Título: O futuro do agronegócio
Autor: Buainain, Antônio Márcio
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/04/2007, Economia, p. B2

O agronegócio brasileiro, em plena colheita da maior safra de grãos já produzida no País, volta a apostar no futuro. O momento, no entanto, está longe de ser cor-de-rosa, e a satisfação dos produtores com os resultados da produção é proporcional à preocupação com o fechamento das contas a pagar. E o futuro? Dois estudos recentes, o primeiro coordenado por José Garcia Gasques (Ipea/Ministério da Agricultura) e o segundo por Marcos Jank (Instituto Ícone), ambos conhecidos e respeitados especialistas, permitem compreender tanto a força do dinamismo do agronegócio brasileiro como seu potencial e desafios. Gasques, Eliana Bastos e Mirian Bacchi avaliam a produtividade e as fontes de crescimento da agricultura brasileira no período 1975-2005 e confirmam que o setor tem desempenhado o papel de amortecedor das crises no Brasil. No período de 2000-2005, a taxa anual de crescimento da agricultura foi de 5,99%, mais que o dobro do crescimento do PIB. No caso da agropecuária, cuja produção é associada ao uso de recursos naturais, é importante saber a fonte do aumento do produto. Um crescimento de 6% à custa da incorporação de novos recursos naturais é qualitativamente distinto de um baseado no melhor uso dos recursos disponíveis e na elevação da produtividade. Para avaliar a fonte de crescimento, os autores estimam a produtividade total dos fatores (PTF), que compara o produto agropecuário (oriundo de 32 lavouras permanentes e 29 temporárias, 6 produtos de origem animal e carne bovina, suína e aves) com todos os insumos utilizados na produção (terras de lavouras e pastagens, mão-de-obra, máquinas agrícolas, defensivos e fertilizantes). Já se sabia que na década de 1990 o crescimento da agricultura tinha se baseado mais na elevação da produtividade que na incorporação de novas terras, pondo fim ao padrão extensivo de ocupação da fronteira que caracterizou a evolução da agricultura. Nesse sentido, a constatação de que em 2000-2005 a base do crescimento foi a melhor utilização do conjunto de insumos e a elevação da produtividade não trouxe novidade. No entanto, o que é surpreendente é a aceleração do crescimento da produtividade total dos fatores, que saltou de 2,65% ao ano entre 1990-1999 para 3,87% entre 2000-2005 e contribuiu com 64,6% do crescimento do produto, enquanto o aumento do uso de insumos respondeu por 34%. Esse resultado confirma o enorme esforço de racionalização feito pelo setor e revela que o crescimento, em um contexto de acentuadas deficiências sistêmicas, não está baseado apenas em preços internacionais favoráveis, mas também nos ganhos de eficiência decorrentes dos investimentos privados realizados. Por sua vez, Jank, Luciano Rodrigues e Daniel Amaral examinam o cenário do agronegócio mundial para as próximas décadas e confirmam que o Brasil é o país com maior potencial para crescer, seja pela disponibilidade de água e terras aráveis (em particular pastagens degradadas que podem ser reaproveitadas com ganho de produtividade), seja pelo clima favorável. A demanda mundial continuará crescendo, os preços manterão a tendência de queda e a volatilidade deve aumentar e o protecionismo na agricultura continuará forte. Ainda assim, o cenário é positivo, e os autores projetam a quase duplicação das exportações atuais até 2012. Chamam a atenção para um conjunto de desafios que deverão ser equacionados se quisermos aproveitar as oportunidades. Menciono apenas aqueles que poderiam ser classificados como 'condição necessária', sem os quais o futuro de grandeza continuará apenas uma promessa para um futuro ainda mais longínquo: construção de infra-estrutura, montagem de um sistema de defesa agropecuária e domínio de novas tecnologias, principalmente aquelas, como a biotecnologia (incluindo os organismos geneticamente modificados), que aumentam a produtividade e economizam recursos naturais. A análise do que tem sido feito nessas três áreas não autoriza grande otimismo: os investimentos em infra-estrutura continuam paralisados; a biotecnologia, bloqueada pelo barulho dos ecorradicais; e a defesa agropecuária, sujeita a cortes do já minguado Orçamento federal. Trata-se de uma boa agenda para uma primeira conversa entre o ministro Stephanes, da Agricultura, e o novo ministro do Longo Prazo. Urgente! *Antônio Márcio Buainain é professor do Instituto de Economia da Unicamp.