Título: Sem querer querendo
Autor: Kramer, Dora
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2007, Nacional, p. A6

O presidente Luiz Inácio da Silva tem razão quando classifica de ¿especulações¿ as versões de que estaria interessado no fim do instituto da reeleição para garantir que seu sucessor tenha apenas um mandato e ele possa pensar em voltar a concorrer à Presidência da República em 2014.

Isso, de fato, é uma interpretação. Assim como é também uma especulação a hipótese de o tema estar sendo ventilado para abrir caminho - na alteração constitucional para a revogação da emenda que autoriza a disputa de um segundo mandato - a um terceiro período para Lula.

O presidente só não pode exigir de nós mortais que aceitemos como verdadeira a sua versão de que está completamente alheio a esse debate. Lula em pessoa, ao tentar negar a autoria da articulação, ontem acabou fornecendo mais evidências a respeito de seu empenho nela.

Até agora havia apenas um forte indício: a iniciativa do ministro da Justiça, Tarso Genro, de levar a proposta à discussão do conselho político dos partidos da coalizão da próxima segunda-feira.

Considerando que o ministro da Justiça não é uma ONG, lícito acreditar que atue como homem de governo quando põe na mesa uma proposta; ainda mais quando a mesa em questão se localiza no interior da sala de reuniões do presidente da República.

Mas examinemos as palavras ditas ontem por Lula, em duas declarações eloqüentes. A primeira: ¿Estão dizendo que eu quero voltar em 2014. Eu nem sei se estou vivo até lá.¿

Realmente, em 2014, amanhã ou daqui a 15 minutos nem o presidente nem ninguém é capaz de dizer se estará privando da companhia deste mundo. Quando joga com a peça do imponderável, Lula admite que tudo é possível, não estabelece impossibilidades e, portanto, abre espaço às especulações.

A segunda declaração: ¿Estão querendo colocar esse negócio da reeleição no meu colo. Eu sempre fui contra a reeleição.¿ Por isso mesmo, por ter sido tradicionalmente contra a reeleição, é que os indutores do debate dentro do governo apontam a existência de ¿razões doutrinárias¿ para o presidente defender a sua revogação.

Além disso, o sujeito de tal ação não é oculto como consta da frase ¿estão querendo pôr esse negócio da reeleição no meu colo¿. A menos que o ministro da Justiça esteja agindo à revelia do presidente e que o próprio Lula, vítima de algum tipo de ausência momentânea, tenha levado a discussão para dentro do Palácio do Planalto sem querer.

Que o presidente avaliza o debate sobre o fim da reeleição é inquestionável. Falta dizer qual a razão, a fim de pôr um fim às especulações e tratar do assunto como a sociedade merece: com maturidade, objetividade e transparência.

Encontros marcados

A ida do presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati, ao Palácio do Planalto faz parte de uma série de encontros de notáveis da oposição com o presidente Lula que a líder do governo no Senado, Roseana Sarney, está articulando há algum tempo.

Outros serão convidados, mas por enquanto não se diz quem são eles, para não expor a agenda a patrulhamentos.

O primeiro desses encontros, com o senador Antonio Carlos Magalhães, acabou acontecendo sob o pretexto de retribuição da visita feita por Lula a ACM no Instituto do Coração, em março.

O gesto já ocorreu dentro do plano de distensão entre o governo e o Senado, onde o ambiente adverso preocupa o Planalto.

Não só no tocante à aprovação de questões objetivas, como a prorrogação da CMPF e da desvinculação de receitas da União, mas também - e de imediato até principalmente - em relação à CPI da crise aérea, assunto cuja abordagem explícita não estava prevista na pauta da conversa.

Jereissati e Roseana acertaram em definitivo a visita numa conversa na quarta-feira da semana passada. O presidente do PSDB consultou todo o primeiro time do partido - inclusive Fernando Henrique Cardoso por telefone, nos Estados Unidos - que achou melhor encerrar logo o drama do vai-não-vai, dando ao encontro o caráter de cortesia institucional e nada mais.

A delegação dada ao senador Jereissati não incluía negociações sobre o fim da reeleição.

Resta um

O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, é o terceiro auxiliar do presidente Lula a confirmar a saída anunciada logo após as eleições. Ao todo, quatro avisaram que voltariam à planície: Bucci, o porta-voz André Singer, o assessor especial Luiz Gushiken, e o secretário particular da presidência, Gilberto Carvalho, o único ainda no Planalto.

Assembléia geral

A anunciada Secretaria Especial de Ações de Longo Prazo - o 36º ministério do presidente Lula - chega para somar. Somar-se ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, ao projeto de planejamento do Brasil 2022, ao Fórum da Previdência e às centenas de grupos de trabalho em funcionamento (?) máquina administrativa adentro.