimentos em saúde, regulamente a aplicação dos recursos do Fundo da Educação Básica (Fundeb) e proponha o limite para os gastos municipais com precatórios. Espaço para barganha há, pois o governo federal necessita de apoio político para a prorrogação da CPMF e da Desvinculação das Receitas da União, essenciais para manter suas finanças equilibradas e cuja validade expira no fim do ano. Depois de dez anos de insistência, talvez desta vez os prefeitos saiam mais satisfeitos de Brasília.