Título: Nordeste vai às compras e deve gastar neste ano US$ 117,6 bilhões
Autor: De Chiara, Márcia
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2007, Economia, p. B4

O Nordeste virou a menina-dos-olhos do mercado de consumo brasileiro. De cimento a perfumes, as famílias da região devem gastar só neste ano US$ 117,6 bilhões, um pouco mais que o Produto Interno Bruto (PIB) do Chile em 2006. São quase US$ 70 bilhões a mais em relação ao dinheiro que girou há cinco anos na região.

Desde 2002, o consumo dos nordestinos cresceu 143,5%. O resultado está acima da média do País para o período, de 126,3%, e do desempenho do Sudeste (120,9%), revela o estudo 'Brasil em Foco', que acaba de ser concluído pela consultoria Target Marketing.

A consultoria, especializada em pesquisa de mercado, estimou o potencial de consumo de cada região do País em 2007 e 2002. A projeção foi feita a partir das contas nacionais e da estrutura de gastos dos brasileiros medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados foram cruzados com informações paralelas, de outras fontes de pesquisa.

Também em termos relativos, as famílias do Nordeste e do Norte ampliaram suas fatias no bolo do consumo nacional. O Nordeste respondia por 15,6% do consumo em 2002 e a região Norte por 4,2%. Até dezembro deste ano, a participação do Nordeste será de 16,9% e a do Norte, 5,5%, calcula o diretor da consultoria e responsável pelo estudo, Marcos Pazzini.

'Para o Norte e o Nordeste terem crescido, outras regiões perderam participação', diz o consultor. Afetados pela crise do agronegócio e do câmbio, o Sul e o Sudeste perderam fôlego na dinâmica do consumo. Tanto é que as compras das famílias do Nordeste já se equivalem às do Sul, a segunda região mais rica, atrás do Sudeste.

Benefícios sociais, aumento do salário mínimo e a chegada de muitas empresas na região para aproveitar esse bom momento explicam essa montanha de dinheiro no Nordeste. O McDonald's, por exemplo, já contabiliza os resultados. Os restaurantes instalados no Nordeste registram há 36 meses consecutivos crescimento nas vendas. 'Um período tão longo de crescimento não ocorria desde 1999', diz o diretor de Marketing, Daniel Arantes. Ele conta que, nas 49 lojas localizadas no Nordeste, as vendas aumentaram 1 ponto porcentual acima da média nacional.

'O Nordeste já é um país', compara Arantes. O faturamento dos restaurantes da região é 'ligeiramente maior' que as vendas consolidadas da rede no Chile, Uruguai e Peru. Entre marketing, treinamento, reforma e abertura de restaurantes, os investimentos previstos para este ano na região somam R$ 15 milhões. 'Serão abertos pelo menos três restaurantes.'

A história se repete na Nestlé, gigante no setor de alimentos. No ano passado, o consumo dos produtos fabricados pela empresa no Nordeste cresceu mais que o dobro, em relação às demais regiões. 'O aumento de vendas para o Nordeste foi generalizado', diz o diretor de Regionalização, Johnny Wei.

Segundo o executivo, a expectativa da empresa é que essa demanda se mantenha. Firme nessa aposta, a Nestlé inaugurou em fevereiro uma fábrica em Feira de Santana, na Bahia, para atender exclusivamente ao mercado nordestino. Ali são feitos produtos literalmente sob medida para a região. Um exemplo é o leite em pó em sachê de 200 gramas. O produto está entre os itens com maior volume de vendas.

Wei diz que o Nordeste responde por cerca de 30% das vendas da Nestlé no País e a marca lidera o mercado com todos os produtos que vende na região. 'O potencial de crescimento no Nordeste é muito grande.' Com capacidade de 40 mil toneladas por ano, ele não descarta, no futuro próximo, a ampliação da unidade que acaba de ser inaugurada.

O Wal-Mart é outro exemplo de sucesso no mercado nordestino. O maior varejista do mundo acaba de galgar a segunda posição no varejo nacional de supermercados, impulsionado em boa parte pelas lojas do Nordeste. Um terço das 302 unidades da empresa no País estão em nove Estados nordestinos.

Sem revelar números, a empresa informa que os resultados das lojas da região no ano passado foram bastante positivos, como reflexo direto do aumento da renda das classes de menor poder aquisitivo.

Também a estratégia de regionalizar o sortimento das lojas não só ampliou as vendas como movimentou a economia local. Dos 1,5 mil fornecedores regionais que respondem por quase 20 mil itens, metade do sortimento é fabricado por empresas que ficam no Nordeste.

Animada com o desempenho na região, 50% das 28 novas lojas previstas pela rede para este ano serão abertas no Nordeste, com investimentos de R$ 300 milhões.

O consumo disparou não apenas entre os gêneros de primeira necessidade. A Votorantim Cimentos, dona de 40% do mercado, registrou em 2006 crescimento de 17,3% nas vendas para o Nordeste, ante 9% de acréscimo em todo o País. Houve um aumento de vendas acima da média tanto para o varejo como para as construtoras.

'O comportamento do Nordeste se repete neste ano', afirma o diretor comercial da Votorantim, Marcelo Chamma. No primeiro bimestre, as vendas para a região aumentaram 8% ante 2006, enquanto o restante do País teve um acréscimo de 3%. Ele acha que o Nordeste deve continuar crescendo acima da média nacional. Para isso, a empresa vai ampliar a capacidade de produção na região e abrir centros de distribuição.

Os consumidores do Nordeste também estão ávidos por artigos de higiene e beleza. Artur Grymbaum, vice-presidente do Boticário, confirma o aquecimento do consumo na região. No primeiro trimestre, as vendas nas lojas do Nordeste aumentaram 14,6% ante igual período de 2006. O desempenho superou o de outras regiões.