Título: Sarkozy e Ségolène vão para 2º turno
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2007, Internacional, p. A8

Em uma eleição com participação recorde de eleitores - cerca de 85% -, os franceses decidiram depois de 12 anos restabelecer a oposição direita-esquerda, criada por eles próprios na Revolução Francesa, escolhendo o ex-ministro do Interior Nicolas Sarkozy, da União por um Movimento Popular (UMP), e a deputada Ségolène Royal, do Partido Socialista, como seus representantes no segundo turno das eleições presidenciais.

Marcada para 6 de maio, a votação que decidirá quem será o mandatário da sexta maior economia do mundo terá como fiel da balança o candidato centrista, o terceiro vitorioso do domingo.

Traumatizados pelo 21 de abril de 2002, quando a extrema direita eliminou os socialistas e chegou ao segundo turno de uma eleição com alto grau de abstenção (28,4%), os franceses foram ontem em massa às urnas. Informações parciais do Ministério do Interior indicam que 84,61% dos eleitores inscritos depositaram seus votos, recorde de participação desde 1965. Com todos os votos apurados, Sarkozy foi o vencedor do primeiro turno, com 31,11% de aprovação. Ségolène Royal ficou com 25,84% e François Bayrou, da União pela Democracia Francesa (UDF), obteve 18,55%. Os resultados confirmaram os prognósticos do Ministério do Interior e as primeiras pesquisas de boca-de-urna.

Finalista em 2002, Jean-Marie Le Pen, candidato ultraconservador da Frente Nacional (FN), foi o maior derrotado do pleito. Nunca, desde 1988, sua votação foi tão baixa: 10,51%.

Uma pesquisa feita a partir das 20h15 pelo instituto Ipsos e veiculada pela rede de TV pública France 2 já aponta Sarkozy como favorito para o segundo turno, com 54% das preferências, contra 46% da socialista.

Aguardada com contagem regressiva nas ruas de Paris, a publicação das pesquisas de boca-de-urna pelas emissoras de TV levou milhares de militantes às sedes dos três favoritos. Às 20 horas, na Rua Solferino, sede do Partido Socialista, a notícia de que Ségolène passara ao segundo turno detonou a euforia. ¿O que aconteceu na França hoje é maravilhoso. Um socialista disputará a presidência, e Le Pen foi derrotado¿, disse ao Estado o estudante Jean-Claude Legrand, exultante até ser questionado sobre as chances frente a Sarkozy. ¿Será muito duro. Não posso dizer que esteja otimista.¿

O alívio na Solferino reverberou na região de Deux-Sèvres, no sudoeste da França, onde Ségolène aguardou o resultado do pleito. Às 21h36, depois dos concorrentes, a candidata discursou, pedindo união para ¿pôr fim a um sistema que não funciona mais¿. Contestada durante a campanha até mesmo no seio de seu partido, a deputada obteve a maior votação dos socialistas em 19 anos e igual aos também 25,84% alcançados pelo ex-presidente François Mitterrand, ícone da esquerda, em 1981.

Reforçado pelas urnas, seu apelo por apoio ecoou bem na extrema esquerda, cujos candidatos, um a um, foram a público pedir a derrota da direita. Entretanto, reunidos, os seis candidatos comunistas foram responsáveis pelo mais baixo nível de apoio popular da esquerda e extrema esquerda reunidas desde 1974: 36%, ainda menos que os 37,15% de 2002.

A fragilidade do campo da esquerda obrigará os socialistas a se voltar para Bayrou, desde já o terceiro grande vencedor do pleito. ¿A partir desta noite, a política francesa nunca mais será a mesma¿, discursou o centrista, claramente satisfeito com os 7 milhões de votos que recebeu. Na manhã de hoje, Bayrou deve se pronunciar pela neutralidade, anteciparam membros da cúpula da UDF ao Estado.

Essa provável decisão beneficia o já favorito Sarkozy para vencer a eleição dentro de duas semanas. Primeiro a se pronunciar após a divulgação dos resultados, o ex-ministro optou por um tom moderado, apelando ao consenso, depois de terminar sua campanha aproximando-se do radicalismo antiimigração da extrema direita.

¿Não desejo nada além de uma coisa: unir a população em torno de um novo sonho francês¿, disse Sarkozy à platéia reunida na sede da UMP, na Rua Enghien, em Paris.

O DIREITISTA

Nicolas Sarkozy: Tem 52 anos, é advogado, ex-ministro do Interior, e líder da União por um Movimento Popular (UMP).

Campanha: Prega liberalismo e protecionismo econômicos ao mesmo tempo, assim como defende os direitos humanos e fala em restringir a imigração e repatriar clandestinos vindos de países pobres, como as ex-colônias Argélia, Marrocos e Tunísia. Liderou todas as simulações de intenções de voto para o segundo turno contra Ségolène Royal.

A ESQUERDISTA

Ségolène Royal: Tem 53 anos, é administradora e ex-ministra da Educação. Aspira a ser a primeira presidente mulher do país.

Campanha: Apresenta-se como representante do ¿socialismo do século 21¿. Propõe aumentar gastos estatais em programas sociais e penalizar as empresas que transferem empregos para o exterior. Entretanto, seus projetos econômicos imprecisos suscitam dúvidas, assim como sua filosofia de ¿ordem justa¿- associação de termos caros à direita e à esquerda.