Título: MP que usa o FAT para refinanciar dívida será adiada
Autor: Porto, Gustavo e Moraes, Marcelo de
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2007, Economia, p. B4

O governo deve adiar a edição da medida provisória que iria permitir o uso de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para garantir o refinanciamento da dívida de produtores rurais com o setor privado. As duas maiores centrais sindicais, CUT e Força Sindical, reagiram ontem duramente à proposta, revelada pelo Estado, e prometeram operar politicamente para barrá-la.

Além disso, a proposta provoca desconforto na base aliada do governo no Congresso, ligada a movimentos sindicais, e ao próprio ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT), empossado no cargo na semana passada com forte apoio político da Força Sindical. Para ser adotada, a MP depende do aval do Ministério do Trabalho. Ontem mesmo, Lupi se reuniu com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e admitiu que está pedindo mais detalhes sobre a proposta antes de decidir. 'A área técnica do ministério está concluindo um parecer mais detalhado e aí vamos tomar uma decisão', confirmou o ministro (leia box ao lado).

A idéia do governo é editar uma medida provisória criando o Fundo de Recebíveis do Agronegócio (FRA). O novo fundo será usado para equacionar as dívidas dos produtores rurais com o setor privado desde a safra de 2004/2005. Essa dívida alcança cerca de R$ 4 bilhões e o governo planeja repassar cerca de R$ 2,2 bilhões em recursos do FAT para custear essa operação.

A revelação do plano do governo provocou reações fortes dos dirigentes sindicais. 'O dinheiro do FAT é dinheiro da classe trabalhadora. O significado da sigla é inequívoco. A hipótese de que setores do governo estariam pretendendo utilizar verbas desse fundo para renegociar dívidas do agronegócio, conforme notícia veiculada hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo, é acintosa. A CUT repudia tal possibilidade. O assunto não foi debatido no Codefat. Se fosse, seria imediatamente repelido. Caso o agronegócio deseje ter um fundo de amparo, que crie o FAA (Fundo de Amparo ao Agronegócio) e para ele contribua periodicamente, como os trabalhadores o fazem para o FAT', diz nota oficial da CUT.

'A Força Sindical repudia a intenção do governo federal de editar medida provisória que retira 2,2 bilhões de reais do FAT para ajudar os agricultores a pagarem dívidas. Este socorro ao setor agrícola, da forma proposta, é um absurdo.Estamos preocupados com as estranhas tentativas de utilização dos recursos oriundos dos trabalhadores, no caso do FAT, em situações diametralmente opostas aos interesses do mundo do trabalho. Entendemos que qualquer decisão envolvendo liberação de recursos do FAT passe, conforme estabelecido em lei, pelo Codefat (Conselho do Fundo de Amparo ao Trabalhador).Temos certeza que o presidente Lula saberá resistir a esta pressão da bancada ruralista e terá sensibilidade social para evitar tal equívoco', afirma a nota assinada pelo presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP).

FALTA DE INFORMAÇÃO

Segundo o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), um dos que articularam a edição da MP, há falta de informação sobre a medida. Ele assegura que não haverá risco para o FAT, já que, conforme o plano desenhado na MP, o retorno dos recursos ao fundo seria garantido pelo Citibank e pelo próprio governo. Heinze confirmou o adiamento da medida. 'Agora a Casa Civil vai ter de chamar para si a decisão, o que deve ocorrer em dois ou três dias.'

A situação repete o problema enfrentado pelo governo quando decidiu editar medida provisória utilizando recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para custear a criação de um fundo de infra-estrutura para obras do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC). Na ocasião, o governo acabou cedendo às queixas de sua base de apoio e também das centrais sindicais, que temiam que a proposta colocasse em risco os recursos do FGTS em projetos sem retorno garantido. Assim, o governo se comprometeu a inserir no texto da MP salvaguardas que impediriam que os recursos dos trabalhadores fossem perdidos em outras aplicações.

'Nesse ritmo, quando o governo Lula terminar não vai ter sobrado dinheiro nenhum nos fundos com recursos dos trabalhadores', criticou Paulo Pereira, que integra a base de apoio do governo no Congresso.