Título: EUA denunciam a China na OMC
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2007, Economia, p. B8

A bilionária indústria do cinema, música e mídia abre uma verdadeira batalha entre Estados Unidos e China. Depois de anos de ameaças, a Casa Branca anunciou finalmente que levará hoje à Organização Mundial do Comércio (OMC) duas queixas contra a pirataria na China, depois de já ter questionado nas cortes internacionais os principais pilares da política comercial e industrial do país.

Para tentar evitar a disputa, Pequim se apressou para anunciar iniciativas comerciais para agradar às autoridades americanas: a imposição de novas leis criminais na China contra a pirataria e a promessa de comprar US$ 16 bilhões em produtos americanos durante um encontro oficial entre os dois países no próximo mês. Em vão.

'Os níveis de pirataria na China continuam inaceitavelmente altos. A proteção inadequada da propriedade intelectual custa às empresas americanas bilhões de dólares por ano. E alguns produtos representam risco aos consumidores na China, Estados Unidos e no resto do mundo', afirmou Susan Schwab, representante de Comércio dos Estados Unidos.

Esta é a segunda vez que o tema de propriedade intelectual chega aos tribunais da OMC. Na primeira ocasião, há cinco anos, os americanos questionaram a lei brasileira por causa da possibilidade de que o governo pudesse quebrar patentes para fabricar remédios genéricos. Um acordo acabou evitando uma verdadeira guerra.

Agora, Washington leva dois casos aos árbitros internacionais, que poderão levar meses até uma solução. Além da pirataria, a Casa Branca ataca os chineses por restringir a distribuição de filmes, livros e música estrangeira. A Casa Branca já havia iniciado duas disputas nos tribunais da OMC contra Pequim: no setor de subsídios industriais e na exigência de conteúdos locais na produção de multinacionais. Além disso, elevou tarifas para papéis, alegando tratar-se de uma medida para compensar os subsídios chineses à sua produção.

Os casos chegam aos órgãos internacionais no momento em que a China ultrapassa os Estados Unidos em exportações. Neste ano, pela primeira vez, Pequim superou os americanos em exportações mensais e acumulou entre janeiro e fevereiro mais de US$ 180 bilhões em vendas - mais que toda as exportações brasileiras no ano. O déficit dos EUA com a China chegou a US$ 232 bilhões em 2006.

Diante desse cenário, cresce a pressão nos EUA para que a Casa Branca tome medidas contra os chineses. Grande parte vem dos democratas, que se queixam da falta de ação da administração de George Bush.

Os chineses alegam que têm leis e estão tentando implementá-la. Financiada por empresas como a Disney e por grupos que representam os estúdios de Hollywood, o caso resulta de anos de embates entre americanos e chineses por causa da pirataria. Porém, nem todas as empresas acreditam que a disputa solucionará o problema. Segundo o Wall Street Journal, em sua edição de ontem, empresas como a Apple e a Microsoft pedem que a Casa Branca use a diplomacia para lidar com o caso, para não ferir as relações comerciais entre os Estados Unidos e a China.

Para Michel Danet, secretário-geral da Organização Mundial de Aduanas, a pirataria na China e as exportações para outros países não são casos isolados nem esquemas amadores. 'Vemos contêineres de produtos falsificados na China viajando pelo mundo', afirmou Danet ao Estado. 'A falsificação não é nem mesmo relativa às Olimpíadas de 2008. Já existem produtos à venda com a logomarca da Copa do Mundo na África do Sul em 2010. Isso tudo exige um grande esquema', disse, alertando que a pirataria movimenta US$ 100 bilhões no mundo.

Segundo ele, as empresas chinesas vão em breve também se queixar ao governo de que precisam de mais proteção contra a falsificação, já que também começam a patentear os seus produtos.

Para Hollywood, os prejuízos gerados nos EUA chegam a US$ 2,3 bilhões. Segundo a Motion Picture Association, apenas um em cada dez DVDs vendidos hoje na China são originais. 'A China é hoje o maior local de manufatura de produtos falsificados', afirma a entidade.

Mas os chineses se defendem alertando que parte do esquema está no próprio território americano, onde as etiquetas de marcas famosas são colocadas sobre produtos que vêm da China. 'É o caso dos relógios produzidos na Ásia, que só ganham os nomes Rolex ou outras marcas nos subúrbios de Nova York', revelou ao Estado um representante da Associação Suíça de Fabricantes de Relógios.