Título: ONU alerta para falta de cooperação
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2007, Economia, p. B8

Um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) obtido com exclusividade pelo Estado alerta que, apesar de a América Latina ter um excesso de energia e até mesmo exportá-la, a falta de um acordo entre os governos da região e a falta de projetos de investimentos faz com que milhões de pessoas no continente não contem sequer com eletricidade em suas casas, inclusive na Bolívia, Equador e México, onde há grandes reservas de energia.

O estudo surge no momento em que os governos da região promovem uma verdadeira batalha diplomática para determinar de que forma o comércio de energia ocorrerá na região. Para os economistas em Genebra, os debates sobre cooperação e construção de gasodutos, principalmente na América do Sul, determinarão a geopolítica da região nos próximos dez anos.

O déficit energético ainda é substancial. Na América Central, por exemplo, são mais de 3,5 milhões de pessoas sem eletricidade. Na Guatemala e Honduras, 50% da população rural não têm acesso a qualquer tipo de energia. A mesma situação é vista em Chiapas, no sul do México, apesar de o país ser grande exportador de petróleo para os Estados Unidos.

Na Bolívia, que surge como uma das grandes reservas de gás natural da América do Sul, apenas 25% dos habitantes das regiões rurais têm eletricidade em suas casas, índice equivalente ao da África. No Equador, outro grande produtor e exportador de petróleo e que tem sua balança comercial equilibrada graças ao combustível, o déficit energético ainda atinge 1,6 milhão de pessoas.

O levantamento estima que a região sequer precisaria importar petróleo de outras regiões ou outros produtos para abastecer suas economias em termos energéticos se um plano continental fosse elaborado, com um programa de investimentos. Para a ONU, a América Latina poderia ser auto-sustentável, mas para isso dependeria de investimentos, plano de longo prazo e garantias aos investidores.

'Esses problemas de abastecimento ocorrem exclusivamente por falta de infra-estrutura e falta de financiamento de projetos', afirma um dos economistas que preparou o estudo. O levantamento é ainda uma resposta indireta às recentes iniciativas do presidente venezuelano Hugo Chávez de enviar petróleo mais barato para as famílias pobres nos Estados Unidos durante o inverno.

Na estratégia regional recomendada pela ONU, as energia renováveis, como o etanol e biomassa, teriam um papel fundamental. A sugestão é de que seja ainda montado um acordo para a criação de um mercado latino-americano do etanol.

Segundo o estudo, os investimentos em biomassa no mundo passaram de US$ 30 bilhões em 2005 para US$ 38 bilhões no ano passado. Neste ano, o valor deve superar US$ 40 bilhões . O que a ONU aponta com esses dados é que, de fato, há interesse em investir em projetos de biomassa no mundo e que uma organização da região em planos de infra-estrutura poderia atrair mais capitais. 'Há uma concorrência entre várias partes do mundo por investimentos no setor de energia. As empresas, porém, estarão mais dispostas a entrar em negociações com governos que tenham plano concreto de como vão utilizar a energia produzida não apenas em seus países, mas em relação a seus vizinhos', afirmou um dos autores do estudo.